Em pronunciamento oficial, na noite desta terça-feira (31), o presidente Jair Bolsonaro mudou o tom que havia utilizado na última fala relacionada ao coronavírus no país e pediu a união de todos pela preservação da vida e dos empregos. O chefe do Executivo disse também que a preocupação do governo "sempre foi salvar vidas, tanto as que perderemos pela pandemia quanto aquelas que serão atingidas pelo desemprego, violência e fome" e que o efeito colateral das medidas de combate ao problema "não pode ser pior do que a própria doença". A fala foi transmitida em cadeia de rádio e televisão.
Bolsonaro afirmou que a pandemia é o "maior desafio da nossa geração", e voltou a enfatizar a necessidade de se implementar medidas para a preservação de empregos.
— O efeito colateral das medidas de combate ao coronavírus não pode ser pior do que a própria doença. A minha obrigação como presidente vai para além dos próximos meses. Preparar o Brasil para a sua retomada, reorganizar nossa economia e mobilizar todos os nossos recursos e energia para tornar o Brasil ainda mais forte após a pandemia.
Em seu último pronunciamento, na terça passada (24), o presidente havia pedido o fim do isolamento social. Ele havia dito que as autoridades estaduais e municipais deveriam "abandonar o conceito de terra arrasada, a proibição de transportes, o fechamento de comércio e o confinamento em massa". O presidente também comentou sobre o contato com diversas pessoas que diagnosticaram positivo para a covid-19. Ele afirmou que, pelo seu "histórico de atleta", caso fosse contaminado, não precisaria se preocupar, porque seria uma "gripezinha" ou um "resfriadinho".
— A vida deve voltar à normalidade em todo o Brasil — disse na ocasião.
Dias depois, no domingo (29), Bolsonaro visitou pontos de comércio e o Hospital das Forças Armadas (HFA), em Brasília. A ação gerou aglomeração de pessoas. A atitude do chefe do Executivo contrariou o próprio ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que reforçou, no sábado (28), a importância do distanciamento social para conter a doença.
No pronunciamento desta terça, Bolsonaro evitou o confronto. O presidente também listou medidas tomadas pela gestão nos últimos dias, como o adiamento, por 60 dias, do reajuste de medicamentos no Brasil.
Mais uma vez, falou sobre o medicamento hidroxicloroquina, que, segundo ele, parece eficaz contra o coronavírus, mas que ainda não há vacina ou remédio com eficiência cientificamente comprovada.
Bolsonaro destacou que determinou ao ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, "que não poupasse esforços, apoiando através do SUS todos os Estados do Brasil, aumentando a capacidade da rede de saúde e preparando-a para o combate à pandemia".
Durante a fala do presidente, foram registrados panelaços em diversas regiões do país. Os protestos em janelas de apartamentos aconteceram em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Porto Alegre.
Bolsonaro volta a citar parte da fala de diretor-geral da OMS
Bolsonaro voltou a citar uma fala do diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, fora de contexto. O diretor havia respondido ao presidente mais cedo, quando ele citou a fala pela primeira vez.
No pronunciamento, Bolsonaro diz:
"Nesse sentido, o Sr. Tedros Adhanom, diretor-geral da Organização Mundial da Saúde, disse saber que 'muitas pessoas, de fato, têm que trabalhar todos os dias para ganhar seu pão diário” e que “os governos têm que levar esta população em conta'.
Continua ainda, 'se fecharmos ou limitarmos movimentações, o que acontecerá com estas pessoas, que têm que trabalhar todos os dias e que têm que ganhar o pão de cada dia todos os dias?' Ele prossegue, 'Então, cada país, baseado em sua situação, deveria responder a esta questão'.
O diretor da OMS afirma ainda que, com relação a cada medida, 'temos que ver o que significa para o indivíduo nas ruas' e complementa 'eu venho de família pobre, eu sei o que significa estar sempre preocupado com seu pão diário e isso deve ser levado em conta porque todo indivíduo importa. A maneira como cada indivíduo é afetado pelas nossas ações tem que ser considerada'."
Então, o presidente finaliza:
"Não me valho dessas palavras para negar a importância das medidas de prevenção e controle da pandemia, mas para mostrar que da mesma forma precisamos pensar nos mais vulneráveis. Esta tem sido a minha preocupação desde o princípio.
O que será do camelô, do ambulante, do vendedor de churrasquinho, da diarista, do ajudante de pedreiro, do caminhoneiro e dos outros autônomos com quem venho mantendo contato durante toda minha vida pública?"
Na verdade, a fala do diretor-geral da OMS tem relação com um pedido para que governos ajudem pessoas em situação de vulnerabilidade a vencer os danos econômicos do isolamento social.
Confira o que disse, na íntegra, o diretor-geral da OMS
"Pessoas sem fonte de renda regular ou sem qualquer reserva financeira merecem políticas sociais que garantam a dignidade e permitam que elas cumpram as medidas de saúde pública para a covid-19 recomendadas pelas autoridades nacionais de saúde e pela OMS.
Eu cresci pobre e entendo essa realidade. Convoco os países a desenvolverem políticas que forneçam proteção econômica às pessoas que não possam receber ou trabalhar devido à pandemia da covid-19. Solidariedade!"