Por Tiago Halewicz, especial*
"Natural de Varsóvia, polonês de coração e, pelo talento, cidadão do mundo."
Com essas as palavras, o escritor Cyprian Kamil Norwid (1821-1883) definiu Fryderyk Chopin (1810-1849), traduzindo o sentimento de eternidade da obra do chamado "poeta do piano" e ícone-mor do Romantismo. Passados mais de 200 anos do seu nascimento, Chopin ainda se consagra como um dos compositores mais interpretados nas salas de concertos mundo afora, mantendo-se unânime na preferência dos ouvintes de música erudita.
Para partir ao encontro da memória do compositor, é importante ir além do seu legado musical. O polonês deixou suas pegadas em inúmeras viagens que fez ao longo de sua infância e juventude, até chegar a Paris, onde atingiu a glória como artista.
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No ano de 1998, quando ainda era acadêmico do curso de Música, me propus a reunir o maior número possível de endereços relacionados à memória de Chopin. Os motivos por essa busca incansável não eram suficientemente claros até deparar com uma cifra realmente expressiva de endereços que reconstroem a trajetória pessoal e musical do polonês.
Após 18 anos de trabalho – e muitas travessias sobre o Atlântico rumo à Europa –, decidi transformar essa pesquisa em um livro intitulado Caminhos de Chopin (Casamundi Cultura e R&O Editores, 2016), cuja proposta é oferecer, em língua portuguesa, um guia que reconstrói as viagens de Chopin, o patrimônio erguido em sua memória e, sobretudo, a influência desses percursos em sua obra. Desde Zelazowa Wola até Paris, passando por Varsóvia, Berlim, Viena, Praga e Cracóvia, além de muitos vilarejos do interior da Polônia, a presença do compositor deixou profundas marcas que traduzo hoje como patrimônio e memória.
Zelazowa Wola
Nas terras baixas da planície da Europa do Norte, no coração da Mazóvia, Zelazowa Wola seria um lugar completamente esquecido pela literatura de viagem, e até pelos cartógrafos, se não preservasse as origens do artista cujo talento é lembrado há dois séculos em todos os cantos do planeta. Na vila de 65 habitantes, a 54 quilômetros da capital polonesa, Varsóvia, nasceu Fryderyk Chopin, em de março de 1810.
Em 2010, para as celebrações do bicentenário de nascimento do compositor, o Instituto Nacional Fryderyk Chopin, com apoio governamental, revitalizou o parque que abriga casa de nascimento do compositor. O complexo é uma das atrações mais visitadas em toda a Polônia e conta com infraestrutura moderna para receber os turistas, além de oferecer concertos entre os meses de maio e setembro.
Em 1810, Nicolas Chopin (1771-1844) transferiu-se com a esposa e os dois filhos para Varsóvia, onde assumiu o cargo de professor de francês no liceu da cidade, localizado no Palácio Saxão (Palac Saski), junto ao primeiro parque público, o Jardim Saxão (Ogród Saski). Foi a experiência inicial em um ambiente mais cosmopolita para os Chopin, apesar de Varsóvia sofrer com o provincianismo ocasionado pelas sanções russas a partir de 1815.
Ao longo do Krakowskie Przedmiescie, via localizada no centro histórico de Varsóvia, encontra-se grande parte dos sítios relacionados com o compositor, como o Palácio de Casimiro (Palac Kazimierzowski), Palácio dos Czapski (Palac Czapskich), última residência na cidade, e a Igreja da Santa Cruz (Kosciól Swietego Krzyza), onde está sepultado o coração de Fryderyk Chopin.
Ao sul de Varsóvia, no Parque dos Banhos Reais (Lazienki Królewskie), erguido pelo último monarca polonês, Stanislaw Poniatowski, fica o mais relevante monumento dedicado ao artista. Aos domingos, na primavera e no verão, importantes pianistas apresentam concertos dedicados a Chopin. Para finalizar o roteiro, é fundamental uma visita ao Museu Fryderyk Chopin, reinaugurado em 2010.
Chopin viveu em Paris por 18 anos em nove domicílios diferentes, todos na Rive Droite, margem direita do Rio Sena. O primeiro endereço é o número 27 do Boulevard Poissonière, onde residiu até 1832. A impressão inicil da cidade ele registrou em carta enviada a um amigo de Berlim: "No meu quinto andar, habito o boulevard Poissonière número 27, não imaginas como é bonito o meu alojamento, tenho um pequeno quarto com deliciosa mobília de acaju e com um balcão dando para os boulevards, de onde descubro Paris, de Montmartre ao Panthéon, ao longo deste mundo belo".
Em Paris, ainda é possível relacionar com o compositor o Square d'Orléans, onde habitou um apartamento vizinho à escritora Geoge Sand, o número 12 da Place Vendôme, onde morreu em 17 de outubro de 1849, e o Cemitério Père Lachaise, onde foi sepultado.
*Músico e pesquisador, Tiago Halewicz responde pela curadoria da Casamundi Cultura. Ele lança o livro Caminhos de Chopin, com coquetel e sessão de autógrafos, nesta quinta-feira, 28 de abril, às 19h30min, na Avenida Borges de Medeiros, 2.500, sala 1.909, em Porto Alegre