Cheguei ao hotel, em Cruzeiro do Sul, é um hotel simpático quase no centro da cidade, estão construindo um anexo que pelo vi, será bem luxuoso. Esta bem situado, na parte alta da cidade, uns 700 metros da Praça da Matriz. Escolhi um quarto estrategicamente posicionado com uma bela vista para o rio. Ali passava as horas vendo o intenso fluxo das catraias indo e vindo pelo rio Juruá.
Esta região concentra três cidades ligadas por um anel rodoviário, a saber: Rodrigues Alves, Mâncio Lima e Cruzeiro do Sul. A BR 364 tem uma ramificação de chão batido precariamente transitável até a localidade de boqueirão da Esperança, na Serra do Divisor, onde o Brasil faz fronteira com o Peru. Todos os outros acessos às inúmeras localidades, são exclusivamente feitos pelo transporte fluvial.
Cidades como marechal Thaumaturgo, Porto Walter, Jordão estão perdidas no meio da selva, tendo o rio como único meio de transporte, ou pequenas pistas de pouso, onde monomotores se aventuram a alcançar. Vale a pena, pegar um mapa do Acre, não vale o Quatro Rodas, pois é muito incompleto e ignora muitas localidades do Brasil, prefira, por exemplo, o "Mapograf", repare com atenção o formato do estado do Acre, lembra vagamente dois seios, ou dois triângulos lado a lado, tendo suas bases no Estado do Amazonas e suas pontas cravando-se no território peruano.
Siga em direção a estas pontas, irá encontrar estas cidades mencionadas, praticamente em total estado de isolamento. Tem suas origens em antigos seringais e foram redutos de valentes brasileiros que perderam suas vidas defendendo suas terras e sua subsistência numa região ignorada e esquecida pelo governo central. Aqui vale a pena estudar um pouco a historia do Acre, principalmente a Revolução Acreana. Este mapa e estas comunidades perdidas num Brasil pouco conhecido, locais intacto da nossa flora e fauna me levaram até lá. Motivo pelo qual ficava horas e horas no "porto" do Rio Juruá vendo, ouvindo e pensando, enquanto a vida ribeirinha fluía no seu duro dia a dia.
No carregar e descarregar provisões nas precárias embarcações, que os levaria aos seus lares, nos mais remotos rincões do estado. Perguntando aqui e acolá aos capitães das embarcações, como era a vida a bordo, o tempo de viagem, alimentação, tempo de viagem e condições de navegabilidade vou ficando de alma lavada e um prazer imenso de ir descobrindo aos pouco, que num mundo onde apregoando a rapidez das comunicações e facilidades, vejo aqui um outro mundo, completamente estanque e original".
Cruzeiro do Sul é uma cidade pequena, de um povo amistoso e atencioso, embora extremamente calado algo que me chamou a atenção, que mesmo em aglomeramentos, não fazem algazarra. Passei nesta cidade, o feriado da Padroeira do Brasil. Na esplanada principal, em frente a Catedral, fizeram um grande bingo, onde pelo que imagino fluiu toda a população da cidade. Foi uma grande festa, mas o silencio imperava. Ficava observando casais de namorados nas praças, restaurantes, enfim famílias e não ouvia grandes falatórios, riam, comiam e falavam pouco. Noutra oportunidade, subindo o rio Juruá com um barqueiro, que no passado tinha sido seringueiro, perguntei porque eles eram tão quietos, para minha surpresa sua resposta foi:
- O que vou falar, não tenho nada para contar...
Investigando um pouco, mais, fui sabendo que pelo tipo de vida que estes homens tem, levantando às duas horas da madrugada, se embrenhando na mata para retirar o látex e voltando só no final da tarde, sempre sozinhos, achavam seu "mundinho" muito pequeno e que sua vida era muito insípida. Ledo engano, escutei insistindo relatos comoventes e arrebatadores das vidas destes homens na mata. Tanto de seringueiros, garimpeiros, madeireiros e barqueiros. Relatos comoventes, aventuras fantásticas dignas de filmes de aventuras, que quando me atrevo a reproduzir, as pessoas me olham meio desconfiadas, pois acham que estou a aumentar ou inventar. Basta apenas comprovar, vá e ouça.
Quem é Armando Boese Azambuja
O leitor do Viagem tem 61 anos, é médico e conhece 94 países. Ele conta que em maio de 2014 vai fazer a Transiberiana. Na viagem pelo Acre, iniciou no município de em Cruzeiro do Sul e seguiu por Acre, Rondônia, Amazonas e foi até Boa Vista, onde seguiu ao Tepequem e depois ao Salto del Angel, passando pelo Monte Roraima, onde acampou no topo.