No caminho entre o aeroporto e a Djeema El-fna, conheci no ônibus uma holandesa que mora no Marrocos há 20 anos.
- Humm! Isso fica no meio da medina. É muito mais difícil do que você imagina. Nem adianta eu tentar explicar - respondeu a mulher, quando eu mostrei o endereço do meu hostel.
Por destino, sorte ou coincidência, encontrei um conhecido de Dublin no meio da praça, logo após sair do ônibus. Ele estava hospedado no mesmo hostel e me mostrou o caminho. A holandesa tinha razão.
Sem exagero, esqueça qualquer tipo de mapa para andar na medina, o principal ponto turístico de Marrakesh. São labirintos quilométricos de vielas e becos. É onde bate o coração da cidade baseada no comércio.
Casas, hotéis, restaurantes, motos, carroças, pedestres, ambulantes, mesquitas e os tradicionais souqs (áreas de comércio) se misturam em uma bagunça generalizada. Locais e turistas percorrem as ruas da medina que vende desde produtos para o dia a dia a suvenires.
Para os acostumados com quarteirões simétricos e placas instrutivas, perder-se na medina é questão de minutos. É tão comum turista perdido, que ajudar os desorientados virou negócio. Basta dar uma paradinha para refletir sobre o caminho que alguém gruda ao seu lado para oferecer ajuda em troca de dirhams (a moeda marroquina). Aí, você terá tuas opções: pague para se achar ou ande (às vezes horas) em busca da saída. Se optar pela primeira, sempre defina o preço antes, 15 dirhams no máximo (R$ 4).
Mas na segunda alternativa esconde-se o verdadeiro tesouro de Marrakesh, que não tem pontos turísticos famosos. Viver o cotidiano é a grande aventura, a particularidade da cidade vermelha. E se perder na medina é a melhor maneira de fazer isso. Descobri esse fato ao sair pela manhã e voltar no fim da tarde. Prove, converse, pechinche, observe, reflita, ande. Surpreendi-me com a hospitalidade marroquina. Já estive em alguns países da Europa, América do Sul e do sul da África. Os marroquinos foram disparado os mais amigáveis e gentis.
Ainda no coração da medina, a caminhada o leva a uma das pérolas arquitetônicas da cidade. Fundada no século 14, a escola religiosa mulçumana Ali Ben Youssef já foi a maior do norte da África, abrigando 900 alunos. Funcionou até a década de 1960, quando passou a ser apenas um lugar de visitação. Sendo a maioria das mesquitas fechada para não mulçumanos, Ben Youssef é uma boa alternativa para conhecer a beleza desses espaços de oração. Entre os belos mosaicos, as cúpulas trabalhadas no cedro e paredes ornadas em intermináveis inscrições e figuras geométricas, a visitação torna-se um refúgio no meio da turbulenta medina.
Também perto do centro nervoso é possível conhecer os tenneries, local onde se curte o couro. Devido ao terrível odor, o visitante recebe um ramo de menta ou arruda para cheirar durante o passeio. Mesmo assim, muitos desistem e vão embora, segurando o estômago.
Refúgio em meio a turbulência
Ainda no coração da medina, a caminhada o leva a uma das pérolas arquitetônicas da cidade. Fundada no século 14, a escola religiosa mulçumana Ali Ben Youssef já foi a maior do norte da África, abrigando 900 alunos. Funcionou até a década de 1960, quando passou a ser apenas um lugar de visitação. Sendo a maioria das mesquitas fechada para não mulçumanos, Ben Youssef é uma boa alternativa para conhecer a beleza desses espaços de oração. Entre os belos mosaicos, as cúpulas trabalhadas no cedro e paredes ornadas em intermináveis inscrições e figuras geométricas, a visitação torna-se um refúgio no meio da turbulenta medina.
Também perto do centro nervoso é possível conhecer os tenneries, local onde se curte o couro. Devido ao terrível odor, o visitante recebe um ramo de menta ou arruda para cheirar durante o passeio. Mesmo assim, muitos desistem e vão embora, segurando o estômago.
Reflexão no Saara
Depois de algumas horas de estrada, acompanhado apenas por vastas planícies áridas, uma silhueta parecendo uma onda trouxe a primeira novidade à paisagem. Mais à frente já se via a cor vermelha. Um pouco depois, as grandes dunas do Saara já eram óbvias.
Cheguei à entrada do deserto, na região de Merzouga, por volta das 17h. O grupo todo transparecia uma mistura de ansiedade, alegria e contemplação por estar na borda do lendário, misterioso, imenso, enigmático Saara. Nós seis estávamos ali por uma determinação, por uma vontade realmente capaz de levar tão longe. Mas o porquê disso não era uma resposta fácil.
Enrolei o turbante na cabeça, montei no meu dromedário e segui com o grupo deserto adentro, com a caravana puxada por um guia. No início da jornada, a ansiedade traduzia-se em piadinhas e conversas. Com o cair da tarde, o burburinho diminuiu até chegar ao silêncio total. Tenho certeza que, nesse momento, todos entraram em reflexão.
Assim como o mar, o horizonte infinito e o pôr do sol mais vermelho do que nunca foram um convite para meditar. Durante a caravana, lembrei da passagem na qual Saulo, no livro Paulo e Estevão, de Chico Xavier, descreve o seu momento no deserto: "Tenho a impressão de estarmos num templo de paz imperturbável, fora do mundo...". Foi exatamente desse jeito.
Duas horas de caminhada no deserto depois e já sob a escuridão, o grupo aportou no acampamento berbere para passar a noite no Saara. O retorno seria na manhã seguinte, antes do amanhecer, para pegar o nascer do sol durante a caminhada de volta.
O mais louco desse tipo de viagem é dividir uma experiência marcante para a sua vida com pessoas completamente desconhecidas.
Como velhos amigos
Naquela noite, cantamos juntos ao som de tambores, compartilhamos o tanjine da mesma tigela, brindamos com chá, contamos histórias, fizemos brincadeiras uns com os outros, deitamos lado a lado no topo de uma duna para esvaziar a cabeça e encher os olhos com o céu branco de tão estrelado. Não sei se foram as horas na van ou a simples felicidade de estar ali que nos deixou vulneráveis, mas fizemos tudo isso em uma intimidade só encontrada entre velhos amigos.
As montanhas berberes
Foto: Divulgação/Pedro Rochenbach
No terceiro dia no Marrocos, segui em direção ao Saara com um grupo de seis pessoas em uma van. Os grupos partem diariamente da Djeema El-Fna, com as opções de dois ou três dias de viagem. Optei por três e caí na estrada. Entre Marrakesh e a entrada do deserto são cerca de nove horas de viagem. Porém, a distância é distribuída em um roteiro de dois dias pela cadeia de montanhas do Atlas e pelo o vale do Rio Dades, roteiro de cultura berbere.
Na primeira parada, no alto de uma das montanhas, fui apresentado ao fruto da Argan, árvore tipicamente marroquina e uma das fontes de sustento da região. Do fruto, os berberes retiram óleo usado para fazer vários produtos, principalmente, xampu e loções para o corpo que são vendidos nas grandes cidades. A extração, feita por cooperativa de mulheres, ocorre manualmente. Elas passam horas girando uma peça de pedra para o líquido sair.
De volta à estrada, tive o meu reencontro com o tanjine, que havia provado em Marrakesh. É a comida mais comum no Marrocos. Nessa viagem de três dias, só no café da manhã tanjine não era o prato principal. Ele vem servido na própria tigela de barro onde se faz o cozimento. Coberto com um tampa cônica, a carne vem sob vegetais, batatas e molho. Como o processo para cozer é lento para deixar a carne bem macia, em alguns lugares você faz o pedido, sai para dar uma volta e retorna mais tarde para comer.
E foi isso que fizemos no vale do Rio Dades. Enquanto o tanjine aguardava sobre o fogo de brasa, o grupo seguiu a um "oásis". Por ser uma das poucas regiões com água correndo o ano inteiro, o verde das plantações do vale brilha entre as montanhas rochosas e avermelhadas.
Antes de deixar o vale, também passamos pela Garganta do Dades para ver as estranhas formações rochosas e os cânions à beira do rio.
Foto: Divulgação/Pedro Rochenbach