Um verão para ficar na memória. O cenário no litoral norte do Rio Grande do Sul, nos últimos meses, foi predominantemente de céu aberto e águas quentes e cristalinas. Teve churrasco e música à beira-mar, e equipamentos com ares futurísticos circulando pelas ruas das praias. Veranistas ganharam mais opções de lugares para matar a fome (que o mar parece deixar ainda maior), mas também tiveram de enfrentar antigos problemas, como os frequentes alagamentos nas cidades litorâneas. Zero Hora aproveitou o último dia de fevereiro e o fim do feriadão de Carnaval para ouvir dos veranistas o que marcou o verão 2017. Confira.
Céu azul e tempo (quase sempre) firme!
Não dá para reclamar: banhistas que curtiram a praia no Litoral Norte levam para casa lembranças de um verão de céu azul e altas temperaturas. Nos dois primeiros meses de 2017, a chuva prejudicou a vida à beira-mar em somente 18 dias – sendo que, em boa parte deles, a precipitação não passava de uma rápida pancada, e logo o sol aparecia novamente.
Não à toa, a veranista Janaína Campos, 40 anos, considera este verão um dos melhores já vividos pela família no litoral gaúcho. O grupo chegou em Tramandaí na segunda quinzena de fevereiro e deixará a praia satisfeito:
– Foi maravilhoso – resume Janaína.
De acordo com a Somar Meteorologia, foram 20 dias de tempo seco em janeiro e 21 em fevereiro. O verão 2017 ainda presenteou aqueles que visitaram a praia no feriadão de Carnaval, quando as temperaturas ficaram próximas aos 30°C e o sol foi de rachar. Nenhuma gota de chuva.
Litoral Norte com tons caribenhos
Não bastasse o céu azul e o Nordestão enfraquecido, a orla ainda foi enfeitada por um mar cuja cor e a temperatura lembravam as praias caribenhas. Nada a ver com o famoso "chocolotão" a que os gaúchos já estão acostumados.
Sorvendo um mate sob um guarda-sol no fim da manhã de terça-feira, Noelsi e Wilson dos Santos aproveitaram quase todos os dias da temporada à beira-mar. O casal de Santa Maria que mudou-se para Tramandaí após a aposentadoria destacou o bom tempo e o mar mais quente e bonito do que nos outros anos como principais atrativos do veraneio.
– Nunca entrei tanto no mar como nesse verão – conta Noelsi.
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O surfista Álvaro Carrasco, 45 anos, vem todos os fins de semana de Porto Alegre para pegar onda em Capão da Canoa, seja no inverno ou no verão. Nos dias de frio, costuma vestir uma roupa especial. Nos de calor, geralmente também – ele se diz muito friorento. Só que nesta temporada foi diferente.
– A água está tão quente que dá para surfar "no pelo". Hoje coloquei esta camisa com proteção solar, mas, não fosse por isso, nem seria necessária. Acredito que esse foi o ano de mar mais quente e transparente dos últimos anos – avalia o servidor público federal.
De acordo com especialistas do Centro de Estudos Costeiros, Limnológicos e Marinhos (Ceclimar), o fenômeno do "mar caribenho" deve-se à atuação de uma corrente marítima do Norte, que tem temperaturas quentes e é pobre em nutrientes, fazendo com que as águas fiquem aquecidas e com aspecto cristalino.
Food parks ganharam espaço
Além das opções tradicionais, como crepes na rua, bares e restaurantes, o veraneio em algumas praias do Litoral Norte passou a conviver com um modelo menos convencional de venda de alimentos. Os food parks, áreas ou estacionamentos com diversos carrinhos de lanche gourmet, se firmaram como possibilidade gastronômica de quem está a passeio.
Somente em Tramandaí, surgiram dois food parks: um na beira-mar e outro na Avenida Emancipação, no Centro. O serviço temporário – a maioria funcionou apenas durante a temporada – agradou os veranistas.
– Foi muito bom. Procuramos trazer opções que não operassem na praia, mas que as pessoas já conhecessem. Funcionou bem – comentou o empresário Ronaldo Inácio, responsável pelo Summer Food Park.
Ronaldo resolveu empreender no negócio depois que o centro comercial que administrava pegou fogo, no primeiro semestre do ano passado. Para atrair o público ao novo modelo de negócio, investiu em trazer marcas de chope, sushi, pizza e lanches conhecidas em Porto Alegre, e manter uma programação com música ao vivo quase diariamente. A tática deu certo. Segundo estima, o espaço recebeu mais de 90 mil pessoas até o fim de fevereiro.
Hoverboard, uma das novidades do verão
Quando não estavam à beira-mar, muitos veranistas aproveitaram as ruas do Litoral Norte para circular de hoverboard, o skate elétrico com design futurista que virou sensação entre crianças, adolescentes e adultos.
Pedro De Bortoli, 11 anos, trouxe para Capão da Canoa o brinquedo que ganhou no último Natal. Ele aproveitou o calçadão da Beira-Mar para exibir suas habilidades sobre o equipamento, que chega a uma velocidade de até 20 km/h.
– Na praia é melhor para andar de hoverboard porque tem mais espaço. Se não, ando em casa mesmo, mas sempre acabo batendo em algum canto das paredes ou dos móveis – revela o garoto.
A confissão de Pedro não chega a ser surpresa para a mãe, a empresária Ana Rúbria. Ela até entende o que leva o menino a, sempre que possível, estar com o skate elétrico sob os pés.
– Na minha época eu sonhava com um tapete mágico. O hoverboard é um brinquedo que também mexe com a imaginação deles – diz Ana Rúbria.
Para comerciantes, crise se refletiu nas vendas
Se para os veranistas a temporada foi quase só de alegrias, para o comércio à beira-mar já houve tempos melhores. Proprietária de um quiosque na orla de Tramandaí há 30 anos, Geneci Santos diz que o movimento em 2017 foi o mais fraco que teve em anos.
– Foi péssimo. Todo mundo está segurando dinheiro, traz suas coisas de casa – relatou.
De seu comércio, observou um hábito cada vez mais frequente entre os veranistas: levarem a própria cerveja de casa. Como resultado, seu quiosque, que em outros tempos faturava com a venda da bebida e de drinks, hoje tem como carro-chefe os sucos naturais e a água de coco.
Quem corre atrás da clientela também sentiu os efeitos de um veraneio de cintos mais apertados. O mineiro José Odete, que vem há 20 anos de Belo Horizonte para trabalhar como ambulante durante a temporada em Tramandaí, percebeu uma diminuição na saída dos produtos em relação aos anos anteriores. Apesar disso, não reclama: a venda de biquínis e de saídas de praia, ainda que mais fraca, atendeu às suas expectativas.
– A gente esperava que, com a crise, o povo não ia comprar, mas comprou. Foi um pouco mais fraco, mas estou satisfeito – avaliou.
Alagamentos recorrentes incomodam
Na beira da praia foi difícil reclamar do que se viu nos primeiros meses do ano. Mas um problema recorrente segue testando a paciência de moradores e veranistas de Tramandaí e Capão da Canoa: alagamentos diante de quase qualquer chuva.
Neste verão, não foi diferente. Apesar dos poucos dias de tempo ruim, bastaram alguns minutos de chuva mais forte para que vias centrais das duas praias ficassem repletas de água.
Cuidado e vinagre à beira-mar
Não se compara à infestação do ano anterior. Mas banhistas tiveram novamente de se cuidar contra os tentáculos das águas-vivas, que liberam toxina capaz de provocar queimaduras e ardência na pele.
Caetano Frizzo, três anos, sabe muito bem o que é isso. Apesar dos cuidados da mãe, a advogada Bárbara, de Porto Alegre, o menino sofreu com uma queimadura no pé enquanto entrava na água em Capão da Canoa. A mãe também acabou sendo vítima das águas-vivas neste verão.
– O jeito foi reforçar os cuidados e trazer uma garrafinha de vinagre (que ajuda a neutralizar a queimadura e aliviar a dor) para a praia. Ficar de olho e preparado! – disse Bárbara.
Guaritas danificadas
Veranistas que frequentam as praias do Litoral Norte notaram o desaparecimento de algumas guaritas de salva-vidas neste verão. Devido à ressaca que atingiu praias como Capão da Canoa em outubro do ano passado, as estruturas ficaram danificadas ou simplesmente deixaram de existir.
– Aqui, por exemplo, havia a guarita 80, perto da qual costumávamos passar o veraneio. Só que ela ainda não foi reposta. Imaginávamos que a prefeitura faria isso logo no início do ano, mas até agora o que existe é um espaço descoberto entre as guaritas 79 e 81 – lamenta o empresário Marcos Meneghetti, 33 anos, de Porto Alegre.
Placas que indicavam restrições à beira-mar também foram levadas com a força da água e não foram substituídas. Algumas delas indicavam a proibição de animais de estimação na orla – regra que muitos veranistas ignoraram nesta temporada.