O primeiro protagonista negro no audiovisual brasileiro foi o ator gaúcho Breno Mello, no filme Orfeu Negro, lançado no final da década de 1950. Antes, em 1943, Sebastião Bernardes de Souza Prata, apelidado de Grande Otello, já havia aparecido em uma obra, mas, ainda retratado de modo preconceituoso.
É o que conta a palestra de André Valdez, 51 anos, jornalista e pesquisador musical. Em seu projeto Tela preta: protagonismo negro no audiovisual brasileiro, o jornalista conta como foi a trajetória do povo negro durante décadas na busca pelo destaque na teledramaturgia brasileira e como isso favoreceu a representatividade racial em novelas atualmente.
Morador de Gravataí desde que nasceu, o jornalista afirma que sempre foi blindado da causa antirracista, devido ao contexto em que estava inserido:
– Eu fui criado em um bairro predominantemente branco. Sou filho de um inspetor de polícia e nunca tive vínculo com essa temática. Era muito blindado, meus colegas me chamavam de 'moreninho'.
Resgate
Em 2021, como diretor de eventos do Clube Social Negro Seis de Maio, em Gravataí, recebeu o convite da diretora do movimento para preparar uma palestra durante a Semana da Consciência Negra. Voluntariamente, André aceitou o convite e teve a ideia de abordar sobre o protagonismo negro no cinema, tema que, mais tarde, seria o grande foco de sua carreira profissional.
Ao longo dos dias, por meio de pesquisas e vivências pessoais, elaborou sua palestra baseada na sua paixão pelo audiovisual e decidiu falar sobre a representatividade negra nesse espaço:
– O intuito é fazer com que o jovem tenha conhecimento da inserção do negro no audiovisual brasileiro e aprenda com o mais velho esse trabalho de resgate sobre a nossa cultura.
Com a potência de seu trabalho, André realiza palestras em escolas e faculdades da Região Metropolitana, incluindo Porto Alegre, não excluindo a ideia de ir para escolas no interior do Estado, para abranger diferentes públicos.
Na quinta-feira (14), o jornalista participou do evento da Escola Gentil Viegas Cardoso, em Alvorada, que contou com atividades para os alunos em alusão ao Novembro Negro.
Valorização da ancestralidade
Atualmente, André é assessor de imprensa e é colunista em um portal de notícias local, onde escreve regularmente sobre música e assuntos relacionados a cultura. Seu grande sonho também está em construção: a produção do primeiro livro. O objetivo da obra é trazer para o conhecimento do povo gaúcho personagens e artistas negros que ficaram esquecidos ao longo dos anos.
– Minha vontade é virar biografista. Sou um entusiasta das artes, e sei o quão ela é necessária na construção de uma sociedade mais igualitária, empática e antirracista – relata o jornalista.
Passando por grandes sucessos como a novela Vai na Fé, que ficou marcada pelo elenco composto predominantemente por pessoas negras, em seu projeto, Valdez traz todo o desenvolvimento da história do negro no audiovisual brasileiro e seus desafios, valorizando os principais nomes pioneiros na teledramaturgia e música brasileira: Brenno Mello, Caco Velho e Grande Otello.
– Hoje temos três meninas negras como protagonistas nas três novelas da Globo. Mas a história não foi assim, nos negaram (esse espaço) por muitos anos – destaca André
Ele salienta, ainda, a importância de levar essa temática para escolas e lugares cada vez mais diversos, para que os jovens negros entendam a história que os atravessa:
– É necessário resgatar do próprio negro a sua identidade, a sua herança, a sua ancestralidade, e fazer com que os jovens se sintam representados.
Interessados em levar o Tela Preta para escolas ou eventos podem entrar em contato pelo e-mail andrevaldezs@gmail.com, ou WhatsApp (51) 82267715.
Conheça quem foram os pioneiros no audiovisual brasileiro:
Breno Mello
Nascido em Porto Alegre, Brenno Mello (1931-2008) foi, além de ator, jogador de futebol durante um bom tempo de sua vida. Em 1959, quando defendia o Fluminense, recebeu um convite para estrelar o filme Orfeu Negro, em que foi o escolhido entre mais de 300 concorrentes ao papel. O filme ganhou inúmeros prêmios, como a Palma de Ouro em Cannes, o Globo de Ouro e o Oscar de filme estrangeiro, representando a França. Breno Mello participou ao todo de seis filmes.
Caco Velho
O sambista Caco Velho (1920 a 1971), apelido de Matheus Nunes, nasceu em Porto Alegre e foi cantor, compositor e instrumentista. Desde cedo era interessado pelo samba. Em 1944, estreou em disco pela Odeon com o samba Briga de gato, parceria com Lupicínio Rodrigues e Felisberto Martins. O artista se apresentou em teatros, rádios e televisões nacionais e internacionais. Suas composições mais famosas foram Mãe preta e Barco negro, ambas gravadas por Amália Rodrigues e tocadas em diferentes cidades do mundo.
Grande Otello
Sebastião Bernardes (1915-1993), apelidado de Grande Otello, nasceu em Minas Gerais. Foi ator, comediante, cantor, produtor e compositor, conhecido principalmente por seu trabalho no teatro de revista e nas famosas chanchadas do cinema brasileiro. Começou sua carreira artística ainda criança, aos sete anos, em um circo. Participou do filme Macunaíma (1969), baseado na obra de Mário de Andrade, e atuou em telenovelas na TV Globo, como Escolinha do Professor Raimundo e Renascer.
Produção: Ana Júlia Santos