Na esteira da expansão do mercado farmacêutico, cresce o número de pessoas intoxicadas por medicamentos. Entre 2002 e 2012, foram pelo menos 304,6 mil casos no país, segundo os dados mais atualizados do Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (Sinitox), vinculado à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). O aumento registrado nesse período foi de 28,6%. Principal agente causador das intoxicações, os remédios provocaram a morte de 853 pessoas, sendo 86 delas no Rio Grande do Sul. Mas o próprio Sinitox admite que o número pode ser muito maior devido à subnotificação.
O Plantão de Emergência do Centro de Informação Toxicológica do Rio Grande do Sul (CIT-RS) atendeu, no ano passado, 22,7 mil casos do que tecnicamente é chamado de "exposição humana a agentes com potencial tóxico". Os medicamentos responderam por quase 30% das ocorrências. Acidente, tentativa de suicídio, erro de administração e automedicação são as principais causas das intoxicações envolvendo fármacos. Crianças de um a quatro ano costumam ser as principais vítimas.
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Para o médico toxicologista Carlos Augusto de Mello, do CIT, a automedicação, a proliferação de farmácias e o armazenamento inadequado são alguns dos fatores que contribuem para os incidentes envolvendo remédios – são, em média, 18 por dia. Professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), ele ressalta que, na maioria das vezes, o problema é o mau uso do fármaco, pois "nenhum produto é mau em si, intrinsecamente".
– As pessoas têm muitos remédios em casa. Compram muitos por conta própria, principalmente esses de venda livre, e não dão importância para o risco que é manter muitos medicamentos em casa, estocados de maneira inadequada.
Apenas três substâncias foram responsáveis por mais de um terço das intoxicações por medicações no Estado em 2014 – ano da publicação do último relatório do CIT-RS. Foram 2.052 casos por overdose ou reações ao uso de clonazepam (um ansiolítico, mais conhecido pelo nome comercial Rivotril), fluoxetina (antidepressivo) e paracetamol (analgésico/antipirético). Quase 30% das ocorrências envolveram crianças com menos de quatro anos.
Na avaliação de Mello, uma alternativa para diminuir os acidentes com crianças ingerindo medicamentos seria uma mudança na legislação brasileira, por exemplo, obrigando as indústrias a fabricarem embalagens mais seguras. Desde 1994, está tramitando na Câmara dos Deputados um projeto de lei que determina a utilização da inscrição "Embalagem Especial de Proteção à Criança (EEPC) em medicamentos e produtos químicos de uso doméstico que apresentem potencial de risco à saúde".
Nos próximos cinco anos, a Organização Mundial da Saúde (OMS) quer reduzir pela metade o número de "problemas evitáveis provocados por erros no uso de medicamentos". O custo associado aos incidentes é estimado em US$ 42 bilhões por ano, ou quase 1% do total das despesas de saúde no mundo. Nos Estados Unidos, equívocos na prescrição e no consumo de remédios prejudicam a saúde de 1,3 milhão de pessoas por ano e causam pelo menos uma morte por dia.