Rechaçada por funcionários e tratada de forma até irônica pelo presidente dos Correios, a privatização parece uma alternativa vista com cautela. Mas opções como fim do monopólio sobre serviços postais, permitindo que haja concorrência – como já se dá com as encomendas –, e abertura do capital ganham força entre especialistas.
Crítico da "instrumentalização do Estado" sobre empresas públicas, o professor de administração pública da Universidade de Brasília (UnB) José Matias-Pereira considera que a estatal é um dos maiores exemplos de como a má gestão abre janelas à corrupção e leva à baixa qualidade do serviço.
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– Chegou a tal ponto de deterioração que não faz mais sentido insistir para que continue existindo monopólio – diz o pesquisador. – Se não forem tomadas medidas drásticas, a empresa vai cada vez afundar mais.
Com um rombo orçamentário sem precedentes e sem concorrência para nivelar os serviços, os Correios estariam se afundando em um buraco do qual só seria possível sair com modernização, retomada da confiança e competente gestão técnica, na avaliação da economista e mestre em desenvolvimento econômico Kátia Fernanda Isse.
– O mercado muda, cria mais tecnologias e, se a empresa não inovar, acaba sendo deixada de lado pelos clientes, ficando obsoleta. Uma alternativa para os Correios poderia ser abrir o capital, permitindo que seus rumos não fossem definidos só pelo governo – estima Kátia. – Ainda que isso não abrisse o mercado para a concorrência, poderia levar à retomada da excelência.
Defendendo que a entrega de correspondências não é mais uma questão estratégica para a segurança nacional como em outros tempos, o economista Eduardo Lamas avalia que, diante da garantia de exploração exclusiva de um mercado, estatais como os Correios perderam de vista a necessidade de serem também comercialmente viáveis.
– A evolução tecnológica fez com que o monopólio ficasse sem sentido. Abrir para a concorrência funcionaria mais para a empresa do que a própria privatização.
Para a presidente da Associação dos Profissionais dos Correios, Maria Inês Capelli, o caminho para os Correios passa pela qualificação dos dirigentes e o fim do "aparelhamento partidário" da estatal.
– Tem solução? A empresa é grandiosa, com empregados de primeira linha, mas isso vai depender do que realmente o governo quer fazer com ela. Se levar a sério, como está fazendo com a recuperação da Petrobras, do BNDES, tem solução, sim.
Neste mês, empresa decidiu encerrar as atividades de 250 unidades no país
Sobre o aviso em que é comunicado o fechamento de um dos prédios em Porto Alegre, um adesivo colado na janela diz: "A culpa não é do carteiro". Na entrada coberta por pichações do Centro de Distribuição Domiciliária (CDD) Auxiliadora, a indicação de que o atendimento passou a ser feito em outra unidade dá o tom de uma mudança anunciada neste mês pela estatal: 250 agências deixariam de funcionar em todo o país.
O fechamento de agências – que, segundo os Correios, ocorre de maneira gradual, apenas em municípios com mais de 50 mil habitantes – é mais uma das medidas tomadas recentemente na tentativa de evitar resultados ainda piores em 2017 para a empresa, que acumula dois rombos de R$ 4 bilhões no último biênio. Também para reduzir gastos, desde 2016 a maioria das agências já não abre mais aos sábados.
Tendo como público-alvo os empregados com mais de 55 anos, foi aberto em janeiro um Plano de Desligamento Incentivado (PDI) ao qual 5.491 trabalhadores dos Correios em todo o país aderiram. Só com essa medida, a empresa espera conseguir uma economia anual de aproximadamente R$ 800 milhões.
– De 2002 até 2016, os Correios só conseguiram resultado operacional em três anos. Em 2007, 2008 e 2010. De 2007 para 2013, o nosso patrão, a União, tirou do caixa da empresa mais de R$ 6 bilhões. E esses recursos estão fazendo falta – declara o presidente da empresa, Guilherme Campos Júnior. – Isso deixou mais transparente ainda a questão da ineficiência da empresa. O que está sendo feito agora é correr atrás dessas mudanças para recolocá-la no padrão de qualidade que seja adequado para o setor. É nossa obrigação. Algo que temos de fazer. Se a gente não fizer, morre.
Um dos maiores problemas, na avaliação do presidente, diz respeito ao plano de saúde dos funcionários da estatal, o Postal Saúde. Em 2015, do prejuízo de R$ 2,1 bilhões, o Postal Saúde seria responsável por R$ 1,6 bilhão.
No prejuízo de R$ 2 bilhões de 2016, o plano teria participação de R$ 1,8 bilhão. A empresa espera chegar a um acordo com trabalhadores para que haja uma divisão equânime nos custos, já que hoje o funcionário participa com 7%, e a empresa, com 93%.