Impessoalidade anda na contramão do sucesso quando o assunto é gestão de marcas e empresas. Isso é o que defende Bob Deutsch, fundador da Brain Sells, uma consultoria de inovação e comunicação estratégica para grandes marcas, que se concentra em como a história de vida das pessoas contribui para determinar aquilo que consomem. Antropólogo cognitivo e autor do livro As Cinco Virtudes Essenciais, o norte-americano abrirá o Congresso de Estratégia Criativa, no dia 3 de abril, falando sobre inovação e liderança – além de divulgar ideias de seu novo livro, ainda em produção. Por e-mail, ele conversou com ZH sobre a relação entre marcas e consumidores e as mudanças na comunicação entre ambos.
Nos anos 1970, você viveu por dois anos com uma tribo indígena na Amazônia. O que levou dessa experiência para sua atuação como consultor?
Eu estava estudando como as ideias preponderantes se estabelecem em uma cultura. Esse foco pode ser diretamente aplicado ao marketing. Como antropólogo cognitivo, procuro entender como as pessoas se vinculam a ideias e criam crenças. Para a maior parte delas, isso envolve um processo com embasamento emocional, subjetivo, simbólico e não-linear... Contrariando a concepção comum de marketing, que assume uma lógica objetiva, racional.
Sua consultoria, a Brain Sells, fala em estratégias de venda que foquem em pessoas em vez de consumidores. Como isso funciona na prática?
Minha abordagem assume que a categoria "consumidor" é uma caixa muito pequena para colocar as pessoas se você realmente quer entendê-las. "Consumidor" está muito rigidamente focado no ato de comprar um produto. "Pessoas reais" são muito mais do que consumidores de produtos. Os produtos têm que se encaixar na vida das pessoas; a vida das pessoas não precisa se encaixar na ideia de um produto. Então, como comerciante, é melhor saber algo sobre a vida real das pessoas e como elas traduzem "o mundo" no "seu mundo" e justificam essa tradução.
Atualmente, a internet é um dos principais espaços utilizados pelas pessoas para expressarem sua individualidade. Qual o impacto disso na comunicação entre as empresas e o público consumidor?
A maior mudança que a internet causou é que as pessoas agora querem ser marcas, já não são apenas os produtos que querem ser uma marca. As pessoas querem ser apreciadas, vistas, acreditadas, admiradas... E estão fazendo isso em um meio onde não há verificações de validade para como as pessoas se retratam. Além disso, agora que a comunicação não é apenas de empresas para o público, mas entre as pessoas no público, as empresas perderam algum controle sobre como sua marca é definida.
Qual o principal desafio das marcas para se fortalecerem nesse novo contexto?
As marcas precisam conhecer as pessoas mais profundamente do que apenas saber quais os itens que adquiriram recentemente, onde elas estão (dados de localização), a quem estão conectadas. É necessária uma apreciação mais autêntica de como as pessoas pensam, sentem e tomam decisões. Até agora, os programas de análise de dados não cumpriram essa exigência.
Em entrevistas, você destacou a história pessoal como a mais importante das "cinco virtudes essenciais" para que as pessoas alcancem a realização pessoal. Como as pessoas podem usar suas histórias de vida, muitas vezes permeadas por conflitos e dramas pessoais, a seu favor?
A principal coisa para se lembrar é: o significado vem do sentimento, não dos fatos. A "auto-história" de uma pessoa é um amálgama de eventos biográficos, como se sente sobre esses eventos e simboliza-os, e como imprime sua imaginação em tudo isso. Então os fatos são passados pelo filtro de cada um para produzir uma narrativa refratada que motiva a ação.
O Brasil atravessa uma crise econômica, e nesse momento muitas pessoas perderam seus empregos e buscam se recolocar no mercado de trabalho, ou querem se reinventar para manter seus postos de trabalho. Como as virtudes essenciais podem contribuir com isso?
O que é necessário para ser bem sucedido nestes tempos excepcionalmente complexos é romper com o familiar, sendo capaz de fazer novas experiências e ter ideias através do pensamento metafórico... ou o que eu chamo, pensando artisticamente. Até certo ponto, isso pode ser treinado, e estou atualmente escrevendo um livro sobre o que pensamento artístico implica.