Nada de carros voadores, viagens no tempo ou capas de invisibilidade.
A tecnologia na próxima década não será parecida com o que se vê nos filmes futuristas. Ela vai lembrar, e muito, aquela com que já nos acostumamos a viver. Exceto algumas apostas mais arrojadas, a expectativa é de inovação dentro dos modelos já existentes.
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Zero Hora conversou com pesquisadores, professores e futurólogos profissionais para estimar como será a vida em 2027. A inspiração veio de uma série de reportagens publicada em 2007, em que se previa a tecnologia de 2017. Muitas das apostas sobre como seria o ano que se aproxima acabaram se concretizando, apesar de algumas falhas consideráveis que você pode conferir em um videográfico acima.
Aposta: a internet em tudo
Expressões como "a um clique de distância" e "na ponta dos dedos" podem se tornar defasadas em 2027. Isso porque tudo deve estar acessível a um comando de voz, ou com um só gesto. Se hoje já é possível pedir à assistente virtual do smartphone que grave um lembrete, fale sobre a previsão do tempo ou faça uma conta simples, no futuro poderemos, ao enxugar o suor, determinar que seja ligado o ar-condicionado ou, ao fechar os olhos, fazer com que as luzes sejam desligadas.
A expectativa é de que a interação com os produtos eletrônicos se torne uma experiência muito mais imersiva até a próxima década. Deve-se perder, pouco a pouco, o hábito de usar o teclado – seja do computador, seja do celular – para escrever frases curtas ou fazer algumas pesquisas. Será a popularização, também, da chamada "internet das coisas", em que produtos comuns do dia a dia, como óculos e relógios, passam a estar conectados à rede.
– A computação passará a ser muito mais conectada ao indivíduo. Isso é uma mudança porque, ao longo dos anos, tivemos de nos adequar ao computador. Aprendemos a lidar com ele. Agora, é o computador que vai se adequar à gente – estima Sérgio Cavalcante, superintendente do instituto de inovação CESAR.
Com isso, a forma como se acessa o conteúdo deixa de ser importante. Se, atualmente, é preciso um aplicativo ou o site da empresa para pedir uma entrega de comida, logo isso estará disponível na TV, na geladeira, na parede de casa, talvez até no visor do fogão. Os produtos continuarão tendo finalidades próprias, mas serão cada vez mais complementares: será possível começar um projeto no celular, na rua, e continuá-lo no computador de casa praticamente sem barreiras, porque a mesma tecnologia estará em tudo.
Nesse caminho, a evolução do reconhecimento de voz, hábitos e preferências dos usuários tomará proporções ainda maiores do que as atuais. Se os smartphones já são capazes de identificar congestionamentos e apontar as melhores hora e rota para sair de casa, dentro de 10 anos também veremos guarda-roupas indicando a melhor combinação para um terno ou vestido, e geladeiras apontando o melhor cardápio para aquela noite, levando em conta o que há na despensa e o humor da pessoa.
Automatização dos serviços
No Brasil, ainda há poucas iniciativas nesse sentido, mas países como Estados Unidos já têm caixas de supermercado automáticas, em que o próprio consumidor passa os produtos. No Zaffari Higienópolis, um desses equipamentos foi instalado em novembro. Para as lojas, já são testados espelhos interativos que mostram uma representação de como a pessoa fica com determinada roupa.
Espera-se que experiências assim se popularizem e cheguem com força, especialmente, no mercado de serviços. Não seremos, ainda, atendidos por robôs capazes de avaliar o que queremos e o que estamos dispostos a comprar – mas haverá máquinas com capacidade para saber se você quer aquele produto e se só não vai comprá-lo por causa do preço, podendo oferecer desconto.
– É inexorável que tenhamos, até 2027, processadores custando menos de US$ 1 mil com a mesma capacidade do processamento humano. Eles poderão interpretar movimentos, analisar situações complexas e fazer a interface com os seres humanos de maneira completa. Assim, poderão substituir uma série muito grande de tarefas administrativas de rotina – prevê James Wright, coordenador do Programa de Estudos do Futuro, da Fundação Instituto de Administração (Profuturo – FIA).
Wright compara essa revolução nos serviços àquela que atingiu indústria e agricultura. E explica que os empregos no setor não desaparecerão, mas devem se tornar, assim como no campo e nas fábricas, mais especializados.
Casa conectada
A casa tecnológica de 2027 será um reflexo da vida nas grandes cidades: totalmente interligada, conectada e interativa. Produtos diretamente ligados à rede elétrica com fios devem começar a dar espaço a baterias mais potentes, carregamento em massa e integração wireless com qualidade.
Na cozinha, materiais inteligentes serão capazes de identificar o que está sobre eles e reagir de acordo, mantendo o café quente ou deixando o suco mais gelado. Na sala de estar, será a vez de uma experiência 3D totalmente livre de outros equipamentos, com cenas de filmes tomando forma para além da tela da TV sem a necessidade de óculos especiais. Será possível conversar com uma projeção holográfica de outra pessoa no quarto, seja em tempo real ou por mensagens gravadas. Claro que tamanha inovação não chegará a todos os lares: os produtos, mesmo daqui a 10 anos, não serão tão acessíveis, mas depois devem se popularizar.
Realidade virtual
Óculos de realidade virtual já existem, a preços relativamente acessíveis, e com eles dá para se sentir totalmente imerso em outro lugar. Os usos, na atualidade, estão principalmente restritos ao lazer, com jogos eletrônicos permitindo ao usuário assumir o papel de protagonista, como se ele mesmo estivesse enfrentando monstros, desvendando mistérios, liderando exércitos. A realidade virtual é a grande aposta da indústria do entretenimento para os próximos 10 anos. Mas suas aplicações não estão restritas aos games.
Os aparelhos de realidade virtual devem chegar às escolas, permitindo aos professores mostrarem aos alunos como seria viver na Idade Média, ou o que Neil Armstrong encontrou ao pisar na Lua. A adaptação, claro, exigirá boa formação dos profissionais e muitos investimentos das instituições, demorando a chegar a todo o ensino, mas não será tão raro ouvir uma criança dizer que viu figuras como Napoleão Bonaparte e Tiradentes em ação durante a aula. Haverá ainda utilização na formação continuada, facilitando treinamentos das mais diversas áreas.
Na saúde, também haverá aplicações para essa tecnologia. Médicos em formação poderão acompanhar um procedimento cirúrgico real em qualquer lugar do mundo apenas colocando os óculos, e consultas serão facilitadas com o uso do dispositivo.
Outra área que vai crescer muito até 2027 é a realidade aumentada. Elevada ao status de fenômeno com o aplicativo Pokémon Go, em que é possível capturar monstrinhos na rua, ao lado da cama, em cima da geladeira, essa tecnologia vai chegar a outros setores da sociedade. Uma grande aposta está no desenvolvimento de lentes de contato com nanochips embutidos, capazes de mostrar à retina informações sobre o cardápio de um restaurante, o horário do próximo trem e até qual lado de uma trilha é melhor seguir para não se perder.
Revolução no comércio
A mudança não estará apenas no setor de serviços, cada vez mais automatizado: também o comércio passará por outra revolução com o surgimento de mercados totalmente novos. É que vai entrar em jogo, e com propriedade, a impressão 3D – hoje mais popular como hobby, mas prevista como uma gigantesca fonte de inovação para o futuro.
Dada a dificuldade de comprar e montar uma impressora, modelar o que se pretende ver tomando forma e fazer valer o investimento, esse mercado ainda é restrito. Mas na próxima década devemos assistir ao surgimento de lojas de impressão 3D, em que será possível levar o projeto do que se quer e tê-lo em mãos em questão de minutos.
Com isso, pequenas peças de um relógio, por exemplo, ou parte da carroceria de um carro que já não é mais fabricado serão vendidos conforme a demanda, reduzindo a necessidade de se fabricar produtos que talvez jamais sejam usados para atender um mercado que só pode ser estimado. Isso deve reduzir custos em uma série de setores e incentivar a inovação, já que qualquer pessoa poderá pensar, desenhar e imprimir um acessório, um brinquedo, uma peça em casa. Designers e modeladores terão uma área revolucionária a explorar.