Uma espera de dois anos se encerrou às 12h17min desta sexta-feira. No portão B de desembarque do Aeroporto Internacional Salgado Filho, em Porto Alegre, os irmãos haitianos Phadlyn, seis anos, e Lucson Luxana, cinco, enfim reencontraram os pais e a irmã, radicados em Três Coroas, no Vale do Paranhana. A timidez dos meninos em trajes idênticos – camisa xadrez e calça jeans – cedeu diante das surpresas preparadas para lhes dar as boas-vindas: bandeirolas do Brasil e um urso e um leão de brinquedo, representando, respectivamente, força e coragem para esta nova etapa.
Leia mais:
O primeiro Natal do haitiano Phane Luxana na companhia da família desde a chegada ao Brasil
Especial ZH: Inferno na Terra Prometida
Sonhos Partidos: haitianos que vivem no RS querem voltar para casa
Phane Luxana, 30 anos, e Mislene Noel, 37, os pais, e Misline, dois, a caçula, foram personagens de uma reportagem especial de Zero Hora publicada em dezembro. O pedreiro deixou o Haiti em 2014 e se estabeleceu no Rio Grande do Sul para tentar proporcionar uma vida mais confortável aos familiares que deixara para trás. Mislene e Misline chegaram em outubro de 2015. Ao conhecer a história dos imigrantes, a aposentada Marileuza Ruppenthal mobilizou a comunidade três-coroense para reunir a quantia necessária para a confecção dos documentos e a compra das passagens dos garotos. A ideia inicial era trazê-los antes do Natal do ano passado, mas entraves burocráticos fizeram a demora se estender por meses.
– Foi bastante angustiante. Recebi críticas na cidade. Achavam que eu era louca, que estava sonhando demais. Teve momentos em que o Phane queria desistir. Eu dizia que não, que não íamos desistir – recorda Marileuza.
Mislene também enfrentou momentos de pessimismo, sofrendo com o afastamento e as sucessivas postergações. Em mais de uma ocasião, teve de procurar atendimento médico por conta de sintomas relacionados ao estresse. Quando tudo parecia pronto para a jornada em direção ao Brasil, na semana passada, Phadlyn e Lucson foram impedidos de embarcar em Porto Príncipe. Segundo Wilfrid Jeune, tio que os acompanhou na viagem, as autoridades alegaram problemas com a conexão que seria feita no Panamá. Remarcadas as passagens, o trio conseguiu partir na quinta-feira. Na manhã desta sexta-feira, Phane, Mislene e Misline deixaram Três Coroas em um micro-ônibus, acompanhados por amigos, rumo ao Salgado Filho. Perto de Porto Alegre, o pedreiro teve uma intensa crise de choro.
– Fiquei com muita saudade das crianças – conta o pai, falante de francês e crioulo que compreende bem o português. – Fico muito felicidade. Eu tô muito alegria.
A falta de convívio foi amenizada por conversas diárias, em arquivos de áudio e vídeo, via WhatsApp. No saguão do aeroporto, a sintonia se estabeleceu de imediato entre os recém-chegados e a irmã menor, que corriam e brincavam. Cansados, os guris dormiram no colo dos pais a caminho de casa. A ideia agora é matriculá-los em uma escola, integrando-os à rotina já bem estabelecida da família – Phane trabalha em uma empresa que presta serviços à prefeitura, Mislene é funcionária de um bazar, Misline frequenta uma instituição de Educação Infantil e aulas de balé.
– Se Deus quiser e der tudo certo, eu vou ficar por toda a minha vida aqui – planeja Phane.