Numa época em que animais de estimação recebem cada vez mais atenção e projetos de lei para dar proteção aos bichos entram na pauta dos políticos, Quaraí, cidade a Oeste do Estado, quase aprovou medidas que vão na contramão das manifestações a favor da causa animal.
De autoria do executivo, o Projeto de Lei 034/2016, que renova o Código de Posturas do município, apresentava dois trechos que causaram revolta entre ativistas. Na segunda-feira, porém, a Câmara de Vereados modificou as passagens responsáveis pela polêmica e encaminhou o texto de volta ao executivo. Modificado, o PL agora aguarda sanção do prefeito Ricardo Olaechea Gadret (Solidariedade).
No texto original, o 2º parágrafo do artigo 80 previa o abate de animais cujos donos não fossem identificados e que representassem risco de transmissão de doenças ou mesmo de acidentes graves. Já o artigo 84 proibia a população de alimentar os animais nos espaços públicos da cidade, sob pena de multa.
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Com rumores correndo e protestos contrários ao documento, o Ministério Público de Quaraí chegou a recomendar ao prefeito e aos vereadores que retirassem o trecho que autorizava a morte de animais. De acordo com o promotor substituto José Eduardo Gonçalves, o item fere leis a níveis estadual e federal.
Um delas, a lei estadual de número 13.193, proíbe que órgãos públicos exterminem cães e gatos sob argumento de controle de doenças transmissíveis. Segundo o promotor, se a recomendação do MP não for acatada, existe a possibilidade de o tema ser enviado para análise do Ministério Público do Estado.
– Se for contrariado, o Ministério Público (de Quaraí) vai entrar com uma ação declaratória de inconstitucionalidade que será encaminhada ao Procurador-Geral de Justiça do Rio Grande do Sul – advertiu.
Prefeito diz que vai aceitar modificações
Em entrevista ao Diário Gaúcho, o prefeito Ricardo Olaechea Gadret (Solidariedade) nega que haja inconstitucionalidade no artigo criticado pelo Ministério Público de Quaraí e afirma que o executivo não tem a obrigação de acatar recomendações do órgão de justiça. Mas diz que vai aceitar, sem vetos, o texto modificado pela Câmara de Vereadores.
– Não vejo porque vetar. A proposta que enviamos não foi acatada. É preciso que se compreenda que é um dispositivo que trata de muitos temas, um deles é questão dos animais. É um Código de Posturas inovador. No tocante à questão dos animais, eu vou acatar a decisão dos vereadores – garantiu.
Para o prefeito, houve má interpretação dos artigos 80 e 84. Ele admite que, em relação ao artigo que previa o abate de animais que pudessem transmitir doenças, o executivo deveria ter esclarecido que a morte seria alternativa somente após tentativa de tratamento dos bichos.
Sobre os acidentes que os animais poderiam causar, usou como exemplo um boi que, parado no meio da estrada durante a noite, pudesse provocar acidente com os veículos. Nesse caso, o abate do bicho seria justificado.
Sobre a proibição de dar comida aos animais, Ricardo disse que a tentativa era coibir a população de alimentá-los nos espaços públicos, mas que as pessoas não estariam proibidas de fazer isso dentro de casa.
– Eu não sugeria que as pessoas deixassem de alimentar os animais. As pessoas poderiam alimentá-los em casa e depois soltá-los – explicou.
Por fim, o prefeito observou que, se todos dessem comida aos animais nas vias públicas, se criaria um cenário incontrolável.
– Se a moda pega, e a qualquer momento as pessoas alimentassem os animais, teremos uma cidade ingovernável – disse.
Sai o termo "abate", entra a condição de tratar os animais
Para o presidente da Câmara de Vereadores Claudio Bueno (PTB), o texto original do PL do novo Código de Posturas deixava incertezas sobre os cuidados que o poder público deveria ter com os animais.
– O código tinha uma redação dúbia, dava a sensação de que o desejo era o abate dos animais. Nós avaliamos o código para fazer as alterações que o legislativo tem obrigação de fazer – disse o vereador.
Após as modificações, o artigo 84, que proibia a população de alimentar os animais nas ruas de Quaraí e previsa sanções, agora impõe restrição apenas aos animais de grande porte. Os animais de pequeno porte só não poderão ser alimentados na Praça General Osório, a principal da cidade. O argumento é de que a área possui trailers de comida. Quem infringir a regra somente será punido quando a prefeitura já tiver adotado medidas para amenizar a situação dos animais de rua.
Considerado o mais polêmico, o artigo 80 perdeu a palavra "abate" e ganhou a condição de que os animais doentes ou machucados encontrados pelas ruas serão encaminhados à análise do veterinário da Vigilância Sanitária, que decidirá o destino dos bichos após tentativa de recuperá-los.
– O veterinário da vigilância sanitária vai decidir o que vai fazer. Ele tomará as decisões necessárias depois de terem se esgotado todas as alternativas para salvar o animal – garantiu Claudio Bueno.