Conhecido também como derrame, o Acidente Vascular Cerebral (AVC) mata um brasileiro a cada 5 minutos, segundo dados do Ministério da Saúde. Além disso, é uma das principais causas de óbito entre adultos no país, contabilizando mais de 100 mil mortes por ano. Sim, os números assustam e, justamente por isso, os cuidados são essenciais.
O Acidente Vascular Cerebral é resultado do mau funcionamento cerebral. Acontece pelo entupimento dos vasos que levam sangue ao cérebro (isquêmico, 80% dos casos), ou pelo rompimento do vaso provocando sangramento no cérebro (hemorrágico, 20% dos casos).
Conforme o neurologista Edson Issamu, os fatores de risco mais comuns do AVC são hipertensão arterial, diabetes, tabagismo, obesidade, sedentarismo e dislipidemia (distúrbio caracterizado pela presença excessiva ou anormal de colesterol e triglicérides no sangue). Segundo o especialista, todos esses fatores aceleram o envelhecimento das artérias. E o AVC não avisa quando vai chegar. Issamu diz que a pessoa está bem e, no momento seguinte, já apresenta os sintomas.
– A manifestação é rápida. Entre os sintomas, estão a diminuição da força de um dos lados do corpo ou de algum membro isolado, alteração da fala, desvio da rima labial, tontura súbita e persistente, dor de cabeça atípica, perda da consciência e alteração de sensibilidade do corpo – explica o neurologista.
E há outro fator de risco envolvido com a doença: no inverno, os casos de derrame aumentam em 20%.
– No frio, o organismo busca uma redução da perda do calor. Sendo assim, o corpo libera substâncias que minimizam a circulação. As artérias tendem a se fechar mais, diminuindo a circulação geral e a dissipação do calor. Há um aumento da pressão arterial e do trabalho do coração, propiciando arritmias cardíacas. Além disso, temos uma tendência a diminuir a ingestão de líquidos, aumentando a viscosidade do sangue e a possibilidade de coagulação nos vasos. A tendência a ingerir mais gordura no inverno, o que tende a aumentar a obstrução das artérias – diz.
Cerca de 80% das pessoas que sofrem um derrame cerebral precisam enfrentar sequelas motoras (paralisias), dificuldades na fala, alterações de equilíbrio e de comportamento – problemas que podem ser reduzidos com o auxílio de medicamentos, além de tratamentos fonoaudiológicos e fisioterápicos.
Segundo a fisioterapeuta Fabiana Moraes Flores, o AVC é a causa mais comum de incapacidade física em adultos, devido à deficiência sensorial, distúrbios motores, fraqueza muscular e posturas assimétricas resultantes do dano no sistema nervoso central.
– O processo de reabilitação é fundamental para minimizar o impacto da lesão cerebral na qualidade de vida do paciente, com o objetivo de recuperação funcional global dos indivíduos. Saliento que o AVC é uma emergência médica, que deve ser tratada o mais rápido possível, pois “tempo é cérebro”. E a reabilitação deve ser iniciada imediatamente após a estabilização clínica – salienta Fabiana.
Issamu chama a atenção para um engano comum: associar o Acidente Vascular Cerebral com a velhice. A doença pode acontecer com pessoas de qualquer idade, apesar de ser mais prevalente em pessoas acima de 60 anos. Nesta e nas próximas páginas, saiba como preveni-lo e conheça histórias de pessoas que sobreviveram ao ataque desse mal silencioso.
Pego de surpresa na pescaria
Há quatro anos, durante uma pescaria, o engenheiro agrônomo Luiz Alberto Flores percebeu que algo estranho acontecia em seu corpo.
– Minha perna direita estava anestesiada. Fui pegar um copo e foi como se a minha mão tivesse vida. Notei que ela não obedecia aos comandos do cérebro. Fiquei sentado, achando que fosse um cansaço momentâneo. Depois de uma hora, notei que todo o meu lado direito estava paralisado. Minha língua estava enrolando a ponto de não conseguir explicar o que tinha – relembra.
Os amigos o levaram para o pronto-atendimento de Guarapari (ES). Em seguida, foi encaminhado para um hospital, onde ficou por 16 horas aguardando atendimento em um corredor, sem qualquer medicação. Só depois foi levado para um hospital de referência para casos de AVC, onde ficou internado por 15 dias.
– Em função de tudo que aconteceu, posso dizer que não tenho sequelas. Mas três pontos não voltaram ao normal: minha caligrafia, que ficou pior; minha perna direita, que, eventualmente, puxa um pouco; e o trânsito, porque tenho tendência de puxar o corpo para a direita – conta.
O tratamento incluiu fisioterapia, para caminhar e falar e, até hoje, Flores usa remédios para controlar a glicemia, os triglicerídeos e o colesterol. Depois do derrame, emagreceu 15 quilos, melhorou a alimentação e voltou a fazer atividades físicas.
– Estou muito melhor. Não tenho o nível de estresse que tinha, administro melhor o tempo, faço mais o que gosto de fazer. Meus hábitos melhoraram, mas podem melhorar mais. É só questão de disciplina – assume.
Um novo começo após a doença
O Acidente Vascular Cerebral de Magda Pauler Pedroso a pegou de surpresa há cinco anos, quando ela estava em uma festa de aniversário, em Caxias do Sul. Os sintomas foram confusão mental, dificuldade na fala, perda das forças e do equilíbrio. Na mesma hora, foi levada para o pronto-socorro da cidade, onde permaneceu em observação por três horas. Só quando seu lado direito começou a paralisar, encaminharam-na para um hospital.
– Se as pessoas tivessem mais informações sobre o AVC, talvez eu não tivesse ficado tanto tempo esperando no pronto-socorro – comenta a aposentada, hoje com 50 anos.
Após exames, o diagnóstico: Magda estava com trombose na carótida esquerda, e o excesso de gordura no sangue acabou coagulando, causando o derrame cerebral.
– Eu trabalhava à noite e comia muita porcaria. Cheguei a ter quase 90 quilos. Então, resolvi mudar meus hábitos alimentares, fazer dieta e caminhadas. Eu já havia perdido nove quilos quando tive o AVC – conta.
Quando deixou o hospital, Magda usou cadeira de rodas por três meses. Hoje, caminha com o apoio de muletas, pois perdeu parte dos movimentos do lado direito do corpo. A memória nominal só foi recuperada 30 dias depois do acidente e, até hoje, ela precisa de medicamentos.
– Ainda tenho que melhorar a locomoção. Já cai várias vezes e fico com medo de andar na rua. Além disso, é horrível depender das pessoas para ir ao banheiro e para me vestir. Mas tento me virar sozinha – afirma.
Antes do AVC, Magda trabalhava como operadora de uma central de monitoramento. Foi aposentada por invalidez, mas não em definitivo. Atualmente, faz acompanhamento com fisioterapeuta, neurologista e cardiologista. Também participa do programa Piscina Alegre, onde faz hidroginástica, e do grupo Anima, que dá assessoria para quem tem algum tipo de deficiência, ambos da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).
– Devo grade parte da melhora à minha filha e aos grupos que faço parte – diz, agradecida.
A filha, Evelíny Pauler Pedroso, 30 anos, incentivou a mãe a voltar a estudar. Hoje, Magda está no 4º semestre de Pedagogia na UFSM e utiliza três transportes para ir até o campus.
– Tem horas que dá vontade de desistir, mas tenho me superado todos os dias – alegra-se.
A médica virou paciente
No dia 20 de janeiro de 2009, às 21h, aos 47 anos, a médica infectologista Jane Costa sentiu dor e rigidez na região cervical e no braço esquerdo, além dificuldades para realizar movimentos. Isso tudo enquanto dirigia seu carro. Mas não perdeu a consciência, nem tempo: ligou para a um serviço de emergência, que a encaminhou para o Hospital de Caridade.
O diagnóstico foi de hemorragia subaracnoidea com hipertensão intracraniana severa. Jane ficou em coma, precisou fazer traqueostomia e respirou por meio de aparelhos por cerca de 20 dias. Teve alta após 37 dias.
A recuperação dos movimentos e do estado nutricional foi lenta, já que a médica – agora no papel de paciente – apresentou complicações inerentes a situações críticas que envolvem esse tipo de doença, como infecção urinária e candidíase sistêmica.
– Permaneci com dificuldades para executar alguns movimentos e certa atrofia do membro inferior direito. Recuperei as outras funções – conta a médica, usando os termos usuais de seu trabalho.
Jane é hipertensa e faz uso regular de medicação. Com o susto, teve de mudar seus hábitos. Precisou fazer muitos exercícios até recuperar a autonomia da vida e reassumir as atividades profissionais, em junho de 2009, diminuindo-as, posteriormente. Quanto à alimentação, Jane possui hábitos saudáveis:
– Não fumo, não bebo e não como doces regularmente, somente em situações de exceção e em pequena quantidade.
Como prevenir o AVC?
– Evite excessos na alimentação, de maneira geral, mas, principalmente, controle a ingestão de alimentos gordurosos
– Faça atividades físicas regularmente. O certo seria todos os dias, mas três vezes por semana já é eficaz
– Não fume. O cigarro é um dos grandes vilões no processo de obstrução das artérias
– Faça check up pelo menos uma vez por ano, independentemente da idade