Estava estirado no sofá em um sábado de dezembro quando recebi aquela ligação. Era uma vendedora de uma tradicional rede de hotéis de Porto Alegre. Eu e minha esposa havíamos ganhado duas diárias em qualquer unidade daquela bandeira no Brasil – mas deveríamos ir até a sede deles para conhecer um novo produto. Pareceu uma boa troca.
A recepção foi como para um rei. Café? biscoitos? O ar-condicionado está bom? Fiquem para almoçar, por favor. Eu sabia que tentaria ser convencido de alguma coisa, mas era o preço para receber minha cortesia.
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O produto era manjado: um clube de férias em que pagaríamos para desfrutar de três ou quatro semanas por ano em um hotel da rede – são seis ou sete no Brasil, se bem me lembro. Uma vendedora desinibida se esforçava para seguir um script que a fizesse parecer amigável e ser persuasiva ao mesmo tempo. Depois de duas longas horas, os números começaram a aparecer.
Pagaríamos R$ 18 mil de entrada, e muitas parcelas de R$ 2.500. Um ótimo negócio, argumentava: no fim das contas, pagaríamos R$ 45 mil, enquanto a soma de todas diárias, se pagas separadamente, seria R$ 180 mil.
A oferta era bem peculiar: não precisaríamos ler o contrato e não poderíamos pensar em casa. Tínhamos que escolher lá e naquele dia. Evidentemente, não topamos.
A vendedora não desistiria tão fácil. Tentou nos convencer, baixou o preço. Era em vão. Minha mente já flutuava longe: quem cairia nessa de preencher um cheque de R$ 18 mil sem conhecer o contrato – e ainda engessar as férias dos próximos 15 anos?
Agradecemos pelo café e fomos embora. Aquilo estragou meu domingo: havíamos sido alvos de uma peça de marketing-de-susto. Uma tentativa suicida de arrancar a compra por impulso, vinda – e que decepção – de uma rede pela qual sempre cultivei simpatia.
Um mês se passou até que, por acaso, nesta semana topei com o nome da rede em um site de reclamações. Choviam queixas contra o tal clube de férias. Gente que havia se arrependido e não conseguia cancelar o contrato. Ou descoberto que um dos hotéis havia sido descredenciado. Ou que encontrava enormes dificuldades para conseguir uma reserva.
Só pude pensar: problemas evitáveis. Muitos dos dramas que vivemos no trato com o dinheiro são resultados de más escolhas que fizemos. Uma compra desnecessária. Um serviço que não usamos. Uma conta alta demais. Há de se tratar melhor do dinheiro. Não deixe seu cheque nas mãos de qualquer um. E nem sua assinatura em qualquer contrato.