Há pelo menos um ano, Elisandra Minozzo resolveu excluir a carne de sua dieta. Com dificuldade para encontrar opções vegetarianas de baixo custo perto do trabalho, o caminho foi começar a preparar em casa a boa e velha marmita.
- Aprendi a montar um prato mais saboroso, de acordo com meu paladar. Para minha grata surpresa, passei a gastar menos da metade do que gastava almoçando todos dias em restaurantes - conta a servidora estadual de 37 anos, que costuma preparar os alimentos na noite anterior. - Para compararmos valores, poderia dizer que, com o dinheiro que economizo, pago as aulas de ioga - calcula.
Quentinhas voltam a ser comuns no intervalo de almoço
Seja motivada pela busca por uma vida mais saudável, seja para poupar o vale-
refeição, muita gente tem redescoberto nas marmitas alternativa barata para a hora do almoço. O preço médio de um prato em restaurantes pulou 65% nos últimos cinco anos, conforme o Índice de Preços ao Consumidor (IPC) feito pelo Centro de Estudos e Pesquisas Econômicas (Iepe) da UFRGS, ficando acima da variação dos alimentos no supermercados (54%). Isso tem levado muitas pessoas a evitar comer fora.
- A marmita voltou com tudo. Há quem, por exemplo, tem almoçado em restaurantes a preços mais acessíveis alguns dias por semana, e nos outros, levado marmita. Tudo para economizar - afirma o professor dos cursos de Gastronomia do Senac-RS Bruno Ivanoff.
Comida saudável entra no cardápio do almoço do porto-alegrense
O especialista explica que, além de fazer bem ao bolso, organizar a própria alimentação em casa também é uma forma de trazer ingredientes mais saudáveis ao dia a dia - e resistir às tentações dos bufês, com suas frituras e seus doces.
Foi o que ocorreu com Cláudia Nunes, 24 anos, e o marido Marcelo Varela, 29 anos, que há cinco meses decidiram que era tempo de perder os quilinhos a mais. Optaram por trocar os banquetes ao meio-dia por uma quentinha composta por legumes, arroz integral, feijão, frango e carnes magras.
- Antes, meu marido gastava R$ 12 por dia no almoço, e eu, até R$ 15. Agora, só precisamos de metade - relata Cláudia.
Combinando a adesão da marmita com a prática de exercícios físicos, ela conseguiu emagrecer 16 quilos.
- Foi bom para o bolso e para a saúde - conclui ela.
Para empresários, faturamento dos restaurantes será 20% menor
Rodízios de pizza com a família, espeto corrido com amigos. A rotina de banquetes em restaurantes saiu dos planos de Alemir Assunção, 35 anos, nos últimos meses. As dificuldades trazidas pela inflação somaram-se à perda de emprego na área técnica de uma concessionária e impuseram o desafio de enxugar os gastos.
- Agora, esses almoços com muita gente, só em casa. Senão não há dinheiro que chegue - diz.
Ao lado da mulher e do filho de nove anos, ele descobriu nas churrascadas aos domingos uma forma de manter os laços familiares. É na casa de uma tia que se reúnem duas dezenas de amigos e parentes para comer, beber e bater papo.
- Sai muito mais em conta do que ir ao restaurante. E a diversão é a mesma - reforça.
Trata-se de uma conclusão que tem sido compartilhada por muitos brasileiros no atual contexto. A diretora-executiva da seccional gaúcha da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Thais Kapp, percebe que o hábito dos clientes tem mudado em decorrência da crise:
- Muita gente tem deixado de sair para jantar fora dois ou três dias por semana para ir apenas uma vez, sábado ou domingo, gastando um pouco mais. Aquele hábito de colegas de trabalho de ir em um rodízio mais caro de vez em quando também ficou mais raro.
A sensação dos empresários do setor é de que, neste ano, haja uma queda de 20% no faturamento, embora a Abrasel avalie que esta é uma previsão pessimista: os números apontam para desempenho igual ao de 2014.
- As pessoas não deixaram de ir ao restaurante. Mas estão mais contidas com as entradas, a sobremesa e as bebidas, por exemplo - diz Thais.
Os estabelecimentos que têm conseguido manter o fluxo são aqueles que não repassam todo o aumento do custo com energia e insumos, ou que oferecem opções mais econômicas, como meia porção, pratos à la carte ou bufê a quilo.
- É nítido que os clientes estão com o orçamento apertado, o dinheiro do mês está acabando mais rápido. Antes, os pagamentos no cartão de crédito começavam pelo dia 20. Agora, já a partir do dia 12 - explica a diretora da Abrasel.
Colaborou William Mansque
O repórter Erik Farina produzirá as matérias da série Encare a Crise.