Provavelmente você já se encontrou com ele hoje. Tradição na mesa do brasileiro, o café é sinônimo da primeira refeição da manhã e de pausas para relaxar ao longo do dia. Não é para menos. Segundo o IBGE, a bebida perde apenas para a água em consumo no país. Aliás, o Brasil é o segundo maior mercado consumidor da bebida no mundo - atrás apenas dos Estados Unidos - e o maior produtor mundial do grão desde 2013.
É uma bebida democrática, também, acessível a qualquer classe econômica. Um cafezinho de R$ 0,50 está disponível logo ali, no barzinho da esquina; e os grãos mais requintados estão nas prateleiras dos empórios, aguardando degustadores que chegam a pagar mais de R$ 300 por um quilo de café gourmet. O fato é que a bebida agrada paladares diversos, o que a torna uma das mais populares do mundo.
Mas como se descobriu que o grão poderia render um líquido tão bom? Uma velha lenda conta que, por volta do século V, um pastor da Etiópia teria observado que suas cabras ficavam muito agitadas depois de comerem folhas da planta. Séculos mais tarde, monges passaram a fazer infusões dos frutos. A beberagem os ajudava a se manter acordados durante suas vigílias noturnas. Só no século XV, na Pérsia, foi que o café começou a ser torrado, originando o preparo e o consumo como conhecemos hoje.
Fruto faz parte da história economica do Brasil
O café foi o principal produto de exportação do Brasil no decorrer do século XIX e o início do século XX, garantindo as divisas necessárias à sustentação do Império e da República Velha. Os registros do início do cultivo datam de 1727, no Pará, mas a produção em escala para exportação só ganharia força no século XIX, com o aumento da procura pelos mercados consumidores da Europa e Estados Unidos.
Hoje, de acordo com dados do Ministério da Agricultura, o Brasil é o maior produtor e exportador mundial de café. São cerca de 287 mil produtores em mais de 1,9 mil cidades do país. No ano passado, a safra somou mais de 45 milhões de sacas em 15 Estados do país, com destaque para Minas Gerais. E, segundo o barista Marcus Lellis, hoje pode se dizer que é mito a informação de que o melhor café produzido por aqui é exportado:
- Muitos dos cafés que consumimos são os mesmos do que os que são exportados. De 10 anos para cá, houve uma mudança, e ela ainda está em forte transformação, que resulta do próprio consumidor brasileiro buscar um tipo de café com qualidade melhor. E você vê esse reflexo no mercado, com a quantidade de cafeterias especializadas surgindo no Estado.
Assista ao vídeo: Café: aroma e sabor
Combina com saúde, sim
Médico formado pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Jader Pires, 72 anos, tem o café em suas lembranças mais remotas da infância. O cheiro do café recém passado remete a visitas à casa da avó, quando tinha sete anos. Anos mais tarde, o produto voltaria a ser parte importante de sua vida. O médico, que mora em São Sepé, passou a estudar o tema para poder dar respostas aos pacientes em seu consultório.
- Com frequência, me perguntavam se o café fazia bem ou mal para a saúde e eu não tinha onde pesquisar. Comecei a viajar, encontrei publicações no Exterior, e passei a ter contato com pesquisas - comenta.
O estudo como autodidata acabou o transformando em barista. Conhecedor rigoroso dos cafés, Jader é capaz de especificar a origem de um grão apenas analisando seus aspectos físicos. Sua sensibilidade olfativa é tanta que ele já foi juiz sensorial em concursos de baristas no Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Recentemente, esteve na Colômbia para um congresso que discutia, entre vários tópicos, os efeitos fisiológicos da bebida.
Pesquisando em livros em inglês e alemão, o médico desmistificou alguns mitos em relação ao café. Entre eles, a de que é vetado para quem tem pressão alta. O médico defende que, a menos que o paciente tenha intolerância à cafeína a bebida pode ser consumida, com moderação, por qualquer pessoa:
- Quem tem gastrite ou pressão alta precisa fazer tratamento.Se o fizer corretamente, pode usar o café em sua dieta tranquilamente. Tudo depende da quantidade, da qualidade do café e da boa preparação. São poucos os casos de patologias inibitórias para o consumo do café.
O médico afirma que o consumo de 300mg de cafeína por dia é saudável. Isso corresponde a cinco xícaras de 60ml. Mas atenção: o consumo diário inclui também outros alimentos que contêm a cafeína, como chás, por exemplo.
Xícaras de prevenção ao Mal de Alzheimer
Muitas pesquisas têm sido feitas para comprovar que beber um cafezinho pode prevenir a degeneração cognitiva provocada pelo envelhecimento. Nascida em São Gabriel, a neurocientista e pesquisadora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Lisiane Porciúncula, trabalha há pelo menos 10 anos em pesquisas que comprovam que a cafeína auxilia na prevenção do Mal de Alzheimer.
A pesquisa foi feita em parceria com a Universidade de Coimbra e foi feita em modelos experimentais da doença. O estudo mostrou que camundongos que receberam cafeína por 12 meses apresentaram mais facilidade em memorizar e desempenhar tarefas. Ao mesmo tempo, os animais já envelhecidos que receberam a substância tiveram desempenho similar ao dos animais jovens.
- Há evidências de que a cafeína preservaç as proteínas sinápticas e permite uma deterioração mais lenta delas, fazendo com que a perda seja menor. A nossa conclusão é que a cafeína previne o declínio cognitivo decorrente da idade - explica Lisiane.
A pesquisa envolve a substância cafeína, presente no café, em chás, no chimarrão e no chocolate.
Curiosidades
- O café é a segunda bebida mais popular do mundo, ficando atrás só da água.
- Café não é só cafeína. Cafés do tipo arábica tem apenas 1,2% da substância em sua composição. Já no café robusta, o mais comum no mercado, tem 2,4%. O restante são substâncias como antioxidantes, sais minerais e vitaminas.
- Kopi Luwac é um tipo de café exótico, citado até no cinema (o filme Antes de Partir, faz referência a ele). Produzido na Indonésia, ele é feito a partir das fezes do civeta, um mamífero africano que se alimenta do grão de café. No Brasil, uma versão é produzida no Espírito Santo, a partir das fezes do pássaro Jacu.
- Para que a experiência de beber um café seja realmente saborosa, é preciso ter um cuidado sequencial. Iss passa pelo plantio, colheita, torrefação, moagem e, principalmente, a preparação do café. "Não adianta o café ser da melhor qualidade, se não tiver uma pessoa que saiba realmente como preparar a bebida", enfatiza o médico e barista Jader Pires.
- Café gelado também é bom. Alternativa para os dias quentes, o chamado "frapê" pode ser feito com sorvete ou com leite gelado e café.
Café e suas categorias
O barista Marcus Lellis Vieira, da Baristo, nos ajudou a classificar os tipos de café existentes nas gôndolas de supermercados e empórios locais. Antes de tudo, ele esclarece que a bebida é dividida em dois tipos: arábica e robusta. O arábica representa três quartos da produção mundial de café, é rico em aroma e ligeiramente ácido, tendo uma concentração de 1,2% de cafeína. Já o robusta representa um quarto da produção e tem maior concentração de cafeína: 2,4%. Conheça algumas características e saiba como reconhecer as categorias do café:
Café Gourmet
O café gourmet é diferenciado por ser mais aromático, ter mais sabor e praticamente nada de amargor. É feito com 100% de grão arábica, uma espécie delicada, com um cultivo diferenciado, e com uma carga genética especial. O arábica tem um número de cromossomos maior que o das outras espécies, o que o torna mais complexo (e mais cheiroso, também).
- Podemos fazer uma analogia com o vinho. Assim como temos vários tipos de uvas, que vão despertar vários sabores e aromas, no café também temos sabores mais adoçados ou mais cítricos, e isso tem interferência direta da espécie e da maneira como foi cultivado - explica Marcus.
Além de ser 100% arábica, para ser considerado um café gourmet o pacote do produto precisa ter uma válvula para liberar gás carbônico. O café que não tiver válvula não é gourmet. A seleção dos grãos também é um indicativo importante: eles geralmente são maiores e praticamente todos do mesmo tamanho.
Outra forma de identificá-los é pela homogeneidade da torra. Geralmente, os cafés com grãos em tamanhos ou cores diferentes são de qualidade inferior e não estão no ponto de maturação. O quilo de um café gourmet custa em torno de R$ 40, mas pode chegar até R$ 1 mil.
Café Superior
De modo geral, os cafés superiores têm em sua composição 80% de café arábica e 20% de robusta. Nestes, não existe uma grande diferença na classificação de cores e tamanhos dos grãos.
Café Tradicional
É o mais popular e barato do país. É uma mistura de vários tipos de grãos arábica e robusta, sem muita exigência para a seleção. Em função do aspecto pouco atraente da matéria-prima, é um tipo vendido moído. O sabor também é inferior. Porém, é o tipo mais encontrado em supermercados e o mais consumido no Brasil.