O cineasta italiano Bernardo Bertolucci morreu em Roma, nesta segunda-feira (26), segundo divulgou o jornal local La Repubblica. O diretor de 77 anos estava em casa no momento do óbito, mas a causa da morte não foi revelada. De acordo com o jornal Corriere Della Sera, Bertolucci sofria de uma "longa doença".
Nascido em Parma, nordeste da Itália, em 1941, Bertolucci era filho do poeta Attilio Bertolucci e da professora Ninetta Giovanardi. Em mais de 50 anos de carreira no cinema, atuou como produtor, roteirista e dirigiu 20 filmes. Seu primeiro longa, A Morte (1962), foi escrito por seu amigo Pier Paolo Pasolini (1922-1975) – outro grande nome do cinema italiano. Antes de se lançar como cineasta, trabalhou como assistente de direção de Pasolini no aclamado Accatone – Desajuste Social (1961).
Integrante do Partido Comunista na juventude, Bertolucci realizou produções com grande teor político, como 1900 (1976), que narra a história da Itália no início do século 20; O Conformista (1970), sobre a esquerda no período do fascismo italiano; e Antes da Revolução (1964), trazendo como protagonista um jovem com conflitos existenciais que passa a questionar os valores burgueses. Foi com Antes da Revolução, Bertolucci passou a ter maior visibilidade.
Em 1987, O Último Imperador, filme sobre o último imperador da China, recebeu nove estatuetas na cerimônia do Oscar, incluindo melhor filme, melhor roteiro e melhor diretor (até hoje é o único cineasta italiano a vencer nas três categorias). O longa conta a saga de Pu Yi (John Lone), declarado imperador quando ainda era criança, vivendo enclausurado na Cidade Proibida, sem contato com o mundo exterior, até ser deposto pela Revolução Xinhai.
Nos anos 1990, lançou produções como O Céu Que Nos Protege (1990), com John Malkovich e Debra Winger; O Pequeno Buda (1993), protagonizado por Keanu Reeves; Beleza Roubada (1996), com Liv Tyler no começo de carreira e Jeremy Irons.
Depois de Assédio (1998), a produção de Bertolucci começa a diminuir. Em 2003, ele lança o cultuado Os Sonhadores, que combinava tanto o engajamento político de suas produções do começo de carreira quanto o ensaio sobre amor e sexo, visto em Assédio e O Céu Que Nos Protege. Ambientado em Paris durante os protestos de maio de 1968, o filme gira em torno da intensa relação do estudante americano Matthew (Michael Pitt) com o casal de irmãos Isabelle (Eva Green) e Theo (Louis Garrel). O amor pelos filmes é o que aproxima os três, mas o desejo e a paixão estreitam o relacionamento entre o tímido estrangeiro e os jovens franceses libertários.
Depois de Os Sonhadores, o último filme de Bertolucci é Eu e Você (2012), sobre um adolescente introvertido (Jacopo Antinori) que se esconde no porão de casa para passar as férias longe da família. Porém, a chegada de sua extrovertida meia irmã mais velha, Olivia (Tea Falco), atrapalha seus planos.
Nos últimos anos, Bertolucci utilizava uma cadeira de rodas. Em 2007, ele recebeu um Leão de Ouro honorário pelo conjunto da obra do Festival de Veneza, enquanto em 2011, foi homenageado com uma Palma de Ouro honorária no Festival de Cannes pela sua produção.
Controvérsia com Último Tango em Paris
Em 1972, o cineasta lançou Último Tango em Paris, uma de suas obras mais celebradas, mas que também provocou grande escândalo por uma de suas cenas. Em 2016, o filme voltou a ser assunto em razão de declarações que Bernardo Bertolucci deu em 2013 e que ressurgiram no YouTube. A razão da polêmica está no comentário do cineasta italiano sobre a famosa "cena da manteiga", na qual o personagem de Marlon Brando (1924 – 2004), então com 48 anos, sodomiza a jovem interpretada por Maria Schneider (1952 – 2011), com 19. Bertolucci afirma, no depoimento, não se arrepender da decisão no set:
– Não disse a ela o que estava acontecendo porque queria sua reação como uma garota e não como uma atriz. Sinto-me culpado, mas não me arrependo. Não queria que Maria interpretasse a raiva e a humilhação; queria que sentisse a raiva e humilhação.
As declarações de Bertolucci causaram revolta entre celebridades como Jessica Chastain e Evan Rachel Wood. Em seguida, o diretor italiano se defendeu, divulgando um comunicado na imprensa italiana:
"Anos atrás, na Cinemateca Francesa, alguém me pediu detalhes sobre a famosa cena da manteiga. Eu os especifiquei, mas talvez não tenha ficado claro que decidi, junto com Marlon Brando, não informar a Maria sobre o uso da manteiga. Queríamos sua reação espontânea àquele uso incomum (da manteiga). Estão dizendo que Maria não foi informada sobre a violência e isso é falso! Maria sabia de tudo, pois leu o roteiro. Tudo estava lá, com exceção da ideia da manteiga."
Na cena em questão, Marlon Brando simula usar manteiga como lubrificante para abusar de Schneider. Antes de sua morte, em 2011, a própria atriz havia comentado a polêmica sequência:
– Eu me senti humilhada e, para ser honesta, senti-me um pouco estuprada, por Marlon e Bertolucci. Depois da cena, Marlon não me consolou nem pediu desculpa. Ainda bem que tudo foi feito em apenas um take.