As pessoas estão vivendo cada vez mais, e falar do mercado prateado, ou da economia prateada, é imprescindível. Transpor a linha dos 60 anos deixou de ser um marcador de “reta final”. Indivíduos nessa faixa etária ainda estão em plena atividade profissional e, muitas vezes, não querem pensar em aposentadoria e parar de trabalhar.
Mórris Litvak, 41 anos, é CEO e fundador da startup Maturi, que promove a diversidade etária nas organizações e ajuda pessoas a partir de 50 anos a encontrar novos caminhos profissionais. Nesta entrevista, ele fala sobre a importância dos idosos para as empresas, preparação para a aposentadoria e o valor da interação entre colaboradores de diferentes idades, além de como cada um pode se qualificar para continuar trabalhando após os 60 anos ou para voltar a buscar um emprego depois da aposentadoria.
— Quando as gerações estão não só juntas, mas interagindo, trabalhando, se respeitando, há um diálogo, uma troca, e não o choque geracional — afirma Litvak.
Qual o valor das pessoas acima de 60 anos para o mercado de trabalho?
O valor é extremamente alto porque são pessoas que têm uma grande experiência, não só profissional, mas de vida, que é muito válida e cada vez mais valorizada hoje em dia. A tal soft skill, inteligência emocional, que não só a experiência, mas a maturidade, traz bastante. E tem o alto nível de comprometimento dessas pessoas. É uma geração que foi educada para ter o mesmo emprego a vida inteira, muito diferente dos jovens. Hoje é uma grande dificuldade para as empresas a retenção dos jovens porque eles têm outra visão, outra cultura, a de ter diferentes experiências. Enquanto, para o jovem, é estranho ficar muito tempo no mesmo emprego, para o mais velho é o contrário, é estranho ficar trocando de emprego o tempo todo. (Os funcionários acima de 60 anos) têm um comprometimento que traz um equilíbrio nessa questão dos jovens. Há estudos e cases de clientes nossos mostrando que a diversidade etária tem o potencial de deixar as equipes mais criativas, mais produtivas, mais inovadoras, e de melhorar o clima. Quando as gerações estão não só juntas, mas interagindo, trabalhando, se respeitando, há um diálogo, uma troca, e não o choque geracional. E, além disso, essas pessoas têm o conhecimento do público consumidor dessa faixa etária. O chamado mercado prateado ou economia prateada está crescendo cada vez mais. Esse consumidor mais velho será cada vez mais numeroso. Para as empresas entenderem e saberem se comunicar com esse consumidor, precisam ter essas pessoas dentro de casa. Mas elas ainda sofrem com o etarismo, o grande preconceito etário que tem na nossa sociedade e que é ainda mais forte no mercado de trabalho.
Que espaço essa faixa etária tem hoje nas empresas?
O espaço é muito reduzido e ainda está diminuindo. Vai chegar a um ponto em que vai começar a crescer porque não tem outro jeito. A gente está vivendo mais e tendo menos filhos, então, vai demorar mais tempo para se aposentar, vai precisar de renda para viver esse tempo mais longo. Acredito que existirão políticas públicas para fomentar isso, já que tem a questão previdenciária. Aos poucos, acho que essa cultura vai mudar, daremos mais valor a essas pessoas. Mas, hoje, sabemos que essa não é a realidade. A realidade ainda tem um foco maior nos jovens, com equipes mais jovens, por causa de todos os estereótipos negativos com relação aos mais velhos. Um deles é a questão de custo, achar que os mais jovens são mais baratos, o que nem sempre é verdade. Pode ser que sim, mas não necessariamente. Com isso, perdem toda essa qualidade que as pessoas trazem também. Temos uma cultura, na nossa sociedade, que ainda valoriza muito mais os jovens de forma geral. A questão de estética é também muito forte. Tecnologia pesa muito: há o estereótipo de que o mais velho não sabe mexer com tecnologia. Como a tecnologia é cada vez mais presente no trabalho, essas pessoas estão perdendo espaço no mundo corporativo, no emprego tradicional, e tendo que se virar de forma mais autônoma, como empreendedores, consultores, freelancers. Como focamos no público a partir de 50, a gente vê que as empresas ainda estão contratando nessa faixa. De 60 para mais, está mais difícil. Para quem tem 60 anos ou mais, a saída está sendo trabalhar por conta própria, por enquanto.
Tem que ter um mix de curiosidade com humildade para isso. Buscar atualização contínua. Saber que as coisas estão mudando e que, por mais que eu tenha experiência e muito para ensinar, também tenho muito para aprender. Para você estar aberto a isso, para também aprender com pessoas mais jovens, ser gerido por pessoas mais jovens, trabalhar com pessoas mais jovens, tem que ter humildade.
MÓRRIS LITVAK
CEO e fundador da startup Maturi
O que deve fazer a pessoa de 60 anos ou mais que quer permanecer no mercado de trabalho ou voltar a ele após a aposentadoria?
O foco principal é atualização. Tem que ter um mix de curiosidade com humildade para isso. Ou seja, é buscar atualização contínua, o tal do lifelong learning (em tradução livre, aprendizado ao longo da vida; educação contínua). Saber que as coisas estão mudando e que, por mais que eu tenha experiência e muito para ensinar, também tenho muito para aprender. Para você estar aberto a isso, para também aprender com pessoas mais jovens, ser gerido por pessoas mais jovens, trabalhar com pessoas mais jovens, tem que ter humildade. Muita coisa que eu fiz agora não é mais feita daquela forma ou é já totalmente automatizada, então preciso reaprender muita coisa, desaprender algumas. E até eventualmente estar aberto para mudar de área, para olhar para outros horizontes de carreira, de formato de trabalho. A abertura para o novo é fundamental. Às vezes, tem que dar um passo para trás para depois conseguir dar dois para a frente. E abraçar a tecnologia. Olhar a tecnologia como uma aliada e não como uma barreira. Perder o medo e buscar auxílio de profissionais, se capacitar e fazer muito networking. Participar de cursos, eventos, saber usar as redes sociais de forma profissional.
Por que as empresas, em geral, não auxiliam na preparação da aposentadoria dos funcionários?
Percebo que as empresas não enxergam muito valor no sentido de qual retorno que elas terão. As empresas não fazem nada só para serem boazinhas, elas têm que ver o retorno de qualquer investimento. Já vi muitos casos em que diminuem os processos trabalhistas porque a pessoa retorna como um consultor, um mentor, quando sai com dignidade, com planejamento. Poucas empresas ainda investem nisso e é uma coisa muito importante. Faz uma diferença brutal na vida ter esse planejamento para a aposentadoria. Principalmente quando está há muito tempo, às vezes décadas, na mesma empresa, a pessoa fica completamente perdida quando sai, tem uma queda no padrão de vida e não tem um planejamento, não só financeiro, mas pessoal e profissional. Hoje em dia falamos do pós-carreira, o que a pessoa vai fazer quando estiver aposentada, porque ela não vai querer ficar parada e não vai poder. Então, às vezes, é transformar o hobby num trabalho ou fazer um trabalho social. Você está vivendo mais, vai ficar muito tempo aposentado, não dá para ficar parado. Isso afeta a saúde física e mental.