Agradeço aos leitores que manifestaram as suas opiniões sobre a notícia de que um projeto propondo a mudança do hino rio-grandense será apresentado na Assembleia. O debate não é novo, mas ganhou força quando vereadores negros optaram por não cantar, durante a sua posse, em Porto Alegre, o trecho "povo que não tem virtude, acaba por ser escravo".
É correto afirmar que, no contexto da época, a letra se referia à dominação exercida pelo centro do país sobre o Rio Grande do Sul. Mas esse argumento não invalida os outros. Ao contrário. Os reforça. Não é razoável admitir que a opressão econômica e política exercida por um poder central autoritário seja culpa da falta de virtude das vítimas — sejam elas gaúchas, africanas, europeias, muçulmanas ou de qualquer outra origem. A culpa pela agressão é do agressor.
Nosso hino completou 55 anos poucos dias atrás. É uma bela composição, que em nada perderia com uma adaptação. Continuaria a ser cantado, com orgulho ainda maior, por todos nós. No contexto e na época em que foi feito, esse ponto tinha uma outra conotação. Podemos, agora, aproximar a essência da forma, sem que precise haver vencedores e vencidos. Essa guerra acabou, mas precisa ser lembrada de uma forma correta, até para que não se repita.
Sei que piso em terreno pantanoso, mas o dia em que externar ideias e conversar sobre elas de uma forma transparente e democrática for um problema, o problema será bem maior do que um hino.
O deputado Luiz Fernando Mainardi propõe trocar "povo que não tem virtude, acaba por ser escravo" por "povo que não tem virtude, acaba por escravizar". Apenas uma ressalva: tentei cantar com a melodia original e não consegui. Não fecha. Ou tenho que esticar demais o "ecravizaaaaaaar" ou botar um acento que não existe no "escravízar". Fora isso, é um debate necessário e que conversa com uma visão de sociedade refletida por um dos seus maiores símbolos. Se o Rio Grande do Sul mudar apenas algumas palavras do seu hino para torná-lo ainda mais fiel ao que ele realmente quer dizer, essa sim será uma façanha que servirá de modelo a toda a Terra.