"Bala Fini por um real. Vai dizer que não vale a pena?" Deodoro, área militar que foi sede do tiro paraolímpico, é longe. Na volta, abri mão do táxi. Mirei no ônibus. BRT, esse que deveria ter também em Porto Alegre, mas saiu pela culatra.
Corrida com obstáculos. Um quilômetro no sol de 30°C. Cruzei pelo parque, passei por baixo do viaduto, entrei e saí da estação de trem. Subi uma escada, desci a outra, pedi informações.
O voluntário disse direitinho o nome da parada para fazer a troca. E depois pegar a direção da Barra. Fui repetindo tudo baixinho, confiante na memória que quase nunca me abandona.
Comprei o cartão por R$ 6,80 e embarquei. Tinha lugar vazio.
A viagem rolava. Entravam e saíam pessoas coloridas, alegres, falando alto. Cruzamos subúrbios e manchas verdes de mata desabitada. Lotação máxima. Gente em pé. A menina de cabelo encaracolado gritou de novo. "Bala Fini por um real. Vai dizer que não vale a pena?"
O bordão
Roubou
Minha atenção
Era um pacote pequeno. Não comprei, mas gostei da cena e do sotaque. "Vai dizerrr que num vale a peana?" Foi a deixa involuntária para o pastor que acabara de embarcar.
A Bíblia na mão
E na garganta,
A salvação
Uma moça suada e feliz sentou ao meu lado. Me empurrou contra a janela com a sua largura. Ao lado dela, em pé, um rapaz de camisa regata. A cicatriz de bala no ombro emoldurada pela tatuagem malfeita de estrela.
Falavam sobre festa em Jacarepaguá.Eu olhava pela janela o desfile das estações. General alguma coisa, uma palavra indígena, Leila Diniz. Não nessa ordem.
Foi na desordem que voltei do transe: no caminho, esqueci do nome que eu dizia baixinho minutos atrás. Não tinha mapa no ônibus. E eu era um ET.
Tiro sem alvo. O susto, ainda bem, cedeu o assento preferencial à senhora sensação de relaxamento.
Perdido, perdido e meio, pensei. Fiquei vendo as árvores e as casas empoleiradas umas nas outras, as ruas cheias de pó e as carcaças dos automóveis.
"Mas tudo é apenas paisagem, pensava eu." Lembrei da música do Bebeto Alves:
Alguns minutos. Os prédios foram ficando mais altos e juntos, o trânsito intenso. Desci, nem sei onde. Um supermercado, homens com uma britadeira furando o asfalto, um hotel de poucas estrelas. Na recepção, perguntei qual o endereço aqui.
Bati no bolso. Dei oi pro iPhone.
Questão de opção:
Estar perdido
Ou apertar o botão
Saquei o celular do coldre e chamei um Uber, que me levou de volta à segurança de uma paisagem familiar.Mas faltou a resposta, me cobrei. Faltou dizer pra menina de cabelo encaracolado.
Sim, vale a pena
Mesmo se a embalagem
For pequena
Tamu junto
Do Rio de Janeiro, o gaúcho Ricardinho, o melhor do mundo, projeta a final do futebol de 5. É neste sábado, às 17h, contra o Irã, com o qual o Brasil empatou na primeira fase.
TRIBUNA
Aqui o leitor tem a palavra final.
Cego ou deficiente visual?
Politicamente incorreta, por parte de quem forma opinião, usar a expressão "cego" para se referir aos jogadores do futebol de 5 na Paraolimpíada. A expressão correta, inclusive politicamente, é "deficiente visual". Até porque, mesmo não tendo nenhuma deficiência, há muitos "cegos" neste país, inclusive no jornalismo. Vocês de ZH, às vezes, superam-se. Carlos Augusto Nunes
Sobre a "bronca" do leitor que reclama que usaste "cego" ao invés de "deficiente visual". Cego é considerado aquele que nada ou quase enxerga. Deficiente visual já é qualquer pessoa que precisa de auxílio para enxergar, como por exemplo, óculos, mesmo em grau pequeno. Tal definição é usada pela OMS, que em 2014 estimou que 8% da população mundial é deficiente visual e menos de 1% é cega.
Prof. Roberto Borges, Phd
Sem razão a bronca que recebestes. Os cegos preferem assim serem chamados: cegos e não deficientes visuais. Consideram a expressão que mais os identificam. Informação que me foi dada por um cego.
Maria Berenice Dias
Reações no Facebook à chamada de contracapa de ZH, falando sobre Futebol de 5 e o fato de que os jogadores não reclamam do juiz, porque não enxergam:
Fostes infeliz no teu comentário. Antes de "escrever", procura te apropriar da luta das PcD. Foi grosseiro e ridículo teu comentário.
Clarissa Meira Ferreira
O que esperamos de quem forma opinião pública é mais responsabilidade.
Luciana Lara
A menção foi desrespeitosa.
Bruno Scheidemandel
Trabalhei com uma aluna cega, que é membro da Abradevis, de Novo Hamburgo, e foi ela quem esclareceu (…) sobre o termo (…) Bem, o termo é esse mesmo, se a pessoa for cega.Parabéns pela cobertura da Paraolimpíada!
Lucrécia Fuhrmann