A gênese do plano golpista deflagrado em 2022 e abortado por falta de apoio dos comandantes do Exército, Freire Gomes, e da Aeronáutica, Baptista Júnior, será conhecida nos detalhes na próxima semana, quando forem divulgadas as mais de 800 páginas do relatório da Polícia Federal. Por enquanto, o que se tem é o resumo do que se atribui a cada um dos 37 indiciados. O relatório não terá a resposta para outra pergunta que está na cabeça dos brasileiros: por que os generais Hamilton Mourão e Luiz Eduardo Ramos não entraram no listão?
Vice-presidente da República, Mourão, ao que tudo indica, não foi convidado para as reuniões que trataram do golpe que não era chamado de golpe, mas de reação ao resultado de uma eleição que o ex-presidente Jair Bolsonaro até hoje acha que ganhou. Logo no primeiro ano de governo, Mourão entrou em rota de colisão com Bolsonaro. Embora nunca tenha sido infiel, muitas vezes demonstrava discordar de opiniões emitidas pelo então presidente.
Na pandemia, Mourão divergiu de Bolsonaro em relação às vacinas e às máscaras. Usava até uma com as cores do Flamengo, seu time do coração. O vice caiu de vez em desgraça com a família Bolsonaro quando colou em Eduardo Bolsonaro, o filho Zero Três, o apelido de "bananinha". O motivo? As interferências indevidas de Eduardo nas questões de Estado, incluindo uma crise diplomática com a China.
Na hora de escolher um companheiro de chapa, Bolsonaro logo descartou Mourão e escolheu o general Braga Netto, homem da sua estrita confiança. Mourão resolveu ser candidato ao Senado pelo Rio Grande do Sul, votou em Bolsonaro, mas sua turma era outra. Se Bolsonaro não confiava em Mourão e não o quis como vice na tentativa de reeleição, por que os mentores do golpe o convidariam para uma quartelada? Essa é a lógica. Se Mourão conversou com outros generais nos bastidores e ajudou frustrar o golpe, não se sabe. Convidado a dar entrevistas, ele, que na campanha era tão solícito, fechou-se em copas — pelo menos até a metade da tarde desta sexta-feira (22).
E o general Ramos, que ocupou funções estratégicas no Planalto, por que não teria sido convidado? A colunista Bela Megale, de O Globo, revelou que o motivo é prosaico: Ramos tem fama de fofoqueiro e, por isso, não convinha compartilhar com ele um plano de permanência no poder, ainda mais com detalhes que incluíam o assassinato do presidente Lula e do vice Geraldo Alckmin para extinguir a chapa vencedora.