No discurso de posse na Assembleia Legislativa, um texto simples, sem citação de filósofos ou arroubos retóricos, o governador Ranolfo Vieira Júnior ressaltou que seu mandato terá “o tempo de uma gestação”.
— Pego o timão de um barco em bom rumo. Nove meses é o tempo de uma gestação, prazo no qual a natureza produz sua principal criação. Quero governar o Rio Grande do Sul com o mesmo carinho que um pai cuida de um filho desde o nascimento, cuidando do agora, mas preparando para o futuro — disse Ranolfo, pai de Gabriela, Gustavo e Guilherme.
Boa parte dos 20 minutos do pronunciamento foi dedicada a enaltecer o ex-governador Eduardo Leite, a quem o sucessor definiu como “um jovem mestre” com quem aprendeu muito em 39 meses de governo:
— Ser vice-governador do Eduardo Leite foi viver numa sala de aula a proporcionar lições cotidianas de dignidade, discernimento e competência.
Ranolfo e a esposa Sônia, com quem está casado há 26 anos, tiveram uma recepção cordial do presidente da Assembleia, Valdeci Oliveira (PT). No breve pronunciamento que fez logo depois, Valdeci registrou que caberá a ele dar posse a dois governadores – Ranolfo e quem for eleito em outubro.
Os convidados notaram uma diferença na parede do salão nobre do gabinete do presidente da Assembleia: Valdeci reabilitou o quadro de Getulio Vargas, que havia sido retirado por Ernani Polo (PP). Getulio ocupou o lugar do retrato de Osvaldo Aranha, que tinha sido colocado na parede por Gabriel Souza (MDB).
Confira a íntegra do discurso do governador:
“Durante 39 meses, convivi, compartilhei, compadeci, concelebrei e contribuí com a digna e bem sucedida gestão do governador Eduardo Leite.
Neste momento tão significativo, devo confessar que não me inquietam os desafios. Assumo serenamente, como é do meu feitio, o peso do dever e a honra de poder servir ao povo gaúcho. Estou ciente do propósito e das possibilidades. Ademais, ser vice-governador do Eduardo Leite foi viver numa sala de aula a proporcionar lições cotidianas de dignidade, discernimento e competência.
Já conto 36 anos no serviço público. Abençoado pela oportunidade de ser secretário de Segurança e vice-governador, colhi dela todo o proveito possível. Talvez eu tenha sido um bom discípulo de um jovem mestre, cujo futuro já ilumina a cena política nacional. Vivi na prática aquilo que aprendi na Faculdade de Direito e que ensinei a meus alunos na Ulbra e da Academia de Polícia: a justiça é a principal virtude do governante.
Foi assim que vi a determinação de um governo inteiro no sentido de superar a crise fiscal, como trabalho compartilhado de cada dia e de cada hora. Vi que, na política de gestão, impor restrições ao gasto público exige renúncias, contraria interesses, demanda capacidade de resistência a pressões – e aflige os governados e também os governantes. Aflige, sim, é forçoso reconhecer. E a dificuldade de superar essa aflição e a tendência de buscar a linha de conforto, vem determinando os conhecidos ciclos depressivos nas funções essenciais do Estado.
Só o espírito de justiça faz resistir. Justiça e devoção ao interesse público. Resistência à demagogia, à solução fácil e à irresponsabilidade na gestão. Abertura às mudanças, para sair da zona de conforto e para enfrentar os problemas sem medo.
Vencer a crise fiscal é parte do que poderíamos chamar de plataforma de lançamento do nosso Estado para novos tempos de prosperidade econômica, competitividade e desenvolvimento social. A vitória sobre a crise fiscal é componente importante dessa plataforma, mas não é o único. O problema é que, dentre todos, esse é o mais facilmente desmontável. E já vimos isso acontecer repetidas vezes. Seja por ação de forças externas, seja por debilidades internas.
Ainda que não tivesse ocupado no governo as funções que ocupei, nele convivido e aprendido com quem convivi e aprendi, não pensaria diferente por um segundo sequer. A responsabilidade do uso de recursos públicos impõe ao gestor razões da Razão e princípios morais que não podem ser postos de lado. Pego o timão de um barco em bom rumo.
A gestão Eduardo Leite e Ranolfo Vieira Júnior tem ainda nove meses pela frente. Nove meses é tempo de uma gestação, prazo no qual a natureza produz sua principal criação. Para nós, será um tempo de permanente continuidade, porque estaremos sempre olhando para muito além do dia 31 de dezembro! Quero governar o Rio Grande com o mesmo carinho com que um pai cuida de um filho desde o seu nascimento: cuidando do agora, mas preparando o futuro!
É de Napoleão a frase maldita: “Depois de mim, o dilúvio!” Nós dizemos diferente: depois de nós, a floração, a colheita, a continuidade de uma vida melhor. Os homens passam, o Estado fica. Já agimos assim com o legado que recebemos do governo anterior, que trouxe bases importantes sobre as quais evoluímos. E assim faremos também em relação ao legado que queremos entregar – e para que inclusive tenha prosseguimento. O parlamento gaúcho é testemunha e protagonista dessa prática que materializa um novo patamar da política gaúcha. Usaremos esse tempo com responsabilidade, sabedoria e discernimento – sem jamais perder o rumo.
Acompanhei cada tijolo posto até aqui na grande obra de criar as condições para que nosso Estado retome o virtuoso caminho do progresso e do desenvolvimento econômico e social. Cada tijolo. Conheço a obra que estou assumindo. Andei por todo o canteiro dessa obra. Fui secretário de estado, vice-governador, substituí diversas vezes o governador. Assisti o ponto de virada do placar e vamos, com a ajuda de Deus, preservar todas as vitórias conquistadas. Virar o placar significou reintroduzir nosso Estado na mesa da competitividade.
Como se diz no jogo de xadrez, vínhamos historicamente em “posição perdedora”. Tínhamos claras evidências disso nas comparações com os outros estados da Região Sul. Graças às corajosas reformas que fizemos, o Estado, hoje, honra seus compromissos. Solta as amarras, olha para fora, cria parcerias, inova, investe e parte para a solução de problemas nunca antes enfrentados. É um novo tempo para o Rio Grande do Sul!
Vamos virar o jogo também do nosso estado de espírito. Chega de pessimismo, chega de retrocessos, chega de empates. É para frente que nós temos que andar. É de mais vitórias que nós precisamos. E nós podemos, sim! Ninguém ouse duvidar da capacidade do nosso Estado. Com confiança, otimismo e muito trabalho!
Foi por isso que:
- Soltamos as amarras do ICMS elevado, e hoje o nosso é um dos mais baixos do país;
- Soltamos as amarras da logística, com recursos próprios, parcerias e concessões;
- Soltamos as amarras dos salários dos servidores, que sofreram com atrasos durante 57 meses;
- Soltamos as amarras das dívidas com prefeituras e convênios;
- Soltamos as amarras da insegurança, até onde nos permitem o Código Penal e a Lei de Execuções Penais.
Resumindo: estamos voando alto. Na altura dos nossos sonhos. Voando alto, voltamos a investir. Não sem problemas, não inclusive sem alguns equívocos, mas tratando o Rio Grande como grande ele merece ser.
Diz a regra que ali onde está posto o dinheiro, estão, também, as prioridades. E elas foram exatamente para as amarras a soltar: educação, saúde, logística, pavimentação, sistemas penal e socioeducativo, e para os diferentes setores da economia.
Amigos! O povo gaúcho não tem maior interesse nos conflitos da política. Admitamos: na maior parte dos casos, esses conflitos estão mais para o recreativo do que para o produtivo.
As ruas me confirmaram o que as aflições e êxitos do governo me diziam: ao povo interessa o bom governo. É isso que ele mais quer da política, ainda que muitos talvez não saibam expressar. O povo quer que os poderes públicos proporcionem as condições para o exercício da liberdade, sem a qual não existe prosperidade.
A paixão política e o espírito de corpo ideológico, sempre presentes nas sociedades políticas, não estimulam a grande maioria das pessoas. Para o cidadão comum das cidades e dos campos, o que vale é a estrada, a rua, o saneamento, a boa escola, o posto de saúde, a liberdade, o emprego, a roda da economia girando e o setor público ajudando em vez de atrapalhar.
Uma prioridade não pode esperar: o desenvolvimento do Rio Grande do Sul. Desenvolvimento que significa emprego, educação, saúde, tudo em frente e em evolução!
As dores e as aspirações dos gaúchos serão nosso guia. E quero estar sempre perto das pessoas, nas ruas, onde o Rio Grande acontece, onde me forjei policial, sempre com dois ouvidos e uma só boca. Para construir soluções, resolver problemas e seguir em frente. E, para isso, me permitirei introduzir alguns conceitos de gestão integrada que pratiquei na Secretaria da Segurança, para que possamos, inclusive, acelerar o nosso Avançar!
Governador Eduardo Leite. Nossa convivência foi sempre cordial e convergente. Levo desse período dois troféus imateriais, mas muito relevantes: o troféu da lealdade com que servi ao nosso governo e o troféu do convívio com um estadista. Agora, a lealdade se estende no tempo com o nome de gratidão.
Senhor presidente e senhores deputados. Somos vizinhos neste território da política estadual. Estarei ali do lado, atravessando a rua. Quero que essa proximidade seja não apenas simbólica, mas real e proveitosa. Quero que continuemos a andar lado a lado. Mãos dadas, sempre que possível. E agradeço cada passo que, juntos, já trilhamos neste período de nossa história.
Nesta legislatura, as relações entre o Legislativo e o Executivo foram postas num elevado nível. Os deputados acolheram e aperfeiçoaram as propostas que encaminhamos para sua deliberação. E assim queremos continuar. Somos gratos por havermos encontrado na nossa Assembleia Legislativa a mesma percepção sobre o melhor modo de servir ao povo gaúcho, ouvindo no entanto, também o contraditório.
Minha palavra de respeito também aos demais poderes e órgãos de Estado. A nossa convivência harmônica não diz apenas com a liturgia das representações que ocupamos, mas com a clara noção de que o interesse público deve ser o guia de todos nós.
Agradeço aos secretários de Estado pela parceria, convergência, lealdade e zelosa atividade. A harmonia caracteriza essa equipe de homens e mulheres que durante três anos e três meses, em meio aos solavancos do percurso, preservou o rumo e não perdeu de vista os elevados objetivos do governo. Enfrentamos juntos uma das maiores crises sanitárias da história da humanidade, e eu sou testemunha de quanto isso nos consumiu pessoal e coletivamente.
Queridos colegas de governo, todos vocês: recebam meu profundo reconhecimento por terem sempre procurado fazer o certo – com humanidade e responsabilidade. Agradeço à equipe da Secretaria de Segurança Pública, à nossa Brigada Militar, à nossa Polícia Civil, ao nosso Instituto Geral de Perícias, ao nosso Corpo de Bombeiros Militar, ao nosso Detran, a nossa Polícia Penal, e a todos os colegas que sustentaram – eu não tenho dúvida de dizer – o maior avanço na segurança pública que este Estado já viu em toda a sua história. Muito obrigado a vocês, muito obrigado! Agradeço a cordialidade e a atenção recebida dos prefeitos, vereadores, lideranças políticas e comunitárias.
Saibam que estarei trocando de cadeira, mas não meu modo de ser.
Faço uma referência especial à imprensa, a quem respeito pelo seu relevante papel social. Palavras de gratidão, enfim, a Deus, aos amigos aqui presentes e a toda população gaúcha.
E por isso me permito falar também, neste momento, como pessoa física. Porque, na última linha, independente dos cargos ou posições, todos somos gente – e eu não quero jamais negociar a minha essência. Pois é ela que vai me garantir, mesmo sendo governador, todos os dias lembrar que não sou melhor do que o gaúcho mais simples, lá do interior ou aqui da periferia, que acorda todo o dia para trabalhar e sustentar a sua família. É a ele que o poder público deve servir – ao povo! – não aos homens de poder.
Sou e sempre fui um homem simples. É da minha natureza, mas é também da minha escolha. Porque a simplicidade é solução no problema, é respeito na divergência, é limite no poder, é pacificação na guerra. Esse modo de ser faz parte da bagagem que trago para a função que estou assumindo. Não farei de mim o que não sou, e peço a Deus para não ser menos do que o dever me impõe.
Foi assim quando passei no concurso para delegado de Polícia, e procurei a delegacia onde houvesse mais encrenca. Onde fosse mais necessária a atividade para a qual eu me havia preparado, era lá que eu queria estar. E assim tem sido, com o apoio da minha família, testemunha amorosa do que estou a afirmar.
A vocês, meus pais Célia e Ranolfo, minha esposa Sonia, meus filhos Guilherme, Gustavo e Gabriela, o meu amor e o meu devotamento. Minha gratidão e meu permanente pedido de perdão pela ocupação dos meus dias.
E por fim, ao Rio Grande do Sul, cujas cores gloriosas estão representadas naquela bandeira, entrego o sentido da minha vida e o juramento da minha lealdade como governador de todos os gaúchos. Muito obrigado!”