Comunicados divulgados por prefeituras do Litoral Norte estão sendo interpretados como um desestímulo à vacinação de crianças de cinco a 11 anos, que começa hoje. Diz o texto:
“Em cumprimento à recomendação do MP-RS, o município X informa:
- A vacinação contra a covid-19 é um direito da população e dever do Estado sua disponibilização.
- A vacina Cominarty/Pfizer, ainda que em casos raros, pode causar miocardite e pericardite, além de outras reações adversas, conforme a bula da vacina”.
É verdade que a bula faz essa advertência, mas os informes das prefeituras não esclarecem que a chance de uma criança ter miocardite ou pericardite é, segundo as sociedades brasileiras de pediatria e cardiologia, 20 vezes maior com a covid-19 do que com a vacina.
— Outra questão é que a miocardite por vacina é autolimitada e sem sequelas. Miocardite por covid-19 pode causar sequelas e arritmias persistentes — complementa a o cardiologista Marcelo Cypel, brasileiro que trabalha no Canadá e já vacinou os filhos.
O procurador-geral de Justiça, Marcelo Dornelles, diz que o Ministério Público do Rio Grande do Sul é a favor da vacinação de crianças e que a ressalva feita pelas prefeituras do Litoral é baseada em iniciativa isolada do promotor de Torres, Marcelo Araújo Simões.
O promotor justificou a orientação dizendo que enfatizou três pontos: a publicidade da vacinação infantil, com a observância do direito à informação, inclusive quanto aos riscos de miocardite (casos raros), o direito fundamental e a obrigação do poder público de disponibilizar a vacina e o direito de escolha dos pais, não podendo ser negada a matrícula em escola pública ou privada para as crianças que não se vacinarem.
Dornelles diz que nada pode fazer porque o promotor tem autonomia e porque, de fato, a bula da Pfizer alerta para eventuais efeitos adversos. Faltou, repita-se, a informação correta: a chance os efeitos adversos da covid são piores e mais frequentes do que os da vacina.
Posicionamento conjunto do Departamento Científico de Cardiologia da Sociedade Brasileira de Pediatria e do Departamento de Cardiologia Pediátrica e Cardiopatias Congênitas da Sociedade Brasileira de Cardiologia diz que "os benefícios da vacinação na população de crianças de 5 a 11 anos, com a vacina Comirnaty/Pfizer/BioNTech, superam os eventuais riscos associados à vacinação".
No início de janeiro, a Sociedade Brasileira de Pediatria emitiu nota dizendo que "o Brasil deve temer a doença, nunca o remédio". Sem citar nomes, a nota é uma resposta ao presidente Jair Bolsonaro, contrário à vacinação de crianças. Diz a SBP: "A população não deve temer a vacina, mas, sim, a doença que ela busca prevenir, bem como suas complicações, como a covid longa e a Síndrome Inflamatória Multissistêmica, manifestações que consolidam a necessidade de imunização do público infantil".
Em outro parágrafo, assegura: "A vacina previne a morte, a dor, sofrimento, emergências, e internação em todas as faixas etárias. Negar esse benefício às crianças, sem evidências científicas sólidas, bem como desestimular a adesão dos pais e dos responsáveis à imunização dos seus filhos, é um ato lamentável e irresponsável que, infelizmente, pode custar vidas".