No dia em que recebi a confirmação de que teria folga do trabalho no feriadão de 12 de outubro, me perguntei para onde poderia ir com segurança. O primeiro desejo foi visitar minha mãe e meus irmãos, mas para isso teria de fazer um teste do tipo RT-PCR. Melhor esperar um pouco mais.
Poderia passar três dias cuidando das plantas e colocando a leitura em dia, mas bateu um desejo de respirar outros ares. Depois de uma assembleia familiar, em que avaliamos praia, serra, pampa e até uma esticada a Santa Catarina, optamos por Cambará do Sul.
Eu não conhecia os cânions e me ressentia dessa falha no currículo de viajante, ainda mais agora que o Parque dos Aparados da Serra vai entrar na nossa pauta com o lançamento, na quarta-feira (14), do edital para a concessão desse patrimônio ambiental à iniciativa privada.
Decisão tomada, hotel reservado e guia contratado, passei a consultar a previsão do tempo para ver se havia risco de passar três dias trancada no hotel. No início, eram dois dias de chuva e um solzinho acanhado na segunda-feira. O prognóstico foi mudando e lá pelo meio da semana se consolidou a previsão de sol sem nuvens nos três dias.
Depois de sete meses em casa, a excitação era comparável à da primeira viagem de avião, do primeiro voo transatlântico, dos passeios de carroça que demoravam quase um dia para se chegar ao destino. Até a arrumação da bagagem foi diferente. Máscaras descartáveis e de pano, álcool gel, roupa de frio, tênis confortável para caminhar em terreno íngreme.
Cambará nos recebeu com a gentileza que só se encontra nas cidades do Interior. E desde o primeiro minuto nos sentimos protegidos, com todo mundo usando máscara e respeitando os protocolos.
O simpático seu João, que nos levou ao Itaimbezinho, contou que a cidade está dividida em relação à concessão que será anunciada na quarta-feira pelo ministro Ricardo Salles. Com a construção de uma estrada que vai cortar o parque, deixando a cidade fora da rota, o temor é de que os turistas passem direto e tomem o rumo de Gramado e Canela. Nas audiências públicas, a comunidade sugeriu mudanças no projeto, mas foi ignorada.
Escrevo ao final do primeiro dia de jornada pela beleza de uma das paisagens mais impressionantes do Brasil. Mesmo com máscara, deu para sentir a pureza do ar que vem da mata de pinheiros, tecnicamente chamados de araucárias.
Não vimos o leão baio nem o lobo guará, mas testemunhamos o abandono do parque, a carência de estrutura, as péssimas condições da estrada de chão batido. Tomara que a concessão venha para tornar o parque mais acessível, mas que não afaste os turistas de Cambará, essa cidade simpática em que se comem trutas de tirar o chapéu.