Se o presidente Jair Bolsonaro pensar no país e não nos interesses da bancada evangélica no Congresso, vetará sem titubear o perdão milionário a igrejas e templos, aprovado por deputados e senadores em mais um ato de irresponsabilidade com o dinheiro público.
Já deveria ter vetado, mas, pressionado pelos líderes religiosos, o presidente deixou a decisão para o último dia — esta sexta-feira (11). Existe a possibilidade de vetar o perdão, mas compensar com outros benefícios que não se justificam em um estado laico.
A recomendação da equipe econômica é óbvia: vetar para não aprofundar ainda mais o rombo das contas públicas. A assessoria jurídica orienta pelo veto usando o argumento legal: deputados e senadores não podem, simplesmente, perdoar débitos tributários.
A forma como a proposta nasceu é reveladora do tamanho do absurdo. Foi enxertada em um projeto que tratava de regras para uso do dinheiro economizado pela União em negociações de precatórios.
A ideia era definir a aplicação desse dinheiro no combate à pandemia, mas uma articulação coordenada pelo deputado David Soares (DEM-SP) garantiu que o jabuti fosse colocado em cima da árvore. David é filho do missionário R.R. Soares, líder da Igreja Internacional da Graça de Deus, não por acaso uma das maiores beneficiadas com o projeto.
De acordo com dados da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, instituições religiosas têm hoje R$ 889 milhões em débitos inscritos na Dívida Ativa da União, considerando apenas dívidas previdenciárias e tributárias.
Convém lembrar que as igrejas não pagam impostos sobre as fortunas que arrecadam dos fiéis. Os débitos que deputados e senadores querem perdoar se referem principalmente a dívidas previdenciárias, o que inclui a contribuição patronal e o repasse de valores descontados de empregados — o que caracteriza apropriação indébita — e à contribuição sobre lucro de empresas vinculadas às igrejas.
Defender o veto não significa ser contra a religião nem desrespeitar a crença de cada um. Igreja não é — ou não deveria ser — atividade econômica.
A imunidade tributária de que gozam igrejas transformadas em empresas é indefensável. O perdão de dívidas referentes a contribuições devidas soa como um escândalo que deveria ser repudiado pelos eleitores dos deputados que votaram a favor desse absurdo.
No Senado, a votação foi simbólica. Na Câmara, nominal. A repórter Silvana Pires fez um levantamento de como votaram os deputados gaúchos. Confira:
A favor:
- Afonso Hamm (PP)
- Alceu Moreira (MDB)
- Bibo Nunes (PSL)
- Giovani Cherini (PL)
- Giovani Feltes (MDB)
- Jerônimo Goergen (PP)
- Liziane Bayer (PSB)
- Lucas Redecker (PSDB)
- Marcelo Brum (PSL)
- Marcelo Moraes (PTB)
- Márcio Biolchi (MDB)
- Maurício Dziedricki (PTB)
- Nereu Crispim (PSL)
- Osmar Terra (MDB)
- Pedro Westphalen (PP)
- Sanderson (PSL)
- Santini (PTB)
Contra:
- Afonso Motta (PDT)
- Bohn Gass (PT)
- Daniel Trzeciak (PSDB)
- Danrlei (PSD)
- Fernanda Melchionna (PSOL)
- Henrique Fontana (PT)
- Maria do Rosário (PT)
- Marcel van Hattem (Novo)
- Marcon (PT)
- Marlon Santos (PDT)
- Paulo Pimenta (PT)
- Pompeo de Mattos (PDT)
Não votaram:
- Carlos Gomes (Republicanos)
- Heitor Schuch (PSB)