Até o mensalão e a Lava-Jato, a figura do procurador-geral da República era de interesse restrito. A maioria absoluta dos brasileiros não tinha ideia de quem ocupava o cargo nem de qual era o seu papel. Da mesma forma, ignorava os nomes e a forma como são escolhidos os ministros do Supremo Tribunal Federal. Os escândalos de corrupção e a mudança no perfil de atuação do Ministério Público Federal jogaram luzes sobre a figura do procurador-geral. O protagonismo de Rodrigo Janot nos últimos quatro anos e as recentes denúncias contra os principais figurões da República farão com que cada passo de sua sucessora, Raquel Dodge, seja examinado com lupa.
Raquel assume hoje cercada de desconfianças por parte dos que temem o esvaziamento da Lava-Jato. Desde que se candidatou na eleição interna do MP, ela era tida como a preferida do presidente Michel Temer, a queridinha do ministro Gilmar Mendes e a inimiga de Janot. Segunda colocada na lista tríplice, foi escolhida por Temer em tempo recorde. Ao visitá-lo tarde da noite, fora de agenda, acabou ampliando as dúvidas sobre sua independência.
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Dois fatos dos últimos dias deixaram a futura procuradora-geral em situação ainda mais delicada: o pedido da defesa de Temer ao ministro Edson Fachin para que devolva a última denúncia de Janot à PGR e a informação da revista Época de que ela anunciará hoje uma portaria dando prazo de 30 dias para a saída dos procuradores que atuam na Lava-Jato. Montar uma equipe de sua confiança é prerrogativa do procurador-geral. O problema é que, em junho, falando como candidata, Raquel garantiu que não mexeria na força-tarefa da Lava-Jato.
– Vou fazer um convite para que os atuais membros continuem esse trabalho importantíssimo – disse em vídeo gravado pelo repórter Eduardo Matos, da Rádio Gaúcha.
O pedido da defesa de Temer passa a ideia de que, com Raquel no comando, ela arquivaria a denúncia. A pretensão é considerada ridícula por um procurador que conhece muito bem a jurisprudência do STF:
– Não cabe devolver a denúncia. Uma vez feita, tem de ser apreciada pelo STF.