O arremedo de reforma política aprovado em comissão especial da Câmara dos Deputados é sob medida para garantir a reeleição de quem tem mandato. Além de criar um fundo público para financiar campanhas, com valor superior a R$ 3 bilhões, institui o "distritão", sistema pelo qual os mais votados são eleitos, independentemente do desempenho coletivo dos partidos.
Do PT ao PSDB, passando pelos pequenos partidos, o distritão é alvo de críticas, mas a chance de ser aprovado por três quintos dos votos, em dois turnos, na Câmara e no Senado, é real. Como a "bolsa eleição" se diluiria em um sistema com centenas de candidatos em todo o Estado, boa parte dos deputados já percebeu que o distritão é uma forma de eliminar concorrentes e inibir a renovação na Câmara e nas Assembleias.
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– Além de encarecer a eleição, o distritão enfraquece os partidos. Ninguém gosta de partido, mas o fato é que em todas as democracias do mundo você precisa organizar a vida política e os partidos têm um papel – diz o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB).
– Esse remendo é uma ameaça à democracia. Vai encarecer a campanha e favorecer quem já tem mandato ou as pessoas que entram na política pela popularidade conquistada em outras áreas – concorda o deputado federal Henrique Fontana (PT), defensor do voto em lista.
Mesmo os adversários do distritão reconhecem que ele tem apelo popular, já que é difícil para o eleitor compreender a lógica do quociente eleitoral e aceitar que um candidato menos votado ganhe a cadeira porque pegou carona no desempenho da legenda ou da coligação.
Se em 2014 o critério fosse o do distritão, no Rio Grande do Sul, o resultado final teria três diferenças na Câmara e seis na Assembleia (veja quadro abaixo). Com 103.006 votos, José Fogaça ficou na primeira suplência. Ele, Fernando Marroni e Ronaldo Zulke (ambos do PT), fizeram mais votos do que José Otávio Germano (PP), Ronaldo Nogueira (PTB) e José Stedile (PSB), mas não se elegeram.
Na Assembleia, João Reinelli (PV) conseguiu entrar com 9.098 votos, enquanto seis candidatos com mais de 30 mil ficaram na suplência.
Se o distritão prevalecer, a lógica dos partidos vai mudar. Haverá um número menor de candidatos, com campanhas mais caras porque a meta será ficar entre os primeiros. O voto na legenda deixará de existir, favorecendo o individualismo.
Mais do que o distritão, a grande polêmica, para os eleitores, é a criação do novo fundo de financiamento das campanhas. Hoje, já existem na prática duas formas de aporte público: o fundo partidário e a estrutura com que contam os detentores de mandato – de verbas de gabinete e assessores lotados na base eleitoral. Por mais que a Lava-Jato tenha escancarado a relação entre a corrupção e o financiamento privado, o eleitor não tolera ver o dinheiro do orçamento ser direcionado para as campanhas.
Aliás
O ex-vice-prefeito Sebastião Melo (PMDB) alerta que o distritão vai "reforçar a ditadura das cúpulas partidárias, que escolherão os poucos que serão candidatos", inibindo a possibilidade de renovação.