A reação positiva do mercado à fixação da meta de R$ 159 bilhões para o déficit deste ano e de 2018 confirma que colocar um bode na sala ainda é a melhor forma de fazer uma sala apertada parecer confortável depois que se retira o animal. Ao acenar com um déficit de R$ 170 bilhões, o governo fez parecer que R$ 159 bilhões foram uma vitória e tanto da área econômica, comandada pelo ministro Henrique Meirelles, o ex-banqueiro que inspira confiança ao mercado. O detalhe de serem R$ 159 bilhões – e não R$ 160 – tem o mesmo efeito psicológico de vender bugigangas por R$ 1,99 e não por R$ 2.
O anúncio da meta veio acompanhado de algumas medidas concretas, como a redução de R$ 10 no salário mínimo de 2018, e de um conjunto de bravatas que, pelo jeito, o mercado adorou. As principais são a extinção de 60 mil cargos, que por não estarem preenchidos tem impacto zero, e o teto de R$ 5 mil para o salário inicial de todas as carreiras de nível superior no Executivo. De todas? Inclusive das carreiras de Estado?
– Sim, de todas – respondeu o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, em entrevista ao programa Gaúcha Atualidade.
Mesmo quando questionado especificamente sobre carreiras que têm os concursos mais disputados, como o Itamaraty, a Receita Federal, o Banco Central e a Advocacia-Geral da União, o ministro manteve o tom enfático:
– Todos. Não se pode começar com salários tão próximos do topo. Alguém que começa com R$ 15 mil, em poucos anos estará no teto.
Corta para a vida real: para estabelecer que ninguém entrará em cargo federal do Executivo ganhando mais do que R$ 5 mil não basta o presidente Michel Temer, em um surto comunista, enviar para o Congresso uma medida provisória ou um projeto de lei estabelecendo que será esse o salário máximo de ingresso para servidores de nível superior. O caminho é bem mais tortuoso: seria preciso redesenhar todos os planos de carreira em que a remuneração inicial é superior a R$ 5 mil e colocar os atuais servidores em um quadro em extinção. Muda o primeiro nível, automaticamente será preciso alterar os subsequentes.
Ainda que o presidente conseguisse aprovar a mudança no Congresso, o que é politicamente impossível, é de se perguntar: que tipo de candidato disputaria as vagas de delegado da Polícia Federal, advogado da União ou auditor do Banco Central com salário de R$ 5 mil? É evidente que não faltariam candidatos. mas qual seria o nível?
Para complicar a equação, existe a autonomia dos poderes. Legislativo e Judiciário (e na carona o Ministério Público), continuariam pagando mais. No próprio Executivo, haveria pessoas ganhando três vezes mais para executar a mesma função. Em outras palavras, uma confusão monumental.
Os sindicatos se mobilizaram, pipocam ameaças de greve por todo lado, mas nem os mais apaixonados defensores do governo levam a proposta a sério. Simplesmente, sabem que ela é inviável.