No pronunciamento de 17 minutos que fez para responder à denúncia do procurador Rodrigo Janot, por corrupção passiva, o presidente Michel Temer falou que tem poder sobre seu destino: os deputados federais, a quem caberá autorizar ou não a continuidade do processo. Partiu para o ataque a Janot, desafeto de todos os parlamentares acusados de envolvimento em esquemas de corrupção ou de caixa 2.
De improviso, o que é sempre um risco quando se trata de um assunto dessa gravidade, Temer começou dizendo que, por ser advogado, sua preocupação com a denúncia é mínima "sob o foco jurídico", mas existe o aspecto político e pessoal:
– Sofri um ataque injurioso e infamante à minha dignidade pessoal. Tenho uma vida muito limpa e fui atacado no momento em que estamos colocando o Brasil nos trilhos.
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Exaltado, Temer disse que "reinventaram o Código Penal e criaram a denúncia por ilação". Foi o gancho para insinuar que Janot poderia ter ficado com parte do dinheiro que o procurador Marcello Miller embolsou quando trocou o cargo de procurador da República, sonho de consumo de estudantes de Direito e jovens advogados, por uma banca especializada em negociar delações premiadas, que livrou os irmãos Joesley e Wesley Batista da cadeia (na verdade Miller atuou no acordo de leniência). Repetiu que não seria irresponsável de fazer acusação sem prova, mas em dois momentos afirmou que, no terreno das ilações, alguém poderia dizer que "parte desses milhões obtidos com uma delação premiada benevolente foi para o procurador Janot".
– Não farei ilações. Tenho a mais absoluta convicção de que não posso ser irresponsável – insistiu, depois de fazer a insinuação.
Na linha olho por olho, dente por dente, o presidente deixou claro quer estava usando a mesma moeda de Janot, que o denunciou por corrupção passiva tomando por base a mala com R$ 500 mil entregue por Ricardo Saud, da JBS, a Rodrigo Rocha Loures. Faltou dizer que Loures estava mandatado por ele para tratar das demandas da JBS e que o dinheiro foi pago depois que a empresa conseguiu um acordo com a Petrobras para comprar gás da Bolívia e economizar milhões de reais. Temer teve o cuidado de não comprar briga com Loures, o ex-assessor especial do Planalto que está preso desde que perdeu o foro privilegiado de deputado federal. Definiu como "prova ilícita" a gravação feita pelo "grampeador" Joesley, e, para surpresa de quem não estava assistindo para aplaudir o pronunciamento, insistiu na versão do perito Ricardo Molina de que a gravação tem cortes. A perícia oficial concluiu que o áudio não foi editado.
A parte cômica da declaração ficou mais para o final, quando, depois de classificar a denúncia de Janot como "um atentado contra o nosso país", disse:
– Tenho orgulho de ser presidente. Não sei como Deus me colocou aqui. Tenho honra pelos avanços que meu governo conseguiu.
O Deus que colocou Michel Temer na Presidência atende pelo nome de Eduardo Cunha, o condutor do impeachment.
O fim foi uma declaração de resistência:
– Não fugirei das batalhas nem das guerras que temos pela frente.
Os deputados aliados aplaudiram entusiasmados. Uma voz gritou "bravo, bravo". Era o deputado Darcísio Perondi, comandante da tropa de choque.
Aliás
No início da tarde desta terça-feira, horas antes do pronunciamento, ministros e aliados mais próximos do presidente começaram a ligar para os deputados exigindo presença no Planalto. Temer queria mostrar publicamente que tem força no Congresso.