Cabe qualquer coisa na definição de "motivos pessoais" apresentada pela executiva Maria Silvia Bastos Marques em seu pedido de demissão da presidência do BNDES. Tudo pode ser considerado "pessoal", inclusive o rosário de motivos políticos que explicam a primeira baixa no time de ouro da equipe econômica encabeçada pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Desvincular a imagem de um governo assentado em um lamaçal é motivo pessoal forte para uma executiva da estatura de Maria Silvia pedir para sair.
A presidente do BNDES não saiu atendendo a um apelo da família, desculpa usada por Sandro Mabel para deixar o cargo de assessor especial de Temer, que ocupava sem qualquer vínculo formal com o governo. Pediu demissão sem dar uma explicação minimamente convincente, divulgou uma mensagem lacônica aos funcionários do BNDES e deixou o governo ainda mais fragilizado, porque atingiu o único pilar que se mantinha intacto: o da equipe econômica.
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Era notório que empresários acostumados à liberalidade que reinou no BNDES nos últimos anos reclamavam das novas regras adotadas na gestão de Maria Silvia. Joesley Batista, um dos maiores vampiros do BNDES, era um dos interessados na cabeça da executiva.
Quem não acredita em Papai Noel também pode localizar um "motivo pessoal" em trecho da gravação de Joesley com o presidente Michel Temer. Quando o dono da JBS conta que pediu ao ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, para mexer no BNDES, e ouviu que o banco era vinculado ao Ministério do Planejamento, e a presidente, uma indicação do senador Romero Jucá (PMDB-RR). Temer não defendeu a executiva. Na gravação, ouve-se o presidente dizer "... ligou, acertou e tal".
Só depois da delação dos irmãos Batista é que Temer veio a público defender a gestão de Maria Silvia. Foi no sábado passado, no pronunciamento em que contestou o delator. "A presidente Maria Silvia moralizou o BNDES, colocou ordem na casa, e tem o meu respeito e meu respaldo para fazê-lo, assim como Pedro Parente fez na Petrobras", disse.
Consumada a demissão, Temer foi rápido na escolha do sucessor. Antes que a sexta-feira terminasse, anunciou o presidente do IBGE, Paulo Rabello de Castro, como novo comandante do banco de desenvolvimento. Antes, divulgou nota dizendo que Maria Silvia "presidiu o BNDES de forma honesta, competente e séria por pouco mais de um ano". E repetiu que ela "moralizou um setor estratégico para o país, despolitizando a relação com o setor empresarial e elegendo critérios profissionais e técnicos para a escolha de projetos a serem contemplados com financiamentos oriundos de recursos públicos. Deixará como legado um modelo a ser seguido em toda a máquina pública". Tarde demais.
Temer poderia ter evitado a baixa se dissesse tudo isso na conversa com Joesley. Não disse e, até onde se sabe, não reagiu quando o empresário pediu para trocar o comando da Receita Federal e do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).