Foi mal recebida entre juízes e promotores a sugestão feita no texto "Pelos filhos de Cristine", de quem recebe auxílio-moradia de R$ 4,5 mil por mês doar esse valor como contribuição para resolver os problemas da segurança. A Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris) e a Associação do Ministério Público do Rio Grande do Sul (AMPRS) consideram a ideia reducionista. A coluna não apresentou a sugestão como solução para os problemas da segurança pública, mas como uma contribuição dos outros poderes.
O parágrafo que incomodou a juízes e promotores dizia: "Senhores juízes, deputados, membros do Ministério Público. Pelos filhos de Cristine, unam-se para ver o que cada poder tem a oferecer para melhorar a segurança. Os senhores que recebem auxílio-moradia de R$ 4,5 mil e salário na faixa dos R$ 30 mil bem que poderiam abrir mão dessa benesse e doar o valor para um fundo destinado à construção de presídios. Os senhores sabem que a falência do sistema prisional está na origem da violência que transformou o Rio Grande do Sul num pedaço de Bagdá."
Leia a íntegra da coluna:
Confira a íntegra das manifestações das duas entidades:
NOTA DA ASSOCIAÇÃO DOS JUÍZES DO RIO GRANDE DO SUL (AJURIS):
"A respeito da coluna publicada na edição desta sexta-feira (26/8), no Jornal Zero Hora, cabe ressaltar:- O problema da segurança pública é por demais complexo e não se pode jogar com a desinformação. Atribuir a solução da crise ao recebimento de verbas devidas a servidores públicos, especificamente no caso aos magistrados, é induzir a sociedade ao erro de avaliação e reduzir a responsabilidade do Executivo, este, sim, constitucionalmente definido como executor de políticas de segurança. Diante da gravidade da crise, de um momento de consternação coletiva, não se pode admitir opiniões reducionistas;
- Importante destacar que o Poder Judiciário tem auxiliado o Executivo, tomando iniciativas no contingenciamento de recursos: em 2015, foram transferidos R$ 429 milhões, oriundos do orçamento do Poder Judiciário, que responde por apenas 6% de todo o orçamento do Estado. Também foram repassados a 87 entidades ligadas à segurança mais de R$ 10 milhões a título de penas alternativas de prestação pecuniária ou transação penal em todo o Estado. Este montante tem auxiliado na reforma e melhorias em casas prisionais, na compra de viaturas e na aquisição de câmaras de monitoramento;
- Os magistrados, assim como toda a sociedade exaustivamente vitimizada, estão consternados. A desconstrução do serviço público, além das deficiências de um sistema de gestão de segurança, com raízes no colapso do sistema prisional, também notadamente nas áreas de educação e saúde, exigem a exploração do caminho largo das sonegações de impostos e das isenções e incentivos fiscais concedidos pelo Executivo.
Gilberto Schäfer
Presidente AJURIS
NOTA DA ASSOCIAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO RIO GRANDE DO SUL
Diretoria executiva da AMP/RS rebate simplificação equivocada da situação da segurança pública
A Diretoria executiva da AMP/RS vem, por meio deste, rebater a interpretação simplista da colunista Rosane de Oliveira em sua coluna no jornal Zero Hora desta sexta-feira (26), ao analisar a situação da segurança pública no Rio Grande do Sul. Sugerir que a doação de parte da remuneração de membros do Ministério Público e de outras carreiras poderia ser solução para a falta de vagas nos presídios gaúchos é uma abordagem simplista, cujo efeito quase nada significaria no trato da questão.
Isso porque a ausência de vagas em alguns presídios e o não preenchimento das mesmas em outros não decorre da falta de recursos financeiros e sim da não utilização dos valores disponibilizados. Somente no Estado do Rio Grande do Sul, por diversos motivos, foram mais de R$ 20 milhões destinados e não utilizados em contratos firmados na última década.
Além disso, não falta dinheiro ao Fundo Penitenciário Nacional (Funpen), destinado a aplicar recursos na construção, reforma, ampliação e aprimoramento de estabelecimentos penais. Isso porque, entre outras verbas, 3% de todo o montante arrecadado pelos concursos de prognósticos, sorteios e loterias no âmbito do Governo Federal são direcionados justamente para esse fim.
A questão da segurança pública é muito mais complexa, sendo o reducionismo cometido uma desinformação à sociedade em um momento de grave crise da segurança pública que em nada contribui para a solução do problema. Ao contrário, coloca a comunidade contra determinadas carreiras, quando, no âmbito do Ministério Público, diversas ações civis foram tomadas, inclusive para que o Estado construa mais presídios. Numa delas, de 2007, abrangendo todos os estabelecimentos prisionais do âmbito da Vara das Execuções Penais da Capital, o Estado foi condenado em primeiro e segundo graus a implementar 3.387 vagas no regime fechado e 505 no semiaberto, além das vagas que viessem a faltar durante a tramitação da ação. Se tivesse sido cumprida a decisão do Judiciário, por certo seria outra a situação dos presídios gaúchos.Porto Alegre, 26 de agosto de 2016.
Diretoria Executiva Associação do Ministério Público do Rio Grande do Sul