Uma lição aprendi cobrindo catástrofes pelo mundo: tragédias não são comparáveis. Nem as pessoais nem as coletivas. Uma guerra, um acidente aéreo, um incêndio, cada desastre guarda características próprias e seu contexto particular.
Mas é olhando para episódios dramáticos anteriores que uma sociedade aprende como evitar a repetição - e, se não for possível eliminá-los, que ao menos se reduza o número de vítimas.
Não é por acaso que, a cada acidente aéreo, empresas e autoridades buscam esmiuçar cada detalhe - dados, rotas, condições meteorológicas, conversas na cabine, estatísticas, informações técnicas, registros do restos da fuselagem. Toda essa investigação, um trabalho que em geral leva anos, tem menos o objetivo de encontrar culpados e mais o de prevenir. Isso torna aviões um dos meios de transporte mais seguros do mundo.
E nós, aqui no Rio Grande do Sul, o que aprendemos com nossas tragédias?
Quais as lições tiramos do incêndio na creche Casinha da Emília, que matou 12 crianças em Uruguaiana, em 2000? O que ficou, além de feridas, sofrimento, ausência e um processo jurídico sem fim, da maior tragédia do Estado, a da boate Kiss, em 2013?
E do fogo no Mercado Público, no mesmo ano? E da sede da Secretaria da Segurança Pública, em 2021?
É mais fácil responder o que NÃO aprendemos: a falta de uma cultura de prevenção permanece entre nós.
Passadas apenas algumas horas da tragédia desta sexta-feira (26) em Porto Alegre, que vitimou 10 pessoas em uma pousada, parece repetir-se o roteiro de um filme conhecido: segundo os bombeiros, o prédio não teria alvará nem Plano de Prevenção Contra Incêndios (PPCI); a prefeitura diz que os documentos, na hora de assinar o contrato, estavam ok e... alguns sinais de empurra-empurra de responsabilidades já começam a aparecer.
Tenho certeza de que ninguém entra em uma casa noturna da mesma forma depois da Kiss. Mas o que ficou de aprendizado? Da legislação, eu sei: pouco ou quase nada.
Desde 2013, a lei gaúcha de proteção e prevenção contra incêndio também vem passando por uma série de flexibilizações. A chamada Lei Kiss nem de longe tem o mesmo rigor estabelecido no projeto. Em 2016, por exemplo, em uma série de alterações, criou-se uma modalidade de autolicenciamento para determinados tipos de empreendimentos. A mudança também retirou a exigência de assinatura de engenheiro ou arquiteto no encaminhamento dessa documentação aos bombeiros.
PPCIs, alvarás, papeladas não evitam completamente incêndios - ainda mais se a motivação for criminosa, como suspeita a Polícia Civil no caso da pousada. Mas uma lei rigorosa obriga os proprietários de imóveis a implementar medidas que facilitam a fuga na hora do horror, ajudam no combate ao fogo, impõem multas em casos de instalações elétricas precárias e deveriam ajudar a evitar o funcionamento de casas, eventualmente, sem condições de abrigar seres humanos - isso tudo salva vidas. De nada adianta, no entanto, se não houver fiscalização.