Vacinação deveria ser um ato não só de consciência individual, mas também coletiva. Afinal, só atingiremos a imunidade como humanidade diante do desafio da pandemia de covid-19 quando a maior parte da população mundial estiver imunizada.
Em alguns países, os governos incentivam suas populações a buscar os produtos, por meio de recompensas. No Estados Unidos, foram ofertados cerveja, cigarro de maconha, sorteio de carros, desconto no supermercado, ingressos para jogos de beisebol e até dinheiro em diferentes Estados.
Em outros, o método é por meio da coerção ou de restrições a quem não se vacinar. Na Rússia, que passa por uma nova onda de covid-19, a prefeitura de Moscou proibiu os não imunizados de entrar em bares e restaurantes. Para um país que produz uma vacina, a Sputnik V, a campanha de imunização está lenta.
Segundo o monitor da Universidade de Oxford, apenas 13,94% da população recebeu ao menos uma dose (10,72% completaram o ciclo vacinal, com as duas doses). O novo surto é atribuído à variante delta, que apareceu pela primeira vez na Índia.
Desestimular a vacinação, como o governo brasileiro faz por meio de atitudes do presidente Jair Bolsonaro e inépcia do Executivo, é condenável, um golpe na saúde individual dos cidadãos e da população como um todo, além de ser um tiro no pé pelo fator econômico.
Mas forçar a população a ser imunizada é um tema complexo e que divide autoridades e gestores de saúde.
Moscou e São Petersburgo, as duas maiores cidades russas, determinaram vacinação obrigatória para 60% dos trabalhadores de serviços - pessoal de transportes, comércio, restaurantes, espaços culturais, salões de beleza, saúde, educação e bancos,.
- Temos de fazer de tudo para implantar o mais rápido possível uma vacinação em massa e deter essa terrível doença e pôr fim à morte de milhares de pessoas - disse o prefeito de Moscou, Serguei Sobianin.
Na região de Tula, a imunização é compulsória a todos os grupos de risco.
Nas Filipinas, o protoditador Rodrigo Duterte ameaçou mandar para a prisão aqueles que se recusarem a receber vacinas contra a covid-19.
- Se você não quiser ser vacinado, mandarei prendê-lo, e depois injetarei a vacina em suas nádegas - disse Duterte, com seu habitual modo pouco sutil, em pronunciamento na TV na segunda-feira (21).
A vacinação ainda não é obrigatória nas Filipinas, mas o presidente já deixou claro que irá buscar mecanismos legais para forçar a população a receber os imunizantes. O país aplicou até agora 7,67 doses para cem habitantes (5,71% da população está imunizada com ao menos uma dose, e 1,97% com as duas).
A sobra de doses em países como os Estados Unidos reaqueceu o debate sobre vacinação obrigatória também em nações democráticas - qualificativo que não se pode aplicar a Filipinas e Rússia.
Recentemente, artigo no Journal of the American Medical Association (Jama) defendeu a imunização obrigatória como método que tem servido historicamente como ferramenta para alcançar e manter a proteção coletiva. Para quem não quiser se vacinar, especialistas do Instituto O'Neill de Direito Sanitário Nacional e Global, que assinam o paper, propõem a submissão a protocolos de segurança, como testes, monitoramento de sintomas, uso de máscaras e trabalho remoto. Para profissionais de saúde, pode-se exigir a vacina como condição para conseguir emprego.
A Espanha, um dos países mais atingidos pela covid-19 na primeira onda, decidiu em março que a vacinação seria obrigatória sob pena de multa. A Itália, outra nação que figurou no epicentro do drama europeu em 2020, decretou obrigatoriedade da imunização para profissionais de saúde. Já a China, onde surgiu a covid-19 no final de 2019, suspendeu o caráter mandatório, temendo reação pública contrária à imunização.
Nos Emirados Árabes Unidos, um dos países que mais vacinaram no mundo, desde 6 de junho, a imunização é obrigatória para quem deseja participar de eventos ao vivo - shows, jogos esportivos e atividades culturais.
Em abril, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos decidiu que a vacinação obrigatória não é ilegal e afirmou que a obrigatoriedade pode ser necessária em sociedades democráticas. A Corte, com sede em Estrasburgo, julgava uma ação movida por famílias da República Tcheca que eram contrárias à imunização de crianças. O tribunal considerou que a obrigatoriedade da vacinação não viola o artigo 8º da Convenção Europeia de Direitos Humanos, que estipula o direito ao respeito à vida privada.
Embora o tribunal não tenha tratado diretamente da vacinação contra o coronavírus, a decisão pode impactar a imunização contra a doença, especialmente entre aqueles que se recusam a tomar a vacina e são contrários a privilégios concedidos a imunizados, por considerarem essa medida supostamente discriminatória.