A menos de um ano das eleições presidenciais na França, a principal marca do pleito regional de domingo (20) é o retorno do protagonismo dos partidos tradicionais, de direita e de esquerda, à política, depois de anos de duelos entre a extrema-direita e o centro.
Em várias ocasiões da segunda década do século 20, o establishment político francês serviu apenas como força política para, por meio de alianças em prol de uma "frente republicana", barrar, a todo custo, a chegada de Marine Le Pen (Rassemblement National, Reagrupamento Nacional) ao Palácio do Eliseu.
Foi assim em 2017, nas últimas eleições presidenciais, quando figuras proeminentes da 5ª República, como os ex-primeiros-ministros François Fillon, Alain Juppé e Jean-Pierre Raffarin (conservadores) e o então presidente François Hollande, o premier Bernard Cazeneuve e o candidato derrotado Benoît Hamon (Partido Socialista) abriram o voto para o centrista Emmanuel Macron, à época um ex-banqueiro convertido às pressas em político para liderar o recém-formado partido La République en Marche! (A República em Marcha!). A presença da extrema-direita no segundo turno era vista como um risco para o país, para a unidade francesa e para seu lugar na Europa.
A eleição regional deste domingo (20), na qual os partidos de Le Pen e de Macron foram derrotados no primeiro turno, mostra que a saída, desta vez, pode ser a volta aos partidos tradicionais. Das 13 regiões em jogo no pleito, os candidatos da direita ficaram em primeiro lugar em seis, e os da esquerda, em cinco.
Na eleição presidencial de 2017, o alto número de votos brancos e nulos já sinalizavam a descrença dos eleitores na classe política, um processo que, obviamente, não é apenas francês. Quatro anos e uma pandemia depois, essa desilusão só se acirrou, como mostra a abstenção de mais de 66% no domingo, a mais alta desde pelo menos 1958. Segundo o Instituto Ipsos, 39% dos eleitores que não foram votar justificaram a decisão dizendo que nada mudaria em suas vidas. E 23% afirmaram que estavam insatisfeitos com os políticos. O voto facultativo acaba sendo um bom termômetro do interesse da população na política.
Com as ressalvas de que a alta abstenção pode turvar interpretações, é possível analisar que a França disse "não" a Macron. Mas também não quer Le Pen, uma candidata que tentou nos últimos anos capitalizar o descontentamento dos franceses com a política tradicional.
A porta está aberta para Xavier Bertrand e Valérie Pécresse, atuais presidentes de suas respectivas regiões (Hauts-de-France e Île-de-France) e potenciais adversários da dupla Macron e Le Pen em abril de 2022.