Há coerência na decisão de Donald Trump de proibir a entrada de brasileiros e outros estrangeiros que tenham passado pelo Brasil nos últimos 14 dias. A mesma medida foi tomada quando nações de outros continentes ocuparam o epicentro da pandemia, como países asiáticos e a Europa. Nem aliados carnais dos americanos, como o Reino Unido, foram poupados.
A América do Sul - e no subcontinente o Brasil - ocupa este lugar desde a semana passada, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Nas últimas semanas, Trump, que evita criticar o presidente Jair Bolsonaro publicamente, vinha dando mostras de preocupação com a situação no Brasil. "Eles foram para outro lado", "Eles estão tendo problemas", foram algumas das expressões do líder americano para evitar citar pontualmente a gestão da crise.
Mas chegou-se a um limite. E este limite da suposta amizade entre Trump e Bolsonaro é a saúde da própria população americana: "Não quero pessoas vindo aqui contaminando o nosso povo", afirmou o presidente americano da última vez em que falou sobre o tema.
Diplomatas brasileiros tentaram diversas vezes fazer com que a Casa Branca desistisse da medida. E é possível até pensar que, ao proibir a entrada de brasileiros - e não os voos -, o governo americano possa ter cedido aos apelos da embaixada brasileira em Washington comandada pelo gaúcho Nestor Forster Jr. Pode parecer a mesma coisa, mas não é. Hoje há 13 voos semanais em operação entre o Brasil e os Estados Unidos, com destino à Flórida e ao Texas. As empresas poderão continuar operando as rotas, mas os passageiros que se encaixarem na nova medida não poderão entrar em território americano. Quem pode: tripulantes das aeronaves, cidadãos americanos, brasileiros com residência fixa. Na prática, provavelmente, as companhias irão cancelar as rotas por falta de demanda. Mas, na letra fria do decreto e nas manchetes, o que Trump proibiu foi a entrada de brasileiros não os voos.
De olho na reeleição, em novembro, o presidente não teria como negar os apelos do governador da Flórida, o também republicano Ron De Santis. O Estado, onde ficam os parques da Disney na Costa Leste, é um dos principais destinos dos brasileiros. Mas é também chave na tentativa de reeleição em novembro. Hoje, a Flórida contabiliza 2.233 mortos e 50.127 infectados. Bem menos do que Nova York, devastada pelo coronavírus (16.149 mortos e 197.266 infectados). Nova York é um Estado em que os republicanos perdem sempre na corrida eleitoral. A Flórida, ao contrário, decide quem entra na Casa Branca.
Em nota, a embaixada dos Estados Unidos no Brasil afirmou: "O Brasil implementou restrições semelhantes à entrada de estrangeiros, inclusive dos EUA, em 30 de março, e as prorrogou por duas vezes desde então. As restrições que continuam em vigor são medidas de saúde pública para reduzir o potencial de transmissão do vírus".
A nota acrescenta: "Os EUA mantêm uma forte parceria com o Brasil e trabalhamos em estreita colaboração para mitigar os impactos socieconômicos e de saúde da covid-19 no Brasil, bem como para promover prioridades políticas, econômicas e de segurança no hemisfério e em todo o mundo" (leia a íntegra aqui).