Um dia antes de entrar em campo contra a Seleção Brasileira, o México faz história ao dar uma guinada à esquerda que tem impacto interno e externo. Saiba a razão.
1) A conquista de Andrés Manuel López Obrador é histórica porque, pela primeira vez, a esquerda chega ao poder no México. O país tem um histórico político conservador. Para se ter uma ideia, o Partido Revolucionário Institucional (PRI) elegeu todos os presidentes entre 1929 e 2000 – estamos falando de 70 anos. Em 2000, quando Vicente Fox derrotou o PRI, também ele fazendo história, chego ao poder o PAN, Partido da Ação Nacional, que, embora novidade na presidência, também é de direita.
2) Obrador também rompe com a hegemonia da direita e da centro-direita na América Latina , que tinha até então Nicolás Maduro, na Venezuela, Evo Morales, na Bolívia, e Daniel Ortega, na Nicarágua, como seus representantes. Após a primeira década do século 21 em que assistíamos a um alinhamento de governos de centro-esquerda, entre eles o Brasil, com Luiz Inácio Lula da Silva , o que se via, nos últimos pleitos, era o avanço de regimes conservadores, com Maurício Macri na Argentina, Sebastián Piñera no Chile e outros. O México tem o segundo Produto Interno Bruto (PIB) da América Latina, e é uma espécie de caixa de ressonância da política externa dos Estados Unidos para a região. É uma potência intermediária na América Central – ou seja, acaba irradiando influência política e cultural para seus vizinhos. Nesse sentido, a vitória da esquerda pode influenciar as políticas de outros países da área.
3) Como símbolo, sua vitória é muito importante. Mas Obrador é uma incógnita. Ele chegou ao poder após três tentativas – ou seja, sua resiliência é elogiável. Mas é também um político radical. Muitas vezes, é comparado a Hugo Chávez, pela postura de ruptura que aterroriza os mercados. Por outro lado, ele só conquistou a presidência neste domingo porque seguiu uma cartilha conhecida por aqui: um discurso "paz e amor" e um acordo informal com as elites – algo que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez em 2002. Obrador suavizou sua postura, mas não se sabe como irá realmente governar o país. Ele promete aumentar gastos sociais, implementar programas de assistência, cortar benefícios de funcionários públicos e aumentar os impostos dos mais ricos. Há risco de venezualização do México.
4) A esquerda chega ao poder no México em momento extremamente sensível para as relações com os Estados Unidos, seu principal parceiro econômico. Pela fronteira passam milhares de migrantes em direção ao Norte. Donald Trump, como se sabe, planeja construir seu polêmico muro ali. Há uma visão de que o atual presidente, Henrique Peña Nieto, foi subserviente demais aos interesses da Casa Branca. Durante a campanha mexicana, Trump não se manifestou sobre suas preferências. Obrador promete peitá-lo, mas ainda não explicou como. Sobre o Nafta (acordo de livre-comércio que inclui México, EUA e Canadá), Obrador não demonstra interesse – já disse, inclusive, que pode abandoná-lo. Trump também afirma que quer sair, o que não apenas colocaria fim ao acordo, mas posicionam americano e mexicano no mesmo nível.
5) A vitória de um presidente populista em momento quente para a economia, para muitos, é uma demonstração de que não são apenas os números frios que interferem em uma eleição. O México viveu nos últimos anos, desde 2012, um crescimento intenso do PIB, que é considerado um "milagre mexicano". Peña Nieto implementou uma política desenvolvimentista que elevou o PIB em 2% em 2017 (o Brasil cresceu 1%), e em 2,90% em 2106 (Brasil, -3,5%). No meio do mandato, perdeu a maioria no parlamento por conta do rompimento de uma aliança. Assim, não conseguiu aprovar as medidas importantes. O índice de pobreza da população não baixou (43% estão nesta faixa no país) e o trabalho informal também não arrefeceu. A violência explodiu: 20,5 homicídios a cada 100 mil habitantes (no Brasil são 30,3 por 100 mil) , com forte influência dos cartéis do Golfo e de Tijuana.