Com discurso apelando para a emoção e o patriotismo, Donald Trump surfou na onda da economia americana que bate recordes nesse início de 2018. Falou para o público interno, seus eleitores, em geral, o americano branco, interiorano e cristão. Não à toa o presidente usou cerca de 80% do tempo do discurso sobre o Estado da União, no início da madrugada desta quarta-feira (31) pelo horário de Brasília, para vangloriar-se dos índices da economia: desemprego baixo, Bolsa de Valores em alta. E deixou assuntos polêmicos para o final – citando muito rapidamente o reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel e nações "rivais", como China e Rússia.
Em uma hora e 20 minutos de pronunciamento perante as duas Casas do Congresso, Trump tentou humanizar sua imagem, ao trazer para o plenário do Capitólio convidados para "ilustrar" sua fala, como militares que lutaram contra o Estado Islâmico, desertores norte-coreanos e pais que perderam seus filhos mortos por gangues mexicanas.
O presidente-bilionário foi mais aplaudido do que em seu primeiro discurso sobre o Estado da União, em fevereiro do ano passado. Naquele, muitos democratas, ainda atordoados pela derrota da eleição, sequer se levantavam para aplaudir – um gesto que é muito mais uma reverência ao cargo de presidente do que à pessoa que está no púlpito.
Teve o Trump de sempre, aplaudindo a si próprio em alguns momentos. E teve o Trump conciliador: para levantar governistas e oposição recorreu aos convidados de fora. Alguns dos momentos em que tanto democratas quanto republicanos se uniram em palmas ocorreram quando o presidente citava os convidados que ilustravam suas falas.
Houve um momento de vaia quando ele detalhou seu plano para a imigração, composto por quatro pilares: caminho aberto para a cidadania de 1,8 milhões dreamers (um afago aos democratas para evitar a paralisia do governo, no próximo dia 8 de fevereiro), segurança na fronteira (o famoso muro com o México, sua obsessão), fim da "loteria dos vistos" e da imigração baseada em laços familiares.
No meio do discurso, a Casa Branca liberou um comunicado no qual anunciava a manutenção da prisão de Guantánamo, na ilha de Cuba. A notícia já circulava quando Trump informou que havia assinado a ordem executiva para aumentar o número de prisioneiros suspeitos de terrorismo – hoje são pouco mais de 40. Vale lembrar que fechar Guantánamo era uma promessa de campanha de Barack Obama, em 2008. Não cumpriu, embora o número de internos tenha caído bastante.
Houve meias verdades no discurso: "Acabamos com o desastrado Obamacare", disse Trump. Não é bem assim. Embora tenha tentado, o republicano não conseguiu extinguir o programa de acesso universal à saúde implementado por Obama.
No geral, Trump foi mais moderado do que de costume – seguiu o roteiro milimetricamente pensado nos últimos dias por sua equipe, evitou o improviso e não foi tão belicista quanto de costume, exceto quando falou em reforçar o arsenal nuclear americano.
O presidente tentou unir os dois partidos no Congresso – quando apelou para o plano de US$ 1,5 trilhão para a renovação da infraestrutura do país, prometendo pontes, estradas e tudo mais. E voltou ao nacionalismo ("Não há tempo melhor para viver o sonho americano"), chegando a citar fé e família como "o centro da vida americana".