O frisson em torno de uma possível candidatura à presidência da atriz e apresentadora Oprah Winfrey nos Estados Unidos reflete várias questões da política americana atual. A principal delas é o hiato em que os democratas estão imersos desde a desconcertante derrota de Hillary Clinton, em 2016. O partido, que governou a Casa Branca por oito anos com Barack Obama, não se recuperou do baque, aposta tudo na eleição legislativa de meio de mandato deste ano e está desesperado por um nome forte para ressurgir das cinzas em 2020.
Antes de Oprah, especulava-se sobre a candidatura da ex-primeira-dama Michelle Obama. O que nos leva a pensar que Hillary teria desistido de vez de se candidatar novamente em 2020.
Em novembro de 2016, enquanto percorria Estados como Ohio, Carolina do Norte, Virgínia e Pensilvânia para entender a América profunda pré-eleição, uma das perguntas que eu costumava fazer aos interioranos, normalmente mais conservadores (como acabou se comprovando, ao votarem maciçamente em Trump), era se os EUA estavam prontos para eleger uma presidente mulher.
A resposta variava do machismo exacerbado, passando por quem via Hillary como uma figura construída à sombra do marido, Bill, até o extremo de quem acreditava ser a democrata a salvadora da pátria. No fundo, o que eu sentia era que a América, ainda tão conservadora, não elegeria uma mulher. Não daquela vez.
Desde que se tornou independente, em 1776, os EUA foram governados por 45 presidentes homens, permanecendo à margem do crescente grupo de nações lideradas por mulheres, como Brasil (Dilma Rousseff), Argentina (Cristina Kirchner), Chile (Michele Bachelet), Alemanha (Angela Merkel), Reino Unido (Theresa May), Índia (Pratibha Patil) e Libéria (Ellen Johnson).
Segundo as novas regras da política americana, em que o show business invadiu Washington, os democratas estão em busca de sua celebridade para derrotar outra celebridade. Oprah não tem a experiência política de Hillary, senadora e ex-secretária de Estado, mas, para muitos, é mais gestora do que Trump, por exemplo. Além de um fenômeno de popularidade. Prova disso é que, em 2008, seu apoio reverteu para Obama milhões de votos que o levaram a derrotar Hillary nas prévias do Partido Democrata.
Os rumores sobre a candidatura Oprah começaram depois que a rede CNN conversou em off com duas amigas da apresentadora. O discurso no Globo de Ouro, no domingo, contra a xenofobia e o machismo foi tão forte que logo começaram a surgir as hashtags #OprahParaPresidente e #Oprah2020 nas redes sociais. No dia seguinte, os jornais americanos estavam recheados de análises sobre seu potencial eleitoral. E até Trump entrou no debate.
– Sim, eu ganharia de Oprah – disse, antes de um encontro com congressistas na Casa Branca.
O que, no fundo, revela também as intenções do bilionário. Com ou sem Oprah no páreo, Trump está pensando ficar no poder por mais de um mandato.