O governo do Iraque não está disposto a pagar para ver no que pode dar o referendo realizado no Curdistão, em 25 de setembro, no qual a maioria da população (93% dos eleitores) votou pela independência. Ao arrancar a rica província de Kirkuk das mãos dos curdos, a maior etnia sem pátria do mundo, o governo central, de Bagdá, dá um recado aos separatistas, com capital na modernosa Erbil: o Curdistão não vai virar uma Catalunha.
Em uma ofensiva fulminante, de menos de 24 horas, as tropas iraquianas consolidaram o controle da sede do governo de Kirkuk, sem confrontos.
Após o fracasso do diálogo entre Bagdá e Erbil e o fim de um ultimato lançado pelo poder central após a realização do referendo, o exército vinha retomando desde domingo várias zonas e infraestruturas. Sob controle curdo desde 2014, Kirkuk é estratégica: seu subsolo é encharcado de petróleo. São seis campos petrolíferos, uma base mlitar e um aeroporto. Hasteando a bandeira iraquiana em frente à sede do governo local, de onde o símbolo curdo foi retirado, Bagdá quis marcar território. Por tabela, agradou à Turquia, já que a ação retumba do outro lado da fronteira, onde os curdos também buscam um Estado.
Com exceção de algumas trocas de tiros, o avanço do exército foi facilitado pela retirada dos peshmergas da União Patriótica do Curdistão (UPK) das posições que controlavam no sul de Kirkuk. O UPK é rival do Partido Democrata do Curdistão (PDK), do presidente curdo Massud Barzani, responsável pela organização do referendo de independência.
Foi também uma batalha simbólica. Na base militar K1, a mais importante da província, forças iraquianas tentaram riscar dos livros de história a humilhação sofrida em junho de 2014, quando os peshmergas tomaram o local e forçaram os soldados inimigos a retirar seus uniformes.
Os curdos iraquianos nunca tinham estado tão próximos de seu país quanto nos últimos meses. Haviam ocupado Kirkuk, aproveitando-se do caos após a ascensão do grupo Estado Islâmico (EI). Com seu exército, corajoso, integrado por muitas mulheres, enxotaram os terroristas de seu território. Enquanto Bagdá estava cercada e ainda hoje é palco quase diário de atentados, Erbil, a capital do Curdistão, é um oásis de tranquilidade. Com os dias contados, se depender do governo iraquiano. Como no caso do separatismo da Catalunha, não há diálogo. Nas no Oriente Médio, é pior. Vale a lei do canhão.