Nos mais de 30 minutos de seu primeiro pronunciamento na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Donald Trump exaltou o patriotismo e a soberania das nações em detrimento do multilateralismo a que a comunidade internacional vem pregando desde a sua criação, a partir das ruína da Liga das Nações. O presidente americano não desceu do palanque. Mas, pelo menos, deixou mais claras algumas posições que, aos oito meses de governo, não havia expressado – até por sua aversão a entrevistas.
Pode-se analisar sua fala, mais longa do que o esperado pelo que disse e pelo que deixou de dizer. Por exemplo: ironicamente, o presidente começou seu pronunciamento referindo-se aos americanos que sofrem com os efeitos dos furacões que atingiram recentemente os EUA. Tudo ótimo, não fosse a omissão do tema que provoca constrangimento a seu governo: a retirada do Acordo de Paris. Trump omitiu qualquer menção a aquecimento global ou mudanças climáticas.
Alterou rapidamente o foco de seu discurso para enaltecer a recuperação da economia e os investimentos das forças armadas.
— Logo, nossas forças armadas serão mais fortes do que nunca — afirmou.
Outra o assunto nas entrelinhas. O líder americano disse que o mundo precisa rejeitar ameaças à soberania "da Ucrânia até o Mar do Sul da china". Tratava-se de um recado à Rússia, que ocupou a Crimeia, e à Coreia do Norte.
Agora, o que realmente disse. Aos 18 minutos, Trump tocou pela primeira vez no tema da Coreia do Norte. Duas frases marcaram forte a posição da Casa Branca. Uma delas em tom ameaçador:
– Se for para nos defender e defender nossos aliados, nós não teremos escolha a não ser destruir Coreia do Norte.
A outra, em tom de deboche ao ditador Kim Jong-un, o "rocket man":
– Rocket man está em uma missão suicida para ele e para o regime dele.
Depois, mirou Irã e Síria, formando, com Coreia do Norte, uma tríade de alvos que lembrou o eixo do mal cunhado por George W. Bush, em 2001.
– O regime iraniano acabou transformando um país com rica cultura em país que exporta violência, sangue e caos – destacou.
Como já era esperado, houve críticas ao acordo que o governo de seu antecessor, Barack Obama, fechou com o país dos aiatolás.
– O acordo com Irã é uma vergonha para os EUA – disse.
E as críticas à Síria foram mais duras do que o habitual na diplomacia americana:
– Bashar al-Assad e sua ditadura. Ameaça a paz em todo o Oriente Médio. Nã podemos manter um regime assassino.
Ao citar a América Latina (raridade em discursos recentes de mandatários americanos), apareceu um dueto do "mal": os governos de Venezuela e Cuba. Sobraram ataques ao socialismo, que chamou de "ideologia desacreditada".
O mesmo Trump, que até o ano passado desdenhava da ONU, rasgou-se em elogios à instiuição, mas sempre fazendo referências ao EUA e aos americanos. Ou seja, mesmo quando falou dos outros, ele falou da América. Usou o Plano Marshal de reconstrução da Europa após a II Guerra Mundial para ressaltar, mais uma vez, a "prosperidade e soberania", expressão que repetiu pelo menos três vezes.