Em abril de 2009, a administração Barack Obama fez upload de 293 fotos em uma conta no Flickr. Embora desde o governo John Kennedy fotógrafos profissionais integrassem o staff de funcionários oficiais da Casa Branca, fazendo uma cobertura dos sucessivos mandatos, aquela era a primeira vez em que teríamos acesso tão próximo aos bastidores do poder americano. Pete Souza, o fotógrafo dos dois mandatos de Obama, que já havia trabalhado na gestão Ronald Reagan, tratava de humanizar o presidente, capturando registros de um dos tempos mais informais da Casa Branca. Aos 62 anos, nascido em New Bedford, Massachusetts, Souza tinha acesso irrestrito a reuniões de trabalho e à família Obama, tirando proveito do estilo midiático, próximo e carismático do presidente. Suas fotos eram descarregadas diariamente de forma sistemática em redes sociais como Instagram e o próprio Flick.
Lembrei dessa estratégia de comunicação da equipe de Obama quando recebi na quinta-feira um email do editor de Imagem de ZH, Jefferson Botega, com um título: “11 fotos que mostram como a administração Trump está falhando na fotografia”. O texto da Columbia Journalism Review, revista eletrônica da Universidade de Jornalismo de Columbia, em Nova York, analisa algumas imagens desses cem dias de novo governo americano. São imagens que, certamente, você, eu e meu sobrinho de seis anos fariam melhor com um smartphone nas mãos.
A nova fotógrafa da Casa Branca chama-se Shealah Craighead. Distantes, seus retratos mostram o presidente sempre no centro das atenções, paparicado por platéias posadas demais, com estetica de álbum de família dos anos 1940. Por certo, não é culpa da profissional, experiente em coberturas políticas, tendo atuado no governo George W. Bush, quando cobria a primeira-dama Laura, e na campanha da ex-governadora do Alasca Sarah Palin, na campanha de 2008. A equipe de Trump parece blindar a família, evitando que Shealah tenha acesso à intimidade da Casa Branca em uma tentativa de controlar exaustivamente o que sai da Casa Branca para o mundo. Uma das exceções foi uma imagem de 29 de janeiro, em que Ivanka Trump aparece com Theodore, neto de Trump, falando ao celular em um dos corredores. Também falta cuidado da equipe de assessores com a direção das cenas. O auge dessa desorientação estratégica foi quando, durante um encontro com reitores de universidades, uma assessora Kellyanne Conway apareceu no canto da imagem conferindo o smartphone com as pernas sobre o sofá no Salão Oval.
Sabe-se que, no começo, a equipe Trump operava com poucos fotógrafos profissionais e funcionários de edição. Assessores de alto escalão, como o secretário de imprensa, chegaram a fazer as vezes de fotógrafos. Não parece haver muito critério em termos de quais imagens são postadas nas redes sociais do governo. O Flickr da Casa Branca, aquele inaugurado em 2009, foi abandonado. No local foi aberta uma conta que, ontem, apresentava apenas 36 fotos, desatualizada desde a Páscoa.
Pete Souza, mesmo fora do governo, já percebeu. Em seu perfil no Instagram, tem mostrando imagens captadas nos primeiros cem dias de Obama no poder: informais, próximas e, em geral, com muita ação. Na guerra da imagem, a estética do governo Trump está perdendo.