Moisés Mendes, colega aqui da Redação que tem como eu a mania de juntar palavras e construir frases, é geminiano.
Fez aniversário na semana passada e entoou-se um cântico amigo de parabéns por toda a Redação.
Nós, geminianos, juninos, somos seres especiais.
Gêmeos é o signo da inteligência e da dupla personalidade.
Por isso é que existem dentro de mim um demônio que ruge e um deus que chora: Paulo e Pablo. Paulo é cerebrino.
Pablo é coronariano.
Paulo é direto e exato.
Pablo é subjetivo e maleável.
Paulo é sério, circunspecto.
Pablo é sorridente, cordial.
Paulo é fiel, porque não ama.
Pablo trai, exatamente porque ninguém é mais capaz do que ele de amar tão loucamente.
Paulo é intrépido, Pablo é tímido.
Paulo é taxativo.
Pablo é tergiversante.
Paulo é neuronial.
Pablo é sanguíneo.
Paulo se casou.
Pablo se amanceba.
Porque Paulo é definitivo.
E Pablo é sazonal.
O que vem de Paulo é invariavelmente esperado.
Pablo é sempre desconcertante.
Paulo teve filhos.
Pablo só foi capaz de ter sobrinhos.
Paulo paga as contas em dia.
Pablo é o maior de todos os inadimplentes.
Paulo teve esposas.
Pablo passou a vida colecionando namoradas (hoje é o dia delas, parabéns, queridas!).
Paulo é rigoroso com sua escrita.
Pablo só cuida de fazer versos.
Paulo é otimista, porque sabe onde pisa.
Pablo é pessimista, exatamente porque conhece a si próprio.
Paulo nutre inveja.
Pablo só sente ciúme.
Paulo acredita só no que faz.
Pablo prosseguirá sempre só acreditando nos outros.
Paulo pratica as ciências exatas.
Pablo, as sociais e os devaneios filosóficos.
Paulo é escritor.
Pablo é orador.
Paulo elabora relatórios.
Pablo rabisca sonetos.
Paulo trata as mulheres com respeito.
Pablo, com ternura.
Paulo trata os homens com distância e gravidade.
Pablo celebra com os homens alegre camaradagem.
Paulo confia desconfiando.
Pablo se entrega totalmente.
E Paulo é inalterável, enquanto não há ninguém mais volúvel do que Pablo. Esta é a sina dos geminianos.
Ser dois em um.
Ser na vida ângulo obtuso e ângulo reto.
Ser noite e dia.
Ser luz de sol e clarão de lua.
Mas também ser raio sobre sombras e relâmpago que fere as trevas.
Ser geminiano é ser capaz de desferir bofetadas e brandir beijos.
É tornar a sua vida repleta de encontros e despedidas.
Assim como de cegueiras e descobertas.
Sou geminiano, então sou capaz de sofrer os maiores e mais atrozes infortúnios.
Mas também sou candidato natural e favorito às mais especiais e supremas venturas.
Ser geminiano é viver equilibrando-se (ou desequilibrando-se) nos extremos.
Sou geminiano, ninguém como eu corteja diuturnamente a morte.
Mas também ninguém como eu saboreia mais e valoriza tanto e tão devotadamente a vida.
Crônica publicada em 12/06/2001