Dois deputados e uma secretária municipal foram apoiar, na manhã desta segunda-feira (5), o protesto de pais que exigia, em frente ao Rosário, o fim de uma suposta doutrinação ideológica no colégio.
Quinze dias antes, dois estudantes haviam se engalfinhado e rolado aos socos pelo chão da aula – a dupla teria discordado sobre o conteúdo que o professor de Sociologia apresentava. Ambos foram expulsos do colégio. O professor acabou demitido. Mas os manifestantes, incluindo os deputados e a secretária, ainda insistem que a culpa pela briga foi da doutrinação.
Não foi. A culpa pela briga foi da insanidade que eles próprios vêm incentivando – no caso dos três políticos, vão me perdoar, vocês reproduzem o mesmíssimo divisionismo que o PT praticava. E foi essa beligerância, essa intolerância no convívio entre visões divergentes, que levou aqueles meninos a se esbofetearem em frente ao professor.
Aliás, não havia nada de errado no vídeo que o professor apresentava quando os ânimos se acirraram: era uma entrevista com o sociólogo Sergio Adorno sobre as motivações (veja que irônico) da violência urbana no Brasil. Claro, pode-se discordar de cabo a rabo do que diz Adorno – e é justamente esse senso crítico que se espera de um bom aluno. Mas, definitivamente, não é senso crítico o que os pais querem.
O que eles querem é que o aluno, na escola, só tenha contato com o que a família concorda. Ora, justamente por ser contra qualquer tipo de doutrinação, proselitismo ou lavagem cerebral, a mim agrada que os professores ofereçam conteúdos diferentes dos que os pais já transmitem – e tentam impor – às crianças. Senão, para que serve o colégio?
O aluno ideal, como já escreveu Contardo Calligaris, é o que contesta os pais com o que aprendeu no colégio e contesta o colégio com o que aprendeu com os pais. Se a escola e a família são os grandes instrumentos de formação – e deformação – dos jovens, não pode ser saudável que as duas "concordem" o tempo todo. Pelo contrário: é a divergência entre elas que cria o espaço de conflito necessário para o aluno encontrar sua própria autonomia.
Até porque, no fim das contas, como os jovens poderão discordar de alguma coisa – seja no marxismo, seja na Bíblia – se mal sabem do que se trata? Impedir alguém de entrar em contato com tudo o que me desagrada, como se fosse eu o padroeiro da verdade, o guardião da certeza ou o mensageiro da luz, não é só defender a mediocridade. É, agora sim, praticar doutrinação.