José Fortunati, quando encerrar seu mandato, quer lecionar gestão pública. Sua meta é ser professor de pós-graduação em alguma universidade que ofereça um curso, vou repetir, de gestão pública.
O prefeito disse isso a Zero Hora, que publicou seus planos profissionais na segunda-feira passada – mesmo dia em que uma reportagem de Adriana Irion revelou o incrível caso dos bueiros de Porto Alegre. Não sei se você viu, a matéria é uma bela amostra de como nossos gestores andam mal de matemática. Em uma pequena rua chamada Porto Rico, por exemplo, só existem três bueiros, mas a empresa responsável por limpá-los recebeu da prefeitura o pagamento pela limpeza de 229. Quer dizer, erraram por 226 bueiros.
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Na Rua do Parque, onde há 42 bueiros, a mesma empresa foi paga por limpar 471, um número que, se estivesse correto, provavelmente já teria alçado a Rua do Parque ao Guinness Book como o logradouro mais embueirado da face da Terra. Infelizmente, não fomos brindados com tal orgulho – era só mais um erro de cálculo, como dezenas que a reportagem expôs.
A matéria de Adriana ainda mostrou outra pérola da gestão pública. A prefeitura obteve R$ 7,6 milhões do governo federal e desembolsou mais R$ 1,5 milhão – totalizando, portanto, R$ 9,1 milhões – para construir uma casa de bombas que deveria ter sido inaugurada em 2011 mas que não funciona até hoje porque houve erros banais de engenharia, como, por exemplo, a construção de estruturas de cabeça para baixo.
Bem. Não acho que tudo isso inviabilize o projeto de Fortunati como professor, pelo contrário: todos sabemos o quanto é pedagógico aprender com os erros. Aliás, aí está um belo nome para uma cadeira de gestão pública a ser ministrada pelo professor Fortunati: Aprendendo com os Erros. Porque, além do caso dos bueiros e da casa de bombas, seu currículo tem muita consistência. Vejamos:
1) Fortunati se elegeu prometendo uma "transformação" em Porto Alegre com as obras da Copa. Só que apenas três dos 14 projetos ficaram prontos para o Mundial. Hoje, cinco estão concluídos – e a cidade, de fato, se transformou. Em um eterno canteiro de obras.
2) O prefeito anunciou em 2011 a revitalização da orla do Guaíba na região do Gasômetro, com previsão de entrega para 2012. Após uma sucessão de trapalhadas no edital de licitação, já se passaram quatro anos e, como diria a minha avó, quedele?
3) Parte do Mercado Público foi destruída por um incêndio, em 2013, e a prefeitura garantiu a restauração ainda para aquele ano. Símbolo da cidade, o Mercado segue até hoje com setores interditados.
4) Quando a Avenida Grécia estava praticamente pronta – ela deveria se estender até a Avenida do Forte, desafogando o trânsito na Assis Brasil –, descobriu-se uma fábrica de armamentos no meio do caminho. Três anos depois, a Avenida Grécia ainda desemboca em um muro.
5) O sistema BRT, com ônibus para 166 passageiros, corredores exclusivos e estações de embarque climatizadas, foi anunciado para 2014. Mas os novos corredores, que haviam substituído os de asfalto para aumentar a durabilidade, tiveram de ser desmanchados e refeitos em várias avenidas, devido à falta de qualidade.
6) Os relógios digitais que informavam hora e temperatura deixaram de funcionar há um ano. Sem encaminhar um novo contrato antes que o antigo terminasse, a prefeitura lançou dois editais de licitação que fracassaram. Suspendeu o último, no mês passado, para revisar critérios técnicos.
Ainda seria possível citar o abandonado Largo dos Açorianos, as duas semanas em que Porto Alegre ficou sem ônibus, o aumento da população de rua e, claro, sempre haverá argumentos para sustentar que a culpa não foi de Fortunati. Mas gestão, você sabe, é o ato de gerenciar negócios, pessoas ou recursos com o objetivo de atingir metas predefinidas.
Torço para que o prefeito consiga atingir pelo menos esta meta predefinida: ser um bom professor.