Capão da Canoa é a praia das minhas mais felizes lembranças infantojuvenis, uma madeleine proustiana feita de areia e mar, com sabor de pastel de queijo, abacaxi doce e puxa-puxa de leite e amendoim, algo que não é sentimento exclusivo deste que vos escreve. Sou uma Velhinha de Taubaté do litoral norte gaúcho. Quando amigos se bandeavam para Bombinhas, nos anos 1980, eu teimava que nada se compara a ter casa na praia a apenas 130 quilômetros de Porto Alegre, ainda mais num lugar com tantos apelos afetivos. Quando vingou a febre dos condomínios afastados, eu, com todo o respeito aos que fizeram essa opção para ver os filhos livres em suas bicicletas, insistia: se quisesse isso, iria para um sítio aqui em Eldorado. Curto demais o apê de frente para o mar, atravessar a rua em um minuto para ir à praia, acordar e dormir olhando o oceano infinito, comprar o pãozinho fresco na padaria da infância e outros prazeres que remontam a dias remotos e saborosos como o primeiro beijo.
Feita a necessária introdução a título de ressalva, sinto-me com autoridade moral para dar uma dica à prefeitura de Capão: abram o olho. O Carnaval de rua a volume máximo até as 3h, como se fôssemos todos carnavalescos (ah, muitos Carnavais na SACC estão eternizados em minha memória afetiva, o que só aumenta a autoridade da minha crítica), fez até a Velhinha de Taubaté aproveitar o que pôde o mar cálido e transparente do maravilhoso fíndi momesco e, antes do previsto, pegar o carro rumo à freeway. Penso no sofrimento imposto a bebês, idosos e todos os que odeiam aquela música desafinada e estridente até quase o amanhecer, e, sim, dou uma dica quente à prefeitura da minha querida praia: assim, vocês vão perder até as Velhinhas de Taubaté.
Veranistas não votam para prefeito e vereador na praia, mas movimentam a economia da cidade e enfrentam o IPTU local como se moradores fossem. Não desprezem a nossa importância.
PS: aproveito a citação da freeway no Carnaval para a sempre necessária reflexão. Carros são veículos automotivos destinados a conduzir pessoas. É triste ver o uso que se dá a esse bem utilitário, desvirtuando sua finalidade. As mortes em acidentes deveriam ser, ora, acidentais. É insano termos nos acostumado a contabilizar vítimas. Isso simplesmente não devia existir.
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