Cinco e vinte da tarde em Los Angeles e o segundo pôr do sol mais lindo do mundo está por acontecer. Nos próximos minutos, tanto o rigoroso azul do céu quanto o branco gelado no pico das montanhas se renderão aos caprichos do sol em tons de rosa.
Na tela do meu computador, brilham sem tantas cores duras notícias do Brasil. Em um vídeo postado há pouco por um amigo carioca, homens empunhando metralhadoras dançam num baile funk qualquer, em outro post, médicos alertam sobre os avanços da febre amarela, em outro, afirmam ainda que 40% da população da periferia do Rio irá contrair o vírus da chikungunya durante o verão.
Desde nossa pequena república mais ao sul, com teimosas exceções, as notícias tampouco são muito animadoras enquanto, por aqui, tio Sam está atônito com as barbaridades praticadas pelo novo commander-in-chief. Os americanos estão divididos como poucas vezes na história. A verdade é que, consciente ou inconscientemente, Trump se fortalece ao polemizar. Resultado: muita briga, intolerância, discriminação ironia e acima de tudo medo. Além de uma dose cavalar de paranoia.
No ultimo domingo marchei com outras 499.999 mulheres em downtown L.A. No mesmo dia mais de 3 milhões de pessoas foram às ruas em outras cidades aqui e no mundo. Confesso que sou avessa a movimentos que segmentam, principalmente minorias. Tenho sempre uma sensação de gueto, de marginalização e talvez por isso rejeite rótulos e classificações, mas em alguns casos agrupar é a melhor maneira de se fazer ouvir. Porém é fato também que quando vc divide, incita ainda mais divisão. Havia na marcha de domingo algumas tensões declaradas entre mulheres brancas, mulheres negras, mulheres hispanas, mulheres muçulmanas… Apesar de estarem todas vestidas com os mesmos gorrinhos pink.
E enquanto de camarote testemunho o surgimento de um neo-obscurantismo, surge como uma miragem ou flor de lótus um filme musical capaz levar as pessoas de volta às salas de cinema e, entre suspiros, arrancar também 14 indicações para o Oscar.
La La Land em uma leitura superficial pode parecer alienado, mas talvez mereça uma segunda análise.
Valeria nem que fosse pelo plano sequência inicial ou pelas coreografias entre câmera e atores sem cortes ou efeitos digitais.
Valeria pela homenagem a uma época de ouro da indústria cinematográfica, tempos de otimismo e esperança, ou ainda pela forma teatral de como usa a luz para passagens entre realidade e sonho.
Mas La La Land vale mesmo por sua analgésica leveza e, principalmente, por desconstruir nosso ingênuo desejo de história perfeita ao propor uma nova forma de "final feliz":
OK. Não era exatamente isso, mas no momento… também serve.
Afinal, quantas vezes é preciso abandonar um sonho para construir outro?
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