A simplicidade, muitas vezes, é amiga da lucidez. No básico, achamos a essência. Dois exemplos para chegar aonde quero: 1) Sou gremistaço, e meu humor é fortemente influenciado pelas notícias envolvendo o meu time. Até por isso, não sou afeito a tocar flauta. Por quê? Porque tenho muitos amigos colorados, e me incomoda saber que pessoas de quem gosto sofrem como eu sofro nos meus infortúnios. Logo, não vou além de um tratorzinho inocente e sem maiores ranços. Jamais tripudio o genuíno sofrimento alheio ou diminuo glórias merecidas, principalmente quando nada tenho a ver com elas. 2) Me intrigam as brigas políticas. Não entendo as pessoas se digladiando por algo que é apenas questão de dosagem. Claro, refiro-me a gente de boa índole, não aos mal-intencionados. Há aqueles que creem no Estado mínimo, na vida tomando seu rumo ao sabor das individualidades e do objetivismo de Ayn Rand. Há, também, aqueles que veem a ganância como intrínseca ao homem, o que torna o Estado um ente essencial para regular as relações humanas e estabelecer justiça social, redistribuindo oportunidades. Pode haver gradações, para um ou outro lado. Não necessariamente esses conceitos andam de forma paralela. Conforme o contexto histórico, podem até se cruzar. As duas convicções são respeitáveis, quando tratadas com honestidade intelectual e boas intenções. E, confesso, perfilo-me mais no segundo grupo.
Dito isso, vamos lá. Falemos de Venezuela. Retornei daquele belo país caribenho após uma semana de imersão no inferno das filas intermináveis para comprar um quilo de açúcar ou farinha. Estive nos hospitais onde doenças graves não são tratadas em razão do desabastecimento quase completo. Falta tudo naquela nação cercada pelas montanhas verdejantes e pelo mar azul. As pessoas estão sofrendo. Pais e mães veem filhos definhando com câncer, que poderia ser tratado se houvesse condições mínimas. O desabastecimento de 80% e a inflação anual estimada em 700% são arrasadores. Não há boicote do "império", que neste mesmo momento reata relações com Cuba. Não há empresários rasgando dinheiro numa suposta grande e estúpida conspiração. Há, sim, drama humanitário, resultante de um regime truculento e autoritário, que ensaiou dividir renda respaldado no petróleo a preço alto, mas que se esqueceu de aproveitar a chance de diversificar a produção. E você, seja qual for o rótulo que o defina, precisa saber: é indefensável o caos venezuelano. Tudo o que vi e vivi lá estará relatado em detalhes na Zero Hora do próximo fim de semana. Convido todos a lerem e entenderem a que me refiro.