Se você passar pela Place de la République em uma noite qualquer e avistar uma multidão, em sua maioria jovens, acenando suas mãos para o alto ou cruzando os braços sobre a cabeça, não confunda com um flashmob ou com uma aula coletiva de ioga. Trata-se de uma ação rotineira das assembleias gerais do Nuit Debout (noite em pé), autodesignado movimento de cidadania que já se espalhou por cerca de 60 cidades da França.
Inspirados nos protestos espontâneos espanhóis que geraram o movimento dos Indignados ou no Ocupe Wall Street, os jovens militantes e ativistas franceses debutaram sua vigília noturna em 31 de março, no eco das manifestações contra o projeto de reforma da legislação trabalhista proposto pelo governo Hollande. Mas, além da renúncia do projeto, o Nuit Debout ambiciona mudar o mundo por meio de uma nova política cidadã, em substituição aos poderes tradicionais instituídos.
A estudante Maud Couillaut, 22 anos, presente na praça de Paris em meio aos estandes improvisados de comida e grupos de música espalhados pela praça, acredita mesmo que o movimento poderá ser o início de uma Primavera Europeia, em alusão à Primavera Árabe, que derrubou governos e sacudiu países no Oriente Médio e no Norte da África.
– Queremos uma nova forma de fazer política. Os cidadãos se expressam e estão finalmente sendo ouvidos na França – diz ela.
No centro da praça, qualquer um que tenha se inscrito tem direito a três minutos no microfone para passar sua mensagem. Patricia D., 52 anos, ironicamente era funcionária do Ministério do Trabalho e recentemente pediu demissão. É sua quarta “noite em pé”, e ela assiste a tudo atentamente, mas com certo ceticismo:
– Eles vêm toda noite e só vomitam palavras. Isso vai acabar cansando. Na Espanha, levou dois anos para virar o Podemos (partido político de esquerda). Mas nós, franceses, adoramos um falatório, e aqui isso não vai dar em nada.
Espíritos mais inflamados do Nuit Debout já vandalizaram o patrimônio público ou privado nos arredores da Place de la République, o que exigiu a intervenção policial e levou a prefeita de Paris, Anne Hidalgo, a declarar que “se é legítimo sonhar com um outro mundo, não o é degradar este daqui”.
A noite avança madrugada adentro entre canções e discursos. E para quem não conhece a dezena de códigos usada pelo movimento: acenar as duas mãos para o alto significa que você concorda com o que foi dito, e cruzar os braços é sinal de divergência.
A arte de Klee
O Centro Georges Pompidou inaugurou na semana passada a maior retrospectiva do pintor suíço-alemão Paul Klee (1879-1940) realizada na França desde 1969. Em cartaz até 1º de agosto, a mostra de 230 obras foi organizada em sete seções, desde suas primeiras criações satíricas até seu exílio em Berna, passando por seus anos de aprendizado na escola de Bauhaus. Em 1939, sofrendo de uma doença letal e em um período de extrema intensidade criadora, Klee adotou a máxima de Plínio, o Velho: Nulla dies sine linea (nenhum dia sem um traço), no reconhecimento do gesto artístico como motor de vida e de perseverança. Em busca da “concentração última”, naquele ano produziu o número recorde de 1.253 obras. Em uma carta, escreveu: “Eu gostaria, agora que não sou mais jovem, de fazer todas as coisas que ainda me são possíveis”.