Quer ser comentarista de futebol? Aqui vão umas dicas simples. Primeira: relaxe, não é preciso entender de futebol. Se souber, ajuda, mas não é quesito necessário. Até existem os que dominam o ofício, mas observe como mal se destacam em popularidade da massa de chutadores. A maioria não vive da ciência do futebol, é da fé futebolística que retiram energia.
Incorpore a filosofia: danem-se os fatos, o importante são as versões. Faça a sua, ainda que escalafobética.
Dica essencial: você deve acreditar ser o único que não se turva pela paixão clubista. É difícil. No começo pode parecer piada, mas, com esforço, perseverança, negação da realidade e evitação do bom senso, pode-se chegar à convicção da própria imparcialidade. Com o tempo, esse delírio fica tão aderido, que é possível considerar-se verdadeiramente equânime.
Uma personalidade bipolar ajuda muito nesse campo, afinal, já está acostumada a ver só os extremos, a viver a paixão da alternância, e a brigar agressivamente por desimportâncias.
Amplifique o presente como se ele fosse tudo. O desafio é extrair uma análise pormenorizada sobre o futuro e o passado pelo jogo de ontem, e apenas dele. O passado só entra como mito. Os momentos épicos, grandes conquistas e enormes fracassos devem ser constantemente lembrados, mesmo nas discussões mais fuleiras. Já uma análise da evolução do futebol ao longo do ano, das constâncias e estatísticas, esqueça. Deixe isso para quem sabe.
É imprescindível um grande desafeto, pode ser jogador ou técnico. Persiga-o sempre, independente do que ele faça em campo.
Dica importante: lance frases de efeito, não precisam ser sábias, precisam provocar. Você não está em busca da verdade, quer é ganhar a discussão, logo qualquer argumento é válido.
Dica importantíssima: faça muitas profecias. Com tantas, alguma vai acertar e será teu trunfo.
O resto das bolas fora será esquecido ou pode dizer que foi entendido fora do contexto. Fique tranquilo, você está numa profissão onde não se erra, pois não há um compromisso com a coerência, essa é a maravilha.
Siga esses passos e bem-vindo ao seleto clube dos sábios do futebol. Entre as inúmeras vantagens de ser comentarista esportivo está a de ser um atleta diferenciado do verdadeiro maior esporte nacional: falar sobre futebol. Os únicos músculos necessários são os da língua e da face, é um esporte de poltrona. Dá para ser barrigudo e mesmo assim atleta, pois os jogadores se esforçam por você. Pode-se usar o mesmo perfil físico balofo dos dirigentes. Funciona, pois, por se estar imerso no mundo do futebol, acaba-se sendo um atleta por contágio e mimetismo.
E melhor de tudo: observe a política nacional, trocar a razão pela emoção desatinada é a tendência para 2016. Aproveite!