Passava das 20h de ontem, e a Bolívia tendia à confirmação oficial da rejeição à terceira reeleição do presidente Evo Morales. Com 82% dos votos apurados, o "Não" ao quarto mandato de Evo se mantinha na frente, com 54,2% dos votos. O "Sim" tinha 45,8%. Evo disse estar preparado para a derrota e que sairia feliz com o dever cumprido.
Em recente entrevista na Espanha, indagado se ficaria decepcionado com a derrota, Evo já dissera:
– Estou preparado. Vou embora feliz para minha casa. Adoraria ser um dirigente esportivo – afirmou o presidente, que se encontra no poder desde 2005 e busca poder se candidatar a um mandato que se estenderia de 2020 a 2025.
Defendendo seus êxitos, Evo assegurou que a sociedade o manteve por mais de 10 anos porque acreditava na sua proposta.
– Convoquei um gabinete social há oito meses, e os argumentos que me deram é que este processo não pode parar e que os neoliberais não podem voltar – explicou.
SURPREENDENTE DICA AOS VENEZUELANOS
Na entrevista em Madri, Evo surpreendeu, em referência à Venezuela, ao dizer que, "para manter a ideologia, é preciso garantir a comida". A Venezuela vive uma crise econômica e institucional, com inflação fora de controle e desabastecimento superior à metade dos produtos da cesta básica.
– Quando não se garante o alimento, a maioria pouco se importa com a questão ideológica. Eu disse muitas vezes ao Chávez: 'Muda de economia, não pode continuar subvencionando tudo' – afirmou.
Mesmo que os governos mudem da esquerda para a direita, como na Argentina, Evo disse acreditar que "todos os movimentos sociais na América Latina são anti-imperialistas por princípio. E enquanto houver império, a luta continuará”.
Evo se caracterizou sempre por um dos mais fortes discursos anti-EUA, até com algumas bravatas acima do tom, mas, ao mesmo tempo, notabilizou-se pelos elogios recebidos do Fundo Monetário Internacional (FMI). Aparentemente, é um paradoxo. Na economia, ele é tido como um governante que zela pela responsabilidade fiscal. Por isso, é bem aceito pelos organismos internacionais.
Apesar dos bons indicadores econômicos, os analistas avaliam que Evo caiu de popularidade em razão das acusações que o envolvem em corrupção e favorecimento a uma ex-namorada, executiva de empresa chinesa.
SURPRESA NO BRASIL
No Brasil, o referendo boliviano apresentou uma surpresa. Os bolivianos residentes na cidade de São Paulo continuam maciçamente "evistas", apesar do exílio forçado: entre os 6.288 votantes (dos 30.232 habilitados a votar na cidade), 78,66% preferiram o "sim" que permitiria a Evo Morales tentar um quarto mandato. Apenas 21,34% votaram "Não", de acordo com o site do Tribunal Supremo Eleitoral. A cidade representa 90,75% dos votantes bolivianos no Brasil. É um resultado que contraria a contagem parcial do plebiscito na Bolívia e também vai contra o voto em outros países. Levantamento do jornal El Deber mostra que o "Não" ganhou em sete das cidades pesquisadas e que houve empate em Quito (Equador). O "Sim" também ganhou em Buenos Aires (77% a 21%) e em Arica, no Chile (790 votos contra 197).
Na noite de domingo, as primeiras pesquisas já mostravam que os bolivianos estavam rejeitando a proposta. Segundo a emissora de TV ATB, 52,3% dos bolivianos votaram de forma contrária à proposta de nova reeleição do presidente. Outros 47,7% se mostraram favoráveis à proposta de um novo mandato de quatro anos.